1938 - 2020
Ela sempre tinha certeza que alguma coisa boa iria acontecer.
Assim como muitas Marias que conhecemos, Maria Apparecida Campos Pavanello foi uma mulher de muita força, que distribuiu muito amor, e trabalhou bastante. Passou por muitas dificuldades, é verdade, mas também foi muito feliz ao lado da família que construiu com o Juvercy, com quem foi casada por sessenta e três anos. Em sua vida, precisou tomar decisões, pensar para agir, e encarar as surpresas da vida com firmeza, cuidado e alegria. Foram muitas as “escolhas de Maria”.
“Escolheu da roça o que matava a fome”. Por muitos anos, Maria morou e trabalhou em fazendas. Saía de casa em São Joaquim da Barra, no interior de São Paulo, ainda às quatro da madrugada e só voltava ao cair da noite. Depois de passar o dia em colheitas de cana, algodão e soja, trazia o que ganhava dos patrões para os filhos, que a esperavam ansiosos. Frutas, um pedaço de cana, lenha para acender o fogão.
Nascida em berço católico, tornou-se evangélica depois de casada. A conversão se deu em um ato de agradecimento pela recuperação do companheiro, que ao ser internado para largar a bebida, começou a praticar a religião. Os dois seguiram juntos na fé, fazendo orações, ouvindo cultos pelo radinho e indo à igreja. “Escolheu um salmo como poesia”. Seu favorito era o 91.
Maria não demonstrava chateação, raiva ou sofrimento. “Escondia a dor para não ferir / quem lhe feria”. Por isso, aguentou muito sozinha, só sofria em oração e rezava por todos.
Com muitos sabonetinhos, caixinhas e toalhinhas com os quais presenteava, ou cozinhando a comidinha favorita de cada um, redobrava a atenção e mimava um pouquinho o marido, os 11 filhos, 18 netos, 8 bisnetos, e dezenas de amigos e colegas. Em qualquer circunstância, Maria era o colo preferido de todo mundo. E assim aproveitou muito a família.
“Hoje é estrela servindo de guia / Brilhando no céu / Entre outras Marias”.
Após a partida de Maria Apparecida, seu filho, Gonçalo Pavanello, fez para ela uma música, como forma de canalizar a dor da perda. Entre aspas, trechos da música ilustraram o texto acima. Aqui, ela está completa:
“Escolhas de Maria”
Escolheu Maria para ser seu nome
Escolheu da roça o que matava a fome
E a humildade sua preferida
Escolheu um salmo como poesia
Escolheu a noite e também o dia
Para acolher que ser acolhida
Não colhia flor sem pedir licença
Não perdia a calma, pedia paciência
Se ajeitava toda pra poder sorrir
Escondia a dor para não ferir
Quem lhe feria
Do simples tecia belos presentes
Se esforçava tanto pra cuidar da gente
Seu colo era ouro, seu colo era benção pura calmaria...
Quis ser a Maria por simplicidade
Sua poesia falava de Deus
Hoje é estrela servindo de guia
Brilhando no céu
Entre outras Marias
Maria nasceu em Nuporanga (SP) e faleceu em Diadema (SP), aos 82 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho de Maria, Gonçalo Aparecido Pavanello. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Mariana Campolina Durães, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 14 de agosto de 2020.