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Marcelo Anderson da Silva Lima

1976 - 2020

O Dr. Piabinha, que queria operar peixinhos quando criança, tornou-se o respeitado o Dr. Marcelo anos depois.

Ainda criança, com todo um universo de descobertas à sua frente, ele já sabia o valor de uma vida, qualquer que fosse ela. Tornou-se um clinico geral respeitado.

Ele se formou com dificuldades e muito sacrifício dele e da família. Fez Medicina na Bolívia e o período da faculdade foi puxado: o pai havia saído de casa e a mãe teve que arcar com todas as responsabilidades; uma mulher valente: professora aposentada, ela voltou a lecionar em outra cidade, para aumentar a renda da família; saía de tarde e voltava quase meia-noite; estrada deserta e perigosa. Fez isso até ele se formar. Era um ir e vir constante pra ele que, assim como a mãe, foi um guerreiro e venceu.

Por trás do profissional competente havia um grande homem de olhar gentil e carinhoso. Um ser humano atento e dedicado ao outro. Certa vez, uma amiga da família presenciou o olhar do médico humanizado recair sobre um rapaz bêbado e ferido que, até aquele momento, ninguém havia dado a devida importância: ela conta que o Marcelo largou tudo que estava fazendo para socorrê-lo. Nunca havia visto ninguém, nenhum médico, tratar alguém com tanto carinho e respeito.

Ele tinha essa mania de cuidar, de querer bem, sem olhar a quem. Era um amigo querido por muitos e o irmão zeloso e dedicado da Gina (Virgínia), conta a irmã Flavia, que era muito próxima do Marcelo, seu grande e melhor amigo. Eram confidentes e, apesar da distância, se falavam toda semana e faziam planos juntos. “A ausência dele, ainda que seja apenas física, é muito dolorosa.”

Casado e com uma filha de 11 anos, Marcelo era um homem apaixonado pela família. Amava demais a esposa e a filha e, para ele, ficar longe delas era muito difícil.

Marcelo trabalhava na linha de frente, atendendo pacientes infectados pela Covid-19. Ele viveu para ajudar a todos e partiu fazendo o que amava, salvando vidas. Sua partida causou enorme comoção junto aos moradores de Cruz das Almas, Conceição da Feira e Paulo Afonso, cidades onde morava e trabalhava. Todos se juntaram em orações por ele.

Marcelo foi também lembrado e homenageado em 19 de junho de 2021 numa manifestação pacífica que reuniu dezenas de pessoas na praça de Stalingrad em Paris, na França, pelas mais de 500 mil vítimas da Covid-19 no Brasil.

Ele foi um filho, irmão, pai , esposo, amigo e profissional incrível. Um presente na vida de todos que o conheceram, e deixa inúmeras lembranças doces; uma delas a do menino Marcelo, sentado sobre uma mesa, enquanto a mãe registrava num gravador a música do Roberto Carlos que ele entoava: "ainda posso ouvi-lo cantando com a voz rouca", lembra a Flavia.

Agora, ele é “um lindo espírito de luz que com toda certeza está cuidando de todos nós. Ele foi uma pessoa iluminada, do bem.”

Marcelo nasceu em Paulo Afonso (BA) e faleceu em Salvador (BA), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de Marcelo, Flavia Cristianne Barbosa Ribeiro Lima. Este tributo foi apurado por Débora Alves Cabrita, editado por Rosa Osana, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 25 de agosto de 2021.