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Therezinha Muniz Antunes Carneiro

1929 - 2020

Uma mulher de fé que adorava cantar bem alto e amava as coisas mais simples da vida.

Vovó Tetê, como era chamada pelos netos e bisnetos, gostava de comer os pés de galinha da canja, de ir à missa, de cachorros e de cantar bem alto e desafinada (sic): era uma pessoa muito simples e alegre.

Alfabetizou os filhos, as irmãs mais novas e boa parte da cidadezinha onde morava.

Já com os três filhos crescidos conseguiu voltar a estudar e, enfim, concluir o ensino médio. Foi uma grande conquista para ela o fato de já ser avó e poder estar novamente em uma escola. Passou então a trabalhar com educação infantil e assim foi até se aposentar.

Therezinha se tornava famosa nos lugares onde morava, grande parte da notoriedade veio por conta das novenas que organizava, o que mantinha viva aquela ideia de comunidade que as pessoas tanto prezam. Tanto que os tais eventos atraíam, inclusive, vizinhos que não eram católicos.

Até os sintomas do Alzheimer aparecerem em sua vida, andava por toda a cidade e participava de um grupo de religiosas que promovia orações com famílias enlutadas, rezando pelas almas de seus entes queridos e trazendo algum conforto para essas famílias. Em sua fé, acreditava que a morte lhe levaria a Deus e aos seus que já haviam partido: "No céu, no céu, com minha mãe estarei", cantava.

Ela estava bem de saúde e ainda se lembrava de muitas histórias até ser internada duas semanas antes de celebrar seus 91 anos. Faleceu oito dias após a internação e a família agradece o cuidado de toda a equipe do hospital da UFRJ pelo tratamento e por todos os cuidados com Therezinha.

A neta Maria Clara tem muitas recordações dos momentos passados ao lado da avó. "Foram muitas risadas, houve várias noites que ela contou repetidas histórias e eu adorava isso! Os netos mais novos, que conviveram com a vovó Tetê em seus últimos anos, contam como ela passou a incentivar o cachorro a querer sair de casa para ela poder passear também, pois, com o Alzheimer, não podia mais sair sozinha", diz a neta.

Therezinha sonhou com a casa própria boa parte de sua vida, desde que foi desterrada de Usina Pureza, em São Fidélis, bem no começo da ditadura quando houve conflito entre grevistas e usineiros. Ela chegou a ir até a prefeitura para pedir ajuda para não ter toda sua família expulsa, mas foi em vão. Foram morar na cidade grande, "de favor" e nunca teve aquela sensação de pertencimento aos lugares em que morou.

Ela deixou dez netos, quatro bisnetos, três filhos, seis irmãos mais novos, o pequeno vira-latinha Hércules e muitas saudades.

Therezinha nasceu em São Fidélis (RJ) e faleceu no Rio de Janeiro (RJ), aos 90 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Therezinha, Maria Clara da Silva Ramos Carneiro. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Luana Bernardes Maciel e moderado por Rayane Urani em 17 de dezembro de 2020.