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Levi Alves Martins

1958 - 2020

Não havia ninguém como ele para cuidar com tanto amor das plantas.

Levi era uma pessoa simples, humilde. Sempre durão, negava-se (talvez por medo) a estar mal, a dizer que estava doente. Por conta disso, Vivian considera que o pai talvez tenha demorado para pedir ajuda ao ser contaminado pelo novo coronavírus.

Se preciso fosse, tirava as próprias roupas para dar a quem quer que fosse. Tinha um coração sem tamanho. "Era bruto às vezes, mas daria a vida pelos filhos e pela minha mãe. Ele era meu herói sem capa. Meu protetor, sempre!", comenta a filha.

Gostava de estar com a família. Acordava sempre muito cedo. "Quero aproveitar o dia!", dizia. Estava entre seus sonhos ir até Alagoas conhecer a casa do filho e da nora e se aposentar para curtir a vida com a esposa.

Amava assistir aos jogos de futebol pela TV. Podia ser um mero campeonato da terceira divisão, mas lá estava Levi acompanhando cada jogada. Na frente da telinha, ele palpitava nas escalações dos jogadores, comentava, vibrava...

Era louco pelos netos e nutria um amor incondicional pela esposa Vanda, com quem foi casado por quarenta e dois anos ─ eles se conheceram quando ela estava com 13 e ele com 17 anos. "Além de avô, foi um pai para as netas após minha separação. Ele me ajudou muito no papel de pai com minhas filhas ainda pequenas. Não foi apenas um avô para elas", relata Vivian.

No dia em que foi internado, quase deixou a filha e as enfermeiras loucas. Pensou que havia perdido os óculos e "colocou pilha" em todos para procurar as cangalhas. "Nesse meio-tempo, saí para tomar água e, quando voltei, lá estava ele rindo à beça: o tempo inteiro os óculos estavam no bolso dele! Bastante gente havia se empenhado na busca. No final, todos riram demais da confusão", relembra, saudosa. A filha tem muitas outras boas recordações de momentos divertidos ao lado do pai.

Vivian conta que a presença física de Levi faz falta todos os dias, em todos os momentos. Quando era criança, ele a levava às festas juninas da escola e ficava esperando para vê-la dançar na quadrilha, e também aos parques para balançar, brincar... "Ele era meu amor! Não, ele ainda é e será para sempre!", afirma.

A relação pai e filha sempre foi muito próxima, mas ele ainda a via como uma menina. Tinha uma preocupação imensa pelo fato de Vivian ser asmática e sempre lhe dizia: "Se cuida, minha fia... Se cuida!"

Os dois tomaram um último café juntos nas escadarias do Mercado Municipal de Sorocaba, como era costume. Para Vivian, haveria sempre um cafezinho a mais a ser tomado ao lado do pai enquanto conversavam e ela pedia e ouvia suas opiniões sobre diversos assuntos e compartilhava com ele ideias e planos. "Como dói não ter abraçado mais, beijado mais, dito mais o quanto o amava", conclui.

Levi nasceu em Sorocaba (SP) e faleceu em Sorocaba (SP), aos 61 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Levi, Vivian Alves Martins. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Paola Mariz e moderado por Lígia Franzin em 24 de maio de 2021.