1943 - 2020
Apaixonado por sanfona, com esmero, construía caixas para guardá-las: veludo por dentro, couro por fora.
A paixão pela sanfona era pelo som que saía dela, mas ele próprio não sabia tocar. O que Silvio sabia fazer bem era amizades e, assim, garantiu se cercar de amigos sanfoneiros. Da varanda da casa marrom número 1009, podia se ouvir aquelas músicas sertanejas de raiz. Seu lugar favorito da casa – talvez no mundo, era lá: em sua varanda. "Quando terminamos de construir a casa, a única exigência do meu pai era que tivesse uma área fora para ele passar tempo quando não estivesse envolvido em seus trabalhos manuais", lembra a filha Ivonete.
A casa de alvenaria – a primeira da vida de Silvio feita totalmente assim –, cuidadosamente pintada de marrom, com cadeiras verdes claras na varanda, jardim com grama bem aparada, foi erguida em conjunto entre pai, filha e genro, sendo um símbolo de uma vida de esforços e também do amor entre essa família.
Muito trabalhador desde cedo, passou a infância na roça, depois trabalhou na construção civil e na segurança, aposentando-se como vigia noturno.
Apesar de esses terem sido os trabalhos que ficaram registrados, Silvio tinha talentos que poucos viram. A paixão pela sanfona o tornou um excelente artesão. Escolhia o veludo mais suave, o couro mais bonito, e com muito esmero fazia caixas para transportar sanfonas. "Ele vendia essas caixas até mais barato do que o valor dos produtos que escolhia para montá-las. Ele fazia esse trabalho manual por amor", conta a filha.
Além das caixas de sanfona, as mãos de Silvio construíram os melhores brinquedos da infância de Ivonete: perna de pau, tacos de bets..."Eu era a única filha dele, então, ele fazia tudo para me paparicar. E isso se seguiu com minha filha e meu filho. Na volta da escola, colocava a menina nos ombros e trazia o menino pela mão".
Mesmo adulta, os paparicos para a filha continuaram, agora em forma de outros presentes: caixinhas para organizar a casa… "Uma vez ele me deu uma caixa para eu colocar os meus esmaltes. A caixa tinha espaço para uns 300 esmaltes!", lembra rindo a filha. "Segundo ele, era para não faltar espaço".
Silvio tinha essa mentalidade para tudo na vida. "Não pode faltar nada". Vindo de uma trajetória com tantas dificuldades, estava sempre preocupado que todos estivessem bem, com suas necessidades atendidas. "Em relação à comida, ele gostava de fartura. 'Tem que comer bem enquanto tá vivo', ele dizia sempre", conta a filha.
Cultivava a própria horta e se encantava com os passarinhos. Chegou até a construir viveiros para eles. Sempre autodidata: fazia, errava, começava de novo, consertava, acertava. Aprendeu tentando. Viveu aprendendo.
De uma criação rigorosa, Silvio era reservado com as palavras, mas por meio do fazer manual aprendeu a demonstrar seus sentimentos e o que lhe era importante na vida.
Silvio nasceu Urussanga/Sc e faleceu Cascavel Pr, aos 77 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido Filha de Silvio, Ivonete Arconti Santiago. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Michele Bravos, revisado por W. Barros Dantas Paniagua e moderado por Rayane Urani em 22 de julho de 2021.