1945 - 2020
"Tá no sangue!”, era assim que reafirmava ser paraibano.
José Adalberto não falava muito do seu passado antes de ir para São Paulo aos 30 anos. Talvez por conta da morte da mãe quando ele estava com 20 anos, da inexistência de afetividade com o pai, da perda de um irmão ainda criança ou porque começou a trabalhar como servente de pedreiro aos 14 anos e como gari aos 17 para tentar superar a vida difícil que enfrentava em João Pessoa.
Enquanto os irmãos Gilberto, Erisvaldo e Antônio trabalhavam na roça, as irmãs Edimar, Ilma e Conceição trabalhavam nas casas de família. Uma das irmãs, a Lúcia, ficava em casa cuidando de Alberto, o irmão caçula. A relação dos irmãos era muito madura, já que todos haviam interrompido as brincadeiras para poder sustentar a casa. Dentre os oito irmãos, Adal, como era chamado, escolheu Ilma para ser sua paixão. Sempre que ia para João Pessoa, ficava na casa da Ilminha. “É uma grande irmã”, dizia ele.
No desfile cívico de 7 de Setembro, Adal, com uma farda branca e azul, marchava normalmente ao som da banda marcial, até que, de repente, avistou uma garota de vestido de chita, era a Clara; e foi aí que começaram as trocas de olhares, sorrisos e piscadas. Um encontro, depois do desfile, foi marcado pela Mara, uma amiga de Clara, e também por beijos.
Uma semana após o desfile, o namoro começou. Às escondidas, pois a mãe da amada não autorizava aquele romance. Clara, determinada e sabendo que Adalberto era o melhor cara para ser seu companheiro de vida, teve a ideia de fugir com ele para Cajazeiras, na Paraíba. Lá, passaram dois anos e então se despediram da cidade escolhida para viver o amor proibido.
Em busca de trabalho para construir um lar, o casal partiu para a cidade pernambucana de Petrolina. Adalberto trabalhou como pedreiro e Clara, mesmo tendo apenas concluído o ensino médio, virou professora. Foi em terras pernambucanas que o casal vibrou ao descobrir que estavam grávidos da primeira filha, Albertina. E foi com o nascimento da neta que a mãe de Clara aceitou a relação.
Por conta do trabalho de Adal, a nova família se mudou para Salvador, na Bahia, onde nasceu o segundo filho, Albertino. Depois se mudaram, novamente, para Paulo Afonso, na Bahia, e nasceram Adalberto Filho, que faleceu aos 9 meses, Adaltina e Adaelba.
Em 1975, com os filhos entre 3 e 7 anos, Adalberto queria dar uma vida melhor para os pequenos. Arriscou-se e, mais uma vez, todos se mudaram. Desta vez foram para a capital de São Paulo. Ficaram hospedados na casa da mãe de Clara, que à época estava morando na cidade. Adalberto, por conta da sua experiência e persistência logo conseguiu emprego, desta vez como apontador.
Em São Paulo, mais filhos nasceram: Débora, Adelson, Adilson, Anderson, Andreia, Adriano, Ariana e Renato.
Adaltina conta que a vida do pai foi dividida em dois momentos: antes e depois do AVC. Antes, era um homem mais sério, só trabalhava e não ajudava nas tarefas domésticas e nem na criação dos filhos. Depois, tornou-se brincalhão, leve, ria à toa, fazia piada de tudo, tinha muita paciência para esperar as filhas no shopping e passeava com os netos.
Em 2018, Adalberto viajou para Nova York com Clara, Adaltina e a neta Sophia. Todos foram para o casamento de Andreia. Ele conheceu a Quinta Avenida, o Central Park... e, apesar do frio, ficou tão vislumbrado pela cidade que pretendia voltar em breve e queria ter um neto norte-americano.
José nasceu em João Pessoa (PB) e faleceu em São Bernardo do Campo (SP), aos 74 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de José, Adaltina Gomes do Nascimento. Este texto foi apurado e escrito por jornalista João Vitor Moura, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 17 de janeiro de 2021.