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Neusa Torres Mesquita Gomes

1951 - 2020

Amava ficar em casa; de onde só saía para cuidar da criação e colher o que plantava na roça.

Dona Neusinha, como seus conhecidos a chamavam, era mulher de simplicidade única, doce, maravilhosa, corajosa, não parava quieta. Na roça, estava sempre procurando algo para fazer e de uma forma incansável. Dona de casa, cuidava desta e de todos ao seu redor.

Amava ouvir as músicas de Roberto Carlos, gostava de comida nordestina e vestia-se de forma sóbria e bem composta em todas as ocasiões. Foi uma mulher forte, batalhadora e que não media esforços pelo bem-estar da família. Era uma pessoa muito caseira, percebia a sua moradia como o lugar do conforto, da paz, da segurança e do bem-estar. Resiliente, Dona Neusinha praticava uma sabedoria infinita: "O melhor lugar, era aquele onde de fato ela se encontrava". Esse jeito de estar no mundo — esse "aqui e agora" — dessa mulher guerreira, aos olhos de muitos, pareceria um esforço enorme, porém em seu íntimo tinha o efeito transformador de uma verdadeira terapia.

Esposa à moda antiga, dizia que casamento era um só e para a vida toda. Foi mãe de três filhos: Gleyson, já falecido, Glênio e Miriam. Educava-os com firmeza, acompanhando a linha dura pedagógica de seu marido. Foi sempre implacável na salvaguarda e proteção dos filhos. Uma avó que era também a "mainha" responsável e cuidadora. Glenda, a neta que foi criada por Dona Neusinha, comenta: "Minha avó, que eu chamava de 'mainha', era presença constante ao nosso lado e em casa. O único lugar que amava ir era a roça, gostava de colher o que plantava, para cozinhar em seguida, no fogão a lenha. Na roça ela plantava banana, caju, limão, mandioca, batata-doce e feijão, além de criar galinha e pato".

Era muito dedicada a seu esposo Antônio, também vítima da Covid-19 e falecido na mesma semana em que ela partiu. Ambos se conheceram, namoraram e logo ficaram noivos; ele viajou para trabalhar em São Paulo e ela ficou à sua espera. Quando ele retornou, casaram-se. Não pensou duas vezes em deixar a sua cidade natal, pois decidiu seguir junto ao marido para Barreiras, uma vez que seu sogro fora designado para acompanhar o 4º Batalhão de Engenharia de Construção rumo àquela cidade da Bahia.

No ano de 1973, foi mãe pela primeira vez. O primeiro comércio que resolveram tocar juntos foi um bar, sendo ela quem de fato sempre esteve à frente do estabelecimento, pois, na profissão de mestre de obras, o marido ausentava-se da cidade parte do tempo. E ela sempre ali, firme, ajudando-o e esperando por ele. Algum tempo depois, foram morar na cidade goiana de Posse, onde ela foi mãe pela segunda vez, em meados de 1977. Pouco tempo depois, retornaram para Barreiras, onde em 1980, deu à luz novamente.

Dona Neusinha e Toinho, modo carinhoso pelo qual ela chamava o marido, tocaram juntos vários estabelecimentos comerciais — bar, danceteria, sorveteria, casa de materiais de construção — e até caminhoneiro ele foi, sempre com a ajuda dela. Seu extraordinário esforço e excepcional senso de cooperação, labutando junto com o marido, representam um legado de prosperidade.

Glenda diz haver escutado muitas vezes a história: "... ele trabalhava o dia todo e quando chegava, à noite, ela já estava com a massa pronta para começarem uma outra importante jornada de trabalho, que era levantar aos poucos, parede por parede, o seu lar. Foi assim que ambos construíram a primeira casa em que moraram". Não foi fácil para o casal. Passaram por dificuldades, havendo ocasiões em que tinham pouco para se alimentar. Mas com força de vontade, coragem e garra driblavam as "rasteiras" que a vida insistia em lhes aplicar. Mesmo com toda dificuldade nunca permitiram que seus filhos deixassem de comer o pão de cada dia.

Dona Neusinha se foi poucos dias depois de seu marido, Antônio Gomes Filho, cujo tributo encontra-se registrado nas páginas deste Memorial.

Neusa nasceu em Cratéus (CE) e faleceu em Barreiras (BA), aos 69 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela neta de Neusa, Glenda Mesquisa Rodrigues Gomes. Este tributo foi apurado por Daniel Ventura Damaceno, editado por Ricardo Henrique Ferreira, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 16 de outubro de 2021.