1946 - 2020
Ir ao mercado com os netos era um evento; amava fazer comprinhas, descobrir novidades e reclamar dos preços.
"Ela era a avó mais engraçada do mundo!", conta a neta Paloma. A moça esclarece que é neta do coração, "neta postiça", como costumava dizer a Vó Izabel. É que Paloma é casada com Fernando, neto dessa senhora que encantou o mundo com sua alegria e irreverência. O fato é que amor não respeita fronteiras; Paloma é neta legítima, pois, se ama a Dona Izabel como avó, fica resolvido: é neta e ponto final.
Dona Izabel era casada com o Senhor João Arruda. Tiveram três filhas: Sandra, Elizabete e Jeane. A família cresceu com a chegada dos netos, cinco ao todo: Fernando, Rodrigo, Camila, Felipe e Danilo. Vivia dizendo que a neta Camila era muito parecida com ela. A única menina era bem ligada à avó. De vez em quando as duas se estranhavam, mas não demorava nada e já voltavam às boas.
Os sábados eram esperados pelos netos; era dia de guloseimas e delícias preparadas pelas mãos habilidosas da Vó Izabel. A estrela do cardápio era, sem sombra da dúvida, a coxinha. O salgado era famoso por ter um tal segredo na massa. Izabel toda vez perguntava: "Adivinha o que é que eu ponho na massa pra ficar tão gostosa?". Uma vez disse que era batata, mas a verdade é que permanece o mistério.
Vó Izabel era a mais amorosa das avós. Era louca pelos netos e durante a semana sempre ligava para saber se estavam todos bem.
Era dessas pessoas que nunca padeceu de timidez ou vergonha. Amava conversar e saía puxando assunto com todo mundo. Tinha uma amiga de longa data - Dona Clara -, ou como o neto chamava, só para mexer com a avó, "Dona Gema". Também tinha amizade com as pessoas da igreja. Izabel era evangélica e gostava de frequentar os cultos aos sábados para ouvir a Palavra de Deus.
Não suportava ficar parada em casa, de jeito nenhum. Ia caminhando até a praça. Chegando lá, usava os aparelhos para se exercitar um pouco. "Só escolhia os aparelhos mais fáceis", entrega Paloma. É que esse compromisso com a atividade física na praça era - mais do que tudo - um pretexto para dar uma volta, distrair a cabeça e colocar os assuntos em dia.
O programa preferido de Izabel era ir ao supermercado com um dos netos. Era um momento de prazer: escolhia cada produto com calma, bem devagarinho. "A gente tinha que ficar de olho, ela pegava quase sempre o produto mais caro!", diverte-se a neta com a lembrança. E era muito curiosa; ficava perguntando para os funcionários: "O que é isso aqui?"; "Quanto custa esse aqui?". Caso avaliasse que o preço era exagerado, reclamava mesmo. "Nossa! Que caro!". Paloma conta que é impossível não sorrir ao se lembrar da Vó Izabel lhe dizendo: "Pode gastar, Paloma, o Fernando paga!".
Izabel era mulher forte, determinada. Segundo ela, a razão estava sempre do seu lado; não importa o que dissessem os outros, arranjar confusão com essa senhora cheia de opinião era uma tremenda perda de tempo. "A última palavra sempre era dela", conta Paloma, achando graça.
Vó Izabel ilumina a família Arruda nas lembranças de momentos felizes e memórias cheias de afeto. Todo mundo deveria ter por direito uma avó igual a essa: puro amor e alegria. Agora, Izabel foi brilhar no céu.
Izabel nasceu em São Roque (SP) e faleceu em Votorantim (SP), aos 74 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Izabel, Paloma Maria Leria Barbe. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Ana Macarini, revisado por Fernanda Ravagnani e moderado por Rayane Urani em 20 de dezembro de 2021.