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Marisete Abreu Campos Gonçalves

1963 - 2020

Guerreira, recomeçou e construiu uma verdadeira história de amor. Nessa, cabiam todos, inclusive ela.

Mari, como era chamada, é definida como uma grande mulher por sua nora, Cleyse.

Casou-se duas vezes. Após ter sido traída pelo primeiro marido, separou-se e teve de lutar sozinha para criar os três filhos: Renisson, Fabio e Itamar. Na busca pelo sustento deles, iniciou a venda de quentinhas – o que não foi bem sucedido. Nesse período de insegurança financeira e familiar, foi na igreja que Mari conheceu o companheiro com quem viria a se casar em seguida. Inicialmente, ele era um homem prestativo e a ajudou na garantia de uma casa para morar com os seus filhos. Contudo, Cleyse conta que, devido a um transtorno psíquico, ele passou a tratar mal a sogra frequentemente. A nora também diz que Mari decidiu permanecer na relação pelos filhos, pois não tinha para onde ir com eles e resistiu até o falecimento do então esposo.

A partir daí, Mari não considerou ter novos relacionamentos. Mas se engana quem pensa que ela desistiu de amar. Na verdade, investiu no amor próprio. "Ela passou a se amar. Tornou-se vaidosa, entrou na academia e fez novas amizades. Passou a viajar em excursões com suas amigas e filhos", diz Cleyse, que continua: "Mari construiu uma nova vida! Com a aposentadoria do marido falecido e os meninos já adolescentes, ela pôde recomeçar."

Muito divertida, a baiana "já gostava de uma resenha". Às sextas, se arrumava e saía para passear, sempre com seus óculos escuros. Não dava ouvidos aos padrões de beleza impostos, e mesmo um pouco acima do peso, não perdia a alegria de ser exatamente como era. E que linda era a Mari com seus cabelos pintados de vermelho!

Ela vivia se preocupando com todos. Sempre cuidadosa, pensava nos filhos em primeiro lugar. "O sobrenome de Mari era 'preocupação'. Até no dia em que foi internada, ela queria saber se os filhos já haviam almoçado", destaca a nora.

O filho do meio, Fabio, começou a viajar a trabalho muito cedo, se casou e gerou Fabyan, primeiro neto de Mari. Renisson, filho mais velho, também trabalhava em outra cidade, constituiu família e deu a Mari uma neta, Emily. O caçula, Itamar, manteve-se ao lado da mãe, juntamente com a esposa Cleyse e a filha Lauren, "xodó" de Mari, que acompanhou de perto os progressos da neta – primeira a morar com a avó, e, fisicamente, a sua "cópia fiel".

"Minha sogra e meu esposo faziam muitas coisas juntos: pintavam e decoravam a casa e saíam aos finais de semana com os amigos dele, com os quais ela se dava bem", diz Cleyse, que ressalta: "Mas a sua maior paixão e motivo de felicidade era ver toda a família reunida. Mari amava quando se aproximavam os feriados e outras datas comemorativas, pois os filhos recebiam folga e eles, noras e netos se reuniam com ela."

Em virtude do enorme coração, Mari sempre fazia de tudo para agradar a todos. "Certa vez, alugamos uma casa de praia para passar uma temporada e finais de semana. Combinamos de cada um pagar a sua parcela nas despesas, mas ela sempre acabava por arcar com as partes da maioria. E não cobrava depois. Além disso, todos eram responsáveis por levar seus cobertores, travesseiros e toalhas de banho... mas muitos esqueciam e Mari sempre adivinhava e levava os itens a mais", conta Cleyse.

Ela prossegue, acrescentando: "E quando recebia visitas em casa?! Ficávamos sempre bravos com ela, que cedia a própria cama para as visitas e ia dormir no sofá ou no chão. Ela era assim: voltada ao próximo".

"Mari partiu um dia antes do seu aniversário. Nós, familiares, temos como conforto a certeza de que o presente dela foi a presença de Deus", diz a nora, que finaliza sua homenagem falando diretamente à sogra: "Você foi um exemplo de ser humano. Contaremos aos seus amados netos o quão maravilhosa e atenciosa você era. Você jamais será esquecida. Nós te amamos."

Marisete nasceu em Esplanada (BA) e faleceu em Alagoinhas (BA), aos 56 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela nora de Marisete, Cleyse Costa Goes. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Luciana Fonseca, revisado por Lícia Zanol e moderado por Rayane Urani em 25 de setembro de 2020.