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Maria de Fátima Silva Fontes

1955 - 2021

Dedicou seus dias a transformar a vida das pessoas ao seu redor, com todo amor, zelo e compaixão.

Maria de Fátima foi certamente uma pessoa ímpar na vida de quem teve o privilégio de com ela conviver. De presença iluminada, contagiava a todos com sua alegria e gargalhadas, eternizadas na memória de quem a amava. Cumpriu brilhantemente os inúmeros papéis que ocupou: mãe amorosa, esposa dedicada, dona de casa zelosa e amiga para todas as horas.

Nordestina, foi para Guarulhos construir a vida ao lado de Luiz Gonzaga, seu marido. Primos, os dois viveram em uma união de aproximadamente quarenta anos até a partida dela. Da união, nasceu Luciano, seu grande amor. Dedicou-se por completo ao marido, ao filho e aos seus animais de estimação: um papagaio, duas calopsitas e alguns canários. Com tanto amor que lhe transbordava o peito, passou a cuidar de Jéssica, Bruna e Mariana para que sua amiga Susana pudesse trabalhar. Surgiu, então, uma bonita relação de afeto e cumplicidade, já que Susana saía às 7h da manhã e voltava apenas às 18h, fazendo com que as meninas passassem a maior parte do tempo com Tati, modo carinhoso com que Mariana se referia à Maria.

Por ter convivido toda a sua vida com Tati, Mariana guarda com carinho inúmeras lembranças em sua memória: "Quando pequena, todos os fins de tarde, ela me levava a mesma praça para brincar. Além disso, todos os dias antes de eu ir pra escola, colocava minha comida no prato e cortava uma manga para mim. Pequenos gestos que sempre demonstraram carinho e cuidado. Até o último dia em que almocei em sua casa, ela fez questão de colocar o meu prato". Mariana também se recorda de uma situação divertida: "Quando pequena, eu gostava muito de maquiagem. Certa vez, a Tati comprou para mim uma maquiagem da Barbie na feira. Então, eu entrei no banheiro e pintei os dois olhos bem azuis e fui à escola. Mandaram um bilhete para minha mãe, perguntando se ela não me olhava antes de eu ir pra escola".

Cozinheira de mão cheia, ninguém resistia à rabada que ela fazia, considerada a melhor do mundo, nem à sua carne seca. Todos esperavam ansiosamente o final de ano para se deliciarem com o bacalhau que ela preparava junto com o seu maravilhoso pavê. Foi com ela, inclusive, que Mariana aprendeu a cozinhar aos 7 anos; ela relembra com carinho de outra especialidade de Tati: "Com ela, eu aprendi a comer cuscuz e depois que tomei gosto pela iguaria, ela sempre fazia para mim".

Nas horas livres, Maria gostava de ir à praia e caminhar no pesqueiro da Praia Grande, cidade onde morava sua grande amiga Helena, avó das meninas que cuidou. As duas foram amigas por mais de quarenta anos. "Uma amizade que passou da minha avó, para minha mãe e no final para mim; tenho e sempre terei a Tati como minha mãe, que fazia de tudo por mim e para me ver bem", diz Mariana. Em casa, todos os dias depois do almoço, sentava-se com seu esposo e jogavam baralho até ele ir para o trabalho. A cada partida, muitas risadas, porque ela sempre ganhava. Nas tardes de sol, reunia-se na calçada com amigos, enquanto saboreava uma cerveja. Para ela, até uma simples ida ao supermercado era motivo de diversão.

Não tendo netos, dedicava-se à Valentina e ao Zion, filhos de Mariana, como se fossem seus. "Apesar de não ter um contato diário com meus filhos, volta e meia ela buscava minha filha na escola e íamos à sua casa para tomar o café da tarde. Quando ia a algum mercado ou no centro da cidade, sempre me ligava para fazermos companhia a ela. Tudo que minha filha pedia, ela sempre fazia, fosse em gestos ou presentes".

Dona de um coração precioso, viveu seus sessenta e cinco anos doando-se a todos ao seu redor, sempre disposta a ajudar no que fosse preciso. "Desde criança até adulta, me recordo que mensalmente ela auxiliava instituições de caridade em que as pessoas ligavam pedindo donativos e o motoboy ia buscá-los; ajudava vizinhos que passavam por dificuldades financeiras, distribuía alimentos para quem precisasse; sempre recolhia e doava roupas e agasalhos para os mais necessitados. Tati foi a pessoa mais bondosa que já conheci. Fazia de tudo para ajudar e agradar a todos. Alguns até se aproveitam de tamanha bondade", conta Mariana.

Pura, amorosa e radiante, todas as pessoas ao seu redor a amavam e a queriam por perto. Aproveitou intensamente a vida, deixando um legado de muitas lições valiosas e uma saudade ardente nos corações de seus amados.

"Tati era tudo para mim. Tudo o que sei e o que sou, foi ela quem me ensinou. Foi minha mãe do coração, me viu crescer, me trouxe valores preciosos de integridade, respeito, amor ao próximo e compaixão, além de ter visto meus filhos nascerem. Não estávamos prontos para a sua partida, mas nossos momentos foram eternizados! Com tamanha bondade, foi um anjo na Terra, que Deus chamou de volta para morar com ele. Nós te amaremos para sempre", diz Mariana.

Maria nasceu em José da Penha (RN) e faleceu em São Paulo (SP), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de coração de Maria, Mariana Sousa de Moraes. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Fernanda Queiroz Rivelli, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 16 de outubro de 2021.