1926 - 2020
Um brega na jukebox, uma cervejinha no copo e muita piada de duplo sentido para contar.
Extrovertida, divertida, animada e vaidosa. Era conhecida principalmente por seus apelidos. Entre os familiares, amigas do bairro ou conhecidos do dia a dia, ela era Lindinha, Nega ou Dona Nega. Pelos sobrinhos era carinhosamente chamada de tia Nega ou tia Cecília.
Há muitos anos morando sozinha, preenchia o dia vendo na televisão programas de auditório ou Chaves, o que a fazia rir bastante. Mas alegria mesmo ela sentia quando estava na rua, em contato com as pessoas. Por isso, seu maior divertimento era assentar no barzinho, conversar com o pessoal, ouvir músicas "brega" ou um pagodinho na jukebox e, claro, tomar uma cervejinha.
“Não vai me deixar morrer sem tomar minha cerveja”, dizia ao filho Francisco. Para Dona Nega, essa era a bebida dos céus. Sua (ceu)veja, como gostava de chamar, não podia faltar nem quando foi morar no lar para idosos. Sempre que dava, tomava uma latinha levada pelo filho e servida no quarto, quase escondido dos demais moradores. A bebida só dava espaço para outras no Natal, quando preferia um vinhozinho para acompanhar as castanhas portuguesas e rabanadas.
Seu lugar preferido sempre foi a Baixada Fluminense e não gostava nem de viajar, para não ficar longe de lá. Ao mesmo tempo, tinha paixão por mudanças. Por conta disso, nunca quis ter um imóvel próprio e tinha sempre caixas prontas para levar a uma nova casa. Mesmo quando foi para a instituição de longa permanência, não parava quieta e estava sempre atrás de um quarto novo. “Quem carrega casa nas costas é caramujo”, dizia sempre, a frase que aprendeu com o pai Daniel.
Nos últimos anos de vida, tia Nega esteve amparada pelo carinho dos sobrinhos Jussara e José Carlos, que tanto fizeram por ela nos momentos de aflições e de felicidades, e que mantinham visitas constantes. A vovó e sogra querida guardava muito do amor pelas netas Gabriela e Juliana e também pela nora Beth, que nunca saíam de seus pensamentos.
Era muito vaidosa também. Para fazer jus ao apelido, Lindinha gostava de estar impecavelmente arrumada, com os cabelos sempre pintados e unhas feitas. Para enfeitar, brincos, colares e anéis. Suas roupas eram como seu espírito: de jovem, já que nunca se sentiu antiquada. Ou seja, muito vestido, saia, short e estampas de oncinha.
Nunca se sentiu idosa e não gostava de remédio. E, independentemente da idade, era namoradeira e jamais perdeu a esperança de encontrar um companheiro para viver em par. Dona Nega sabia viver! Não levava a vida tão a sério e vivia brincando e contando piadas — preferencialmente aquelas de duplo sentido.
Aos 93 anos e com um diagnóstico de pneumonia, Cecília precisou ser levada pelo filho até o hospital, onde, já fragilizada, foi infectada pelo novo coronavírus. Francisco, que já não via a mãe desde março devido às proibições de visitas, pôde dar a ela a última dose de amor e cuidado. Lindinha deixou a vida no Dia das Mães, mas morará para sempre no coração do filho único, que sempre foi sua grande paixão.
Cecília nasceu no Rio de Janeiro (RJ) e faleceu em Duque de Caxias (RJ), aos 93 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho de Cecília, Francisco Carlos Mendes. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Mariana Campolina Durães, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 23 de dezembro de 2020.