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Marcelo Garcia

1968 - 2022

Sua voz ecoava por onde passava; fosse com um canto ou uma palavra, ele levava amor.

Marcelo era o filho do meio entre cinco irmãos de uma família cristã que tinha como maior exemplo o pai, Martin Garcia, um homem que viveu a Palavra de Deus no seu dia a dia.

Marcelo trabalhava como motorista de ambulância e amava sua profissão de forma diferenciada, porque sofria com toda a humanidade as dores do outro. Orava pelos doentes e, quando algum deles partia, chorava como se fosse da sua própria família.

Durante o período mais crítico da pandemia, foi um trabalhador fiel e incansável, transportando pacientes com covid e outras doenças. Por muitos anos sua rotina incluiu viagens para São Paulo, saindo de casa à meia noite, chegando lá pela manhã, voltando no mesmo dia e, no amanhecer, viajar para outras cidades da região.

Foi exemplar na sua função, nunca faltando ao serviço, mesmo quando estava muito cansado. Na Prefeitura, onde trabalhava, era um amigo fiel. Companheiro de todas as horas e nunca deixava ninguém triste. Era carinhosamente chamado de “pai” por muitos e acolhia a todos.

Adorava fazer o papel de bravo, sério e intransigente e quem não o conhecia até o via assim, mas ele só aparentava braveza. Amava reunir os irmãos de sangue e os irmãos de fé em casa e sua maior alegria era ver todos rindo e se divertindo. Para isso, contava as histórias da infância da Jéssica e do João Victor, que ele criou como filhos amados do coração, fazendo as pessoas chorarem de rir e isso era uma grande alegria para ele.

Foi ele quem os ensinou a dirigir, a comprar o primeiro carro, a não desistir da vida e das lutas e a viver cada momento como um presente de Deus. Quando nasceu Marina, sua neta, ele estava lá. Foi o avô mais maravilhoso que existia, que a pegava no colo e a ninava, dizendo que ela nasceu pra sorrir e para fazer a vida mais bonita. Tinha verdadeira adoração por ela e, quando ela foi morar em outro país, chorava como criança e sentia tanto a sua falta que precisava ser consolado pela saudade da Marina, do Renan e da Jéssica.

Teve também dois filhos do seu primeiro casamento e duas netas e sempre procurou fazer o que podia por eles. Amava os irmãos e fazia todo o possível para manter a unidade e o amor entre eles. Não tomava partido e sempre foi o mediador e o acolhedor. Sua alegria era poder compartilhar histórias da infância com eles e dividirem o tempo juntos.

Marcelo era como “gigante gentil” com porte físico grande, uma voz potente e um coração puro como o das crianças.

Lucy, sua esposa, conta sobre a relação deles: “Em casa, era uma criança. Nós dois vivíamos como dois adolescentes. Sempre brincando, fazendo artes, viajando, estudando a Palavra e vivendo em meio ao caos do mundo, sabendo que Deus tem o controle de tudo... Marcelo me mimava como uma rainha. Quando estava em casa, levava café na cama. Cuidava do lar como ninguém. Não me deixava fazer nada e sempre tomou a frente para tudo. Era ele quem passava tinta no meu cabelo, cortava, escovava, secava... todas as vezes, foi meu anjo da guarda nos momentos de doença e dor. Não podia falar que queria alguma coisa que ele corria e ia fazer pra mim. Dizia o tempo todo o quanto me amava e o quanto era feliz ao meu lado. Eu fazia tudo por ele. E hoje sei que nossa história foi a mais linda de todas”.

Marcelo amava pregar e seu rosto resplandecia quando subia ao púlpito fazendo com que sua mensagem tocasse o coração de todos, principalmente por saberem que ele vivia o que pregava. Sofria com a situação particular de cada um e gostava de fazer visitas aos hospitais para falar de Jesus. Não poupava esforços para estar presente quando era chamado a transmitir a todos o amor de Deus. Amava cantar hinos o dia todo e sua voz ecoava por todo canto da casa.

Fez muitas orações por muitas pessoas. Fez casamentos, batismos e funerais. Estava presente quando muitos pacientes descansavam em Deus nos hospitais e nunca abandonou ninguém que o procurasse atrás de uma palavra de consolo. Nos piores momentos da vida ele sempre mantinha a Esperança em Deus. Sempre dizia que não era aqui nossa casa e pedia a Deus todos os dias para que Ele voltasse logo, porque não aguentava ver tanta doença, tristezas, guerras, fomes, injustiças...

Ele amava fazer o ritual do pôr do sol toda sexta-feira com a esposa e o irmão Valdir. Chegava do serviço, colocava água e uns docinhos no carro e seguia até um local fora da cidade, onde sentavam e conversavam sobre tudo até tarde, com hinos tocando no carro. Iam sempre os três, mas quando mais alguém queria ir, sua maior alegria era ver outras pessoas juntas ali, no meio do nada, só ouvindo hinos e cantando a Deus.

Lucy resume o que viveu com Marcelo: “Tivemos tantos momentos de alegria que seria impossível contar tudo. Éramos aquele casal que vivia o amor verdadeiro e real... Adorávamos andar de bicicleta nas trilhas e na cidade e ele implicava porque eu ia muito rápido e não olhava por onde andava. Tinha um cuidado excessivo comigo, como se eu fosse um bibelô”.

“Marcelo foi luz, foi paz, foi compreensão. Marcelo foi uma brisa suave que tocou minha vida e me ensinou a lutar nesse mundo somente com um objetivo: estar em paz com Deus e viver cada dia como se fosse o último e esperar a volta de Jesus, onde não haverá mais choro, morte ou dor. Me ensinou a ter esperança e fé no verdadeiro Deus. Não naquele que habita em templos de pedras, mas no Deus Soberano que conhece todas as coisas e sabe o que é melhor pra todos”.

E conclui dizendo: “Sou grata a Deus pelo privilégio de ter compartilhado de sua presença nesse mundo. Sinto muita saudade e sua falta me dói como flecha no coração. Mas sinto muita paz e certeza absoluta que ele está descansando em Deus e que breve o verei novamente”.

Marcelo nasceu em Tatuapé (SP) e faleceu em Catanduva (SP), aos 53 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela esposa de Marcelo, Lucy Mara Valadares orniz. Este tributo foi apurado por Gabriel Rodrigues, editado por Vera Dias, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 25 de julho de 2022.