1942 - 2021
Todo aniversário tinha que ter o bolo da Binha! Era cozinhando que ela declarava seu amor pela família.
A vida de Maria Hilma tem sabor e aroma de comida preparada com amor. Na infância, entre banhos de rio e brincadeiras no terreno da casa em Urucurituba, interior do Amazonas, ela se fartava com o melhor da mesa. O pai até brincava com o quanto sua caçulinha gostava de comer. A irmã, Amazônia, era quem mais pajeava e ajudava a criar Maria.
Quando tinha 12 anos, o pai adoeceu. Por isso, Binha, como também era chamada, e toda família, mudaram-se para Belém, onde ele podia se tratar. Foi na capital paraense que ela conheceu Floriano, o seu Flory. Ela tinha 14 anos e, embora a mãe fosse professora, escola não era o forte de Binha. Estudou até a 4ª série. Parte do percurso para as aulas ela fazia na companhia de Flory, que estudava em outro lugar. Não raro, Binha matava aula para bater perna com as amigas e namorar. "Ela era custosa, uma taurina típica", afirma a neta Jahana.
O amor por Flory era tanto que ela se privava do jantar para que ele se alimentasse. E olha que desde menina Binha era apaixonada por comer.
"Meu pai era muito pobre, foi criado na casa dos irmãos, em colégio interno... Depois que ele conheceu a minha mãe e começaram a namorar, ela deixava de comer, guardava a janta dela escondido no forno e quando ele passava, à noite, entregava o jantar pela janela pra ele", conta a filha de Maria Hilma, Margareth.
A família não aprovava o namoro, mas Binha e Flory, que também ganhou o apelido de Binho, nunca se separaram. Casaram-se quando ela completou 18 anos. A vida dos dois não era fácil no início. No entanto, Floriano lutou e, aos poucos, melhorou a condição da família. Vendeu panela de porta em porta, mas foi fazendo contatos e assumiu a fiscalização de uma grande rede de postos de combustíveis, quando mudou-se para Manaus.
Na cidade, ele e Binha constituíram uma linda família. Tiveram quatro filhos: José Neto, Margareth, Floriano Augusto e Márcio Vinícius. O mais novo, Marcos Vinícius, morou com a mãe a vida toda. Bem no estilo "faça o que falo, não o que faço", ela garantiu que todos estudassem. Os aniversários eram memoráveis na casa de Binho e Binha. Ela fazia todos os pratos, mas o bolo, em especial, se destacava. Se tinha aniversário na família, o bolo tinha que ser feito por ela. Além do amor por comer, Binha aprendeu a expressar seu afeto com comidas saborosas.
Os amigos influentes de Floriano também se deliciavam com os pratos preparados por Maria. Ele dava jantares e ela garantia os bons momentos à mesa. Por um período, fizeram parte da alta sociedade amazonense, frequentavam os bailes do Rio Negro Clube. Naquele tempo, os buffets não eram comuns, ela fazia comida para uma grande quantidade de pessoas. "Quem comia, não esquecia, tinha cada receita", conta a neta.
As habilidades na cozinha foram um desdobramento do amor de Maria pelos familiares. De acordo com a neta, Maria Binha aprimorou-se na culinária para cozinhar para o Flory, depois para os eventos com os amigos importantes do marido, logo após para os filhos, para os netos Jahana, Paulinho, Ana Carolina, Luísa, Flávia e João Pedro e bisnetos Lara, Renato, David e Lucas.
"Ela adorava dar festas. Só faltava morrer de tanto cozinhar, arrumar, preparar... Gritava, se descabelava, mas amava ver todo mundo na festa dela e receber elogios do tipo 'nossa, Hilma, essa comida está deliciosa', 'O melhor bolo que eu já comi'", conta a neta Jahana.
Hilma ensinou a arte de fazer bolos para a neta Jahana. "Sou sua sucessora", conclui feliz. A família toda aprendeu o poder de estarem juntos, em festa. Onde eles se reunirem, a memória de Binha estará viva.
Maria nasceu em Urucurituba (AM) e faleceu em Manaus (AM), aos 78 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela neta de Maria, Jahana Paula de Barros Mendonça Cordeiro. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Talita Camargos, revisado por Luana Bernardes Maciel e moderado por Rayane Urani em 31 de maio de 2021.