1948 - 2020
A felicidade estava na sua casa, em volta da mesa, com a família, sua comida e amor.
Devota de Nossa Senhora Aparecida, Dona Bia, Tia Bia ou ainda Juju, como era conhecida, foi auxiliar de produção, mas sua última função era cuidar do lar. E cuidava com muita dedicação e devoção.
Da união com Seu Natalício, vieram ao mundo os seis filhos: Erlei, Elenir, Eni, Eliana, Elisete e Enio. "Minha mãe estava sempre muito alegre, principalmente quando junto da família. Adorava quando eu, meus irmãos, os netos e a bisneta iam visitá-la aos domingos", conta Eliana.
Essa era sua maior alegria: a casa cheia, todos sentados à mesa, a comida que ela adorava preparar servida e... muita conversa. Seu prazer era cozinhar e receber elogios "da comida da vó". E depois, ela e a filha Eliana passavam a tarde assistindo ao "Programa da Eliana" na TV. As duas riam num som praticamente único, típico de cumplicidade gostosa de mãe e filha.
Dona Bia era a bondade em pessoa. Conta a filha, que ela adorava cuidar da família, mas também do próximo, com o mesmo carinho. Dona de uma boa conversa e generosa na distribuição de abraços. Sentia-se bem fazendo as pessoas comerem e, quem entrasse em seu lar, ela servia com amor, nem que fosse apenas um cafezinho.
Eliana é muito grata e traduz isso em palavras ao explicar: "Sou filha de uma mulher carinhosa e amorosa. Ela gostava muito de cozinhar pra todos, mas ela mesmo só gostava de comer arroz, feijão, farinha e carne cozida. Sempre foi muito simples, nunca gostou de luxos e o que possuía, dividia com gosto."
Dona Bia morava com seu amado companheiro e eles tinham suas rotinas muito certinhas. Normalmente ela acordava cedo, tomava um bom banho e passava talco no rosto. Sim, podia faltar tudo, menos o talco Johnson, que ela dizia deixar sua pele macia. Em seguida, descia pra fazer o café e cantar ou falar com os passarinhos... tinha um carinho enorme pelos bichinhos.
Eliana complementa o reloginho da mãe: "O almoço e o jantar tinham horário marcado. O almoço era entre 11h30 e 12h e o jantar, às 18h. Mas todo dia, ao invés de 'chá das cinco', mamãe tomava outro banho às 17h."
As datas comemorativas mais importantes do ano tinham que ser na casa dela, claro. Era uma satisfação convidar as pessoas, ver a casa cheia e fazer aquela festa. Já pra tirar ela de casa, era muito difícil... Dona Bia não gostava, só saía mesmo se fosse por necessidade.
Agora, sentar no sofá pra assistir novelas, desenhos e quando o assunto era futebol então, aí sim a agradava. "Era incrível, dava hora de passar o jogo e ela corria pro sofá pra assistir. Mas o mais engraçado, é que ela não torcia para nenhum time, dizia que gostava de todos", revela Eliana.
Sua infância e as histórias de sua vida eram um assunto que a entretinham. Tinha gosto em contá-las à família. Ouviam sobre os bailes, sobre o trabalho na lavoura... Gostavam de conhecer aquela mulher com coração de ouro e sua trajetória até chegar a São Paulo.
Tinha o sonho de ganhar um desses prêmios da TV. Desde que foi lançada essa modalidade, comprava e marcava os números toda semana, com a esperança de um dia tirar a sorte grande. Mas não chegou sua vez de ganhar uma quantia, com a qual Dona Bia queria ajudar as pessoas necessitadas, além dos filhos e netos.
O amor pelos netos era incalculável e não conseguia ficar muito tempo sem vê-los. Falava com eles com um dengo, que só vendo pra ter ideia da doçura. Bem típico de avó mesmo, fazia tudo que eles gostavam e sentia-se realizada ao ver seus amores comendo. Andava radiante com a bisneta... mais uma geração! E lembra a filha: "A mãe estava muito feliz também com minha filha, que está noiva. Ela esperava ansiosa ver seu casamento, mas agora acompanhará à distância."
E Eliana despede-se, relembrando que a mãe apreciava músicas antigas. "Ela gostava de dançar e cantar essas músicas. Como era bom de acompanhar momentos assim. Quanta saudade... Ficou na memória nosso diálogo bem curto, ao deixá-la no hospital: eu disse que ela ficaria bem e ela respondeu 'tá bom, filha'. Mas guardarei outras tantas lembranças bem melhores dessa grande mulher que virou uma estrelinha."
Judite nasceu em Santa Inês (BA) e faleceu em São Bernardo do Campo (SP), aos 72 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela filha de Judite, Eliana Bulhões. Este tributo foi apurado por Denise Pereira , editado por Denise Pereira, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 29 de novembro de 2020.