1947 - 2020
Estava sempre rodeado pelos dois cachorros, paparicados por ele como se fossem crianças.
Aquele avô carinhoso, apelidado de Vozão por conta do corpanzil acolhedor, cresceu no sítio, em meio a uma família numerosa, de onze irmãos. As dificuldades financeiras o levaram, ainda criança, a vender na vizinhança os doces e bolos caseiros que sua mãe fazia. Já na cidade de Frutal, onde passou a vida inteira, arrumou seu primeiro emprego como empacotador de loja com apenas 11 anos. Esse foi seu trampolim para o trabalho numa grande rede de varejo, por longo tempo.
Ali no mesmo estabelecimento também quis o destino que ele conhecesse Vilma, que, certa vez, ao acompanhar uma amiga em busca de um corte de tecido, foi atendida pelo rapaz. “Por incrível que pareça, o pano estava nas mãos dele”, ela conta. Dias depois, Eurípedes a abordou na rua com a intenção do pedido em namoro. Os encontros às escondidas dos pais duraram dois anos. O jovem casal persistiu no relacionamento, por outros dois anos, com visitas marcadas semanalmente na casa de Vilma. Eles seguiram o caminho da união tradicional, com direito a noivado e casamento, que durou cinquenta e dois anos.
O primogênito, Rogério, nasceu logo no comecinho da vida a dois. No ano seguinte, chegou Luciana. Enquanto Eurípedes continuava na rede varejista, Vilma cuidava de uma pequena loja montada, na época, pelo casal com o nome de Rei dos Plásticos. Lá vendiam-se itens do gênero, e os recursos ajudavam no sustento da família, ampliada com a vinda do terceiro filho, Fabiano.
Certa ocasião, já preocupado com o futuro familiar, Eurípedes foi atrás de um trabalho melhor e recebeu a indicação para um novo posto numa firma fabricante de óleo, onde permaneceu por duas décadas e se estabilizou financeiramente. Conquistou a casa própria, educou e proporcionou estudo para os filhos, que, a essa altura, tinham formado um quarteto, com o nascimento de Rodrigo, sete anos depois dos irmãos.
Católico fervoroso, Eurípedes envolvia-se nas ações e festas beneficentes da Igreja, ao lado da qual inclusive manteve um comércio de artigos religiosos. As orações faziam parte das reuniões da família, ao menos duas vezes por ano, quando todos os filhos vinham de cidades distantes para se juntar na casa dos pais. “Meu avô sempre puxava uma oração de agradecimento”, comenta Isabella, uma entre sete netos.
De temperamento tranquilo e hábitos caseiros, Eurípedes também gostava de se reunir com amigos e de tomar sua cervejinha, no canto do sofá da sala, vendo televisão em companhia dos seus dois cachorros. Engraçado e emotivo ao mesmo tempo, a neta relembra a sensibilidade do avô: “Ficava emocionado até ao falar”.
Eurípedes nasceu em Frutal (MG) e faleceu em São José do Rio Preto (SP), aos 73 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Eurípedes, Isabella Ribeiro da Silva, neta, e Vilma Pereira da Silva, esposa. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 17 de janeiro de 2022.