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Lidia Bastos dos Santos Ferraz

1971 - 2021

Com sua simplicidade e afeto intenso, aprendeu e ensinou pela vida que é preciso saber dançar na chuva.

Lidia parecia dura e inflexível. Para quem convivia, sabia que por trás daquela fortaleza, vivia naquele corpo uma mulher cheia de doçura. Simples e muito afetuosa, passou a vida focada no bem estar daqueles que amava. A família e os amigos eram suas inspirações para cada dia que amanhecia.

Muito religiosa, gostava de passar os dias ouvindo canções de louvor. Ir à Igreja estava sempre entre seus afazeres prioritários, lá ia ela com suas saias discretas, linda e em paz. Preparar o café da manhã para a família e cuidar para que todos tivessem o máximo de conforto possível, fazia parte do seu dia-a-dia, dedicou sua vida ao cuidado com o outro, esquecida mesmo era do cuidado consigo. Intensa, era mãe muito carinhosa, embora se irritasse com pequenas coisas e a vida com ela uma gangorra de emoções, entre tapas e beijos.

Era aquele tipo de pessoa que ia ao mercado e ali, na fila mesmo, já fazia novos amigos. Porque era capaz de sempre olhar o que cada um tinha de melhor. Na igreja, a chamavam de "irmã Consolação", porque tinha o dom mais que especial de acolher e consolar a todos.

A temporã de 06 filhos foi a única que concluiu os estudos. Filha cuidadosa, ligava para seus pais diariamente. A forma de se fazer presente, mesmo distante.

Sabe-se pouco sobre a Lidia, embora fosse muito conhecida e querida por todos no bairro. Era descer a rua que todos a cumprimentavam. Falava com cada um afetuosamente, mas nunca falava sobre si. Gostava de passear pelos shoppings e olhar as vitrines, ir à cafeteria com os amigos depois da igreja e amava cozinhar. Juntar a família no almoço de domingo e preparar sua inesquecível mesa de café com bolo de fubá. Essas pequenas coisas a faziam feliz.

Mãe muito atenta, tinha orgulho enorme do filho psicólogo e da trajetória da caçula na escola. Às vezes exagerava na proteção, mas isso é mesmo coisa de mãe. Nas memórias que ficam, Lidia será lembrada pelas gargalhadas na cozinha e nos carinhos que naturalmente oferecia na mesa do jantar.

Sempre foi a tia da molecada da vizinhança. Gostava da casa cheia e se divertia fazendo lanche pra turma toda. Deixava a criançada brincar à vontade e carinhosamente seus olhos brilhavam naqueles dias. Era sua maneira de ensinar a importância de acolher a todos com respeito e afeto.

Assim era Lidia, intensa em tudo o que fazia. Abraçava de corpo e alma, defendia os que amava com plenitude, o pouco nunca lhe serviu. Queria sempre mais, queria tudo.

Com ela, ficou um grande aprendizado: dependemos uns dos outros na vida. A tolerância e a generosidade devem estar presentes em todas as relações que vivemos. É importante estar atento a cada pessoa que passa pela nossa vida porque com cada uma algo de novo aprendemos. Sempre. Não aceitar relações rasas, viver de verdade cada história, com cada pessoa. E, sobretudo, nas situações mais difíceis, não desistir, entregar-se até encontrar o ponto de paz e equilíbrio. Para isso, amar-se e ter fé, amor por Deus, devem ser sempre prioridade em nossas vidas. Como ela disse: a vida não é sobre ver a tempestade passar. Dance!

Lidia nasceu em Duque de Caxias (RJ) e faleceu em São José do Rio Preto (SP), aos 49 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo filho de Lidia, Marcus Vinicius Bastos Ferraz. Este tributo foi apurado por Giovana da Silva Menas Mühl, editado por Patrícia Scótolo, revisado por Neuclenia Ferreira e moderado por Rayane Urani em 13 de setembro de 2021.