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Maria da Glória da Silva Souza

1985 - 2020

Com suas mãos mágicas, mais do que artesã de objetos, foi uma artesã da vida. Brincava de tecer alegria.

Era no seu lar que se sentia mais feliz. Ali era tanto o seu espaço de liberdade e acolhimento que uma de suas manias do bem era desfilar livre, leve e solta (nua) pelos cômodos da casa.

Amava estar com seus filhos, Lorena e Murilo, e com seu marido, Irlan Leonardo, com quem partilhava a vida em família há mais de dez anos. O tempo passado na companhia das pessoas queridas era a melhor parte dos seus dias.

As doze horas que dedicava ao trabalho contavam com seu total comprometimento amoroso no atendimento aos pacientes; Glorinha era técnica em enfermagem e, por isso, trabalhava tanto e estudava ainda mais.

Uma heroína cujo superpoder era contagiar o ambiente ao seu redor com sua alegria e disposição em ajudar, no que quer que fosse.

Sua capacidade de transbordar amor trouxe aos seus cuidados muitos afilhados e afilhadas, Sophia era uma delas. Na véspera do batizado da menina, Glorinha passou a noite na casa da comadre Zionete, ajudando nos preparativos da festa. Quase levou um grande tombo ao tentar alcançar um pacote de bexigas usando como escada um móvel pouco confiável. Muitas gargalhadas foram o resultado dessa aventura e de tantas outras.

Glorinha era assim: sua felicidade contagiava todos que tivessem o privilégio de conviver com ela.

Queria ser lembrada por seus sorrisos, não por suas lágrimas. Ameaçava voltar para buscar aqueles que teimassem em chorar por causa da sua partida.

Seu último desejo era algo muito simples: voltar para casa e abraçar os filhos. Mas agora Glorinha será para sempre abraçada por todos que amou e por quem foi amada. Afinal, o poder do abraço não conhece os limites do tempo ou de nossa finitude.

Abraçar é acolher o coração do outro dentro do peito da gente. E o coração de Glorinha é de alma generosa, sorriso fácil e infinita capacidade de amar.

A saudade dos que Neguinha tocou, com sua felicidade espontânea, vai mantê-la sempre viva, espalhando seu sorriso iluminado pelo mundo.

Maria nasceu em Firmino Alves (BA) e faleceu em São Paulo (SP), aos 35 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela comadre de Maria, Zionete. Este texto foi apurado e escrito por Ana Macarini, revisado por Monelise Vilela e moderado por Rayane Urani em 28 de maio de 2020.