1975 - 2020
Coisinhas básicas para ele ser feliz: Ver o neto sempre, colocar apelidos em amigos e comer bolinhos de frigideira.
Carlos André era um menino brincalhão de 44 anos. Daqueles que cresceram, realizaram o sonho de ser avô só para garantir a brincadeira. Assim era esse grande sujeito, botafoguense, colecionador de camisas de seu time, amado por todos e que saiu do Ceará, lá de Ipueiras, com sua amada Lucilene e os dois filhos: Karla e Anderson, para fazer a vida no Rio de Janeiro.
O pequeno Michel, chegou depois, já no Rio, por adoção.
Nas suas alegrias, esse cearense lutador, que tinha uma mania de apelidar as pessoas, como uma forma de "carinho", também carregava muitos apelidos, segundo contou sua filha. Um deles era “Boi”, e sua vida de luta talvez explique o codinome. Carlos André nunca deu chance ao azar, trabalhou muito para conseguir suas coisas, nunca baixou a cabeça para a tristeza, nem quando perdeu seu irmão em um acidente de moto. Sempre seguiu em frente, cabeça erguida, coração alegre e corajoso.
A prima Natália, a quem Carlos André chamava carinhosamente de “Feia”, conta que “era impossível não rir ao lado dele, fazia todos rirem de suas piadas, ao lado dele era só alegria, nunca tinha tempo ruim”. E descreve o primo como meio gordinho e alto, “mas o que irá fazer as pessoas se lembrarem dele é a alegria contagiante, aquela energia que tirava todos da tristeza”. E a prima completa: “Ele não conseguiu uma vaga na UTI! O que resta agora é um vazio, uma tristeza e uma revolta!!!”
A filha Karla contou que não se lembra muito de como foi a viagem de Ipueiras para o Rio, mas sabe que durante toda a história da família, nunca houve um só dia em que não visse seu pai alegre. Parecia que a vida inteira era um paraíso. “Hoje eu entendo que eles devem ter vindo para o Rio em busca de mais chances de trabalho, mas eu nunca nem desconfiei que pudéssemos estar passando necessidade”. Assim como Michel, que nos contou que seu pai “por onde passava deixava muita alegria”. Karla contou que o pai era uma pessoa sempre alegre, sempre com uma história boa para contar, com um sorriso no rosto para oferecer, do tipo que gostava de juntar uma boa turma para uma conversa-fiada em qualquer dia: “meu pai adorava zoar as pessoas”. Contou também que era carpinteiro, mas que também fazia muitas outras coisas para sobreviver.
A filha mencionou que o pai era muito ligado à família. E era muito ciumento com as coisas e, principalmente, com as pessoas “dele”. E que adorava comer um ‘bolinho de frigideira’, que a filha fazia para ele. A filha contou ainda: “Meu pai vinha aqui na minha casa todo final de semana. Era certo meu pai chegar aqui ou no sábado ou no domingo às 8 da manhã. Nosso último café da manhã juntos foi uma semana antes de seu falecimento. E atendendo ao pedido dele, o café da manhã foi bolinho de frigideira”.
E sonhava em ter um neto. A filha conta que tentou por duas vezes engravidar, mas perdeu, e que somente na terceira vez conseguiu enfim levar a termo a gravidez da qual nasceu o sonhado neto Bruno Ricardo. E Carlos André, ao vê-lo disse: “agora posso morrer”. Quando o neto nasceu, conta a filha Karla, o sossego acabou. Todo dia e a toda hora “meu pai fazia uma videochamada para ver o neto, morria de rir com ele no telefone. Ele ligava tanto que, às vezes, eu ficava irritada com ele, pois tinha vezes que ele ligava e eu estava ocupada, ou botando o bebê para dormir, e ele ligava toda hora. Mas eu daria tudo para ter essas ligações de novo a todo momento”. E Karla completou dizendo: “Pai, te perder foi a pior coisa que aconteceu na minha vida, e olha que já tive dias de escuridão. Mais a sua perda foi a pior das tempestades”.
Carlos nasceu em Ipueiras (CE) e faleceu em Niterói (RJ), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela prima e pela filha de Carlos, Natália Ananda Rodrigues dos Santos e Karla. Este tributo foi apurado por -, editado por -, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 23 de julho de 2020.