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Maria Lúcia Rocha Freire Santos

1956 - 2020

Lucinha era dona da gargalhada mais espontânea e verdadeira; daquelas que são gostosas de ouvir e que contagiam.

Tia Lucinha era uma imensa “árvore bonita”, um imenso guarda-chuva. Acolheu e abrigou todos da família e dos que dela precisavam, sem distinção. Todos foram tocados por sua generosidade. A sombra, projetada por seus cuidados, dava acalanto a quem dela se aproximava.

Seus sorrisos irradiavam alegria e segurança num raio muito grande de alcance. Soube gerir, todos os anos, com zelo e parcimônia, os rituais que fortaleciam os laços da família, o Natal, o Ano Novo, o São João, os aniversários e até o Dia das Mães e dos Pais. Sempre foi forte, sempre teve um conselho fraternal, carregado de amor. Era o alicerce.

Adorava promover os encontros de família e amigos na sua casa, sempre com tanto carinho, com tanto amor, comida gostosa e muita cerveja. Foi uma festeira.

Gente alegre, forte e briosa, gostava de cozinhar e de comer caranguejo. Só tinha um defeito que não maculava a sua benevolência: o Chiclete com Banana. Era irredutível e não negociava esse gostar, era muito fã.

Cristã, não faltava a uma missa dominical. Aprendeu com a vida, da forma mais difícil. Não teve tempo de planejar um itinerário. A morte precoce dos pais obrigou-a a trabalhar e isso comprometeu o alcance do seu voo e da amplitude do abrigo que ofertava.

Mesmo assim, dedicou sua vida ao estado de Sergipe, sendo uma exemplar funcionária da Secretaria da Educação. Sonhava com o dia que o marido não precisasse mais trabalhar, para poder morar perto do mar. Paradoxalmente, morreu dependendo de um leito de UTI que o estado que ela ajudou a construir, lhe negou por sete dias.

"Estar com você sempre foi uma festa! E agora? Onde vamos encontrar o cachorro-quente da Lucinha? E aquele caruru? Nunca mais? Vai ser difícil não ter sua casa como acolhida nas noites de Natal. Vai ser muito difícil digerir que aquela gargalhada não será mais ouvida e que não teremos mais a quem recorrer para dividir os conflitos e as fases difíceis da vida... Será um período de aprendizado, porque seguir sem você não será uma tarefa fácil. Um cheiro, gorda!", diz a sobrinha Gabriela.

"Sonhei que eu era um balão dourado
E debruçado no manto
Estrelado do céu
Eu via você, tia Lucinha", diz Ivan, sobrinho de Lucinha.

Maria nasceu em Tobias Barreto (SE) e faleceu em Aracaju (SE), aos 64 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelos sobrinhos de Maria, Gabriela Freire Luna e Ivan Fontes Barbosa. Este tributo foi apurado por Gabriele Ramos Maciel, editado por Raiane Cardoso, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 19 de setembro de 2020.