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Leonice França

1943 - 2020

Nas mãos dela, toda casa virava lar.

Ela começou na lida muito cedo ─ lavava, passava, cuidava do lar das pessoas; seu carinho e capricho se mostravam em cada uma das tarefas que fazia, pois, por mais simples que fossem, ela deixava, em cada ação realizada, um pouquinho de si.

Dona Nice ou a Leoa, como era carinhosamente chamada, casou-se aos 19 anos e foi mãe de cinco filhos: Sônia, Edson, Paulo, Marcelo e Clodoaldo, que se foi cedo, levando com ele uma parte dela. A família era sua força, o lar seu porto seguro. Amava ficar em casa e, nas suas raras saídas, em visita a alguém, ela era rápida, quase como numa “visita de médico”; queria voltar logo para casa, para o seu ninho e cuidar das coisinhas dela.

Amava cozinhar! E como cozinhava... O pudim gigante, a omelete exageradamente recheada de muçarela, o fricassê de frango! E tudo nela era intenso: as gargalhadas, o bom humor e a sua habilidade em fazer as pessoas se sentirem especiais, como quando enchia o prato da nora Sandra, até transbordar, com as comidinhas gostosas que preparava.

É Sandra quem conta: "Ela era divertida e zombeteira quando dizia ao marido: 'Roberto, sua norinha está chegando! Deixa ela te ver com óculos de sol à noite'. E se acabava de tanto rir. E quando via os netos dizia: 'Estão tão bonitinhos, né Sandra'"?

Dona Nice era daquelas pessoas que gostam de compartilhar, com exceção dos presentes que ganhava: esses, guardava como um tesouro. Não era egoísmo não! Era zelo. Ela também amava presentear, mimar seus queridos: constantemente dava panos de prato à nora, pois sabia que ela gostava.

O Natal resumia bem o espírito da Leoa: a árvore, a troca de presentes, mesa farta, família reunida, enfeites espalhados pela casa, risos, e o momento de dar graças pelos dias vividos ao longo do ano.

Devota de São Judas Tadeu, o padroeiro das causas impossíveis, Dona Nice não se deixava abater. Era ouvinte assídua dos programas de rádio: A Hora da Ave Maria, Zé Bétio, o programa do Eli Corrêa e sua saudação “Oi, gente”!

O tempo passou, os filhos cresceram, a Leoa se aposentou; seu "rugido" foi ficando cada vez mais contido e, então, veio a Covid-19 e ela partiu. Dona Nice deixou tesouros: marido, filhos, netos, sobrinhos, genro, nora. Deixou saudade naqueles que tiveram a honra de conhecê-la e o mundo mais triste e menos colorido.

Leonice nasceu em Garça (SP) e faleceu em São Paulo (SP), aos 76 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela nora de Leonice, Sandra Domingos França. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Rosenilda Osana dos Santos, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 25 de outubro de 2021.