1960 - 2021
Todo mês de julho, ele reunia a família às margens do rio Caiapó, para pescarias, baguncinhas boas e muita alegria.
Uilton nasceu em uma fazenda e foi criado em Palmeúna, distrito de uma cidade do interior goiano, com pouco mais de 2 mil habitantes, onde morou até a sua partida. Lá, era conhecido por todos como Figueiroa.
Foi casado durante vinte e seis anos com Vanusa, mas antes disso viveu uma aventura de cinema ao fugir com ela: o sogro não aceitava o relacionamento, porque ele era 18 anos mais velho do que ela. Logo em seguida ela engravidou de Luana, a filha mais velha, e depois tornaram-se também pais de Géssica.
Era um marido extremamente presente, cuidadoso, um verdadeiro provedor do lar. Como pai era extremamente carinhoso, protetor e amoroso, embora fosse exigente.
Uilton amava a casa cheia, com muita fartura na mesa, e os almoços dominicais simbolizavam bem esse seu prazer. Nesse dia, as refeições eram "comidas da roça": frango caipira, macarrão, arroz, feijão e guariroba — palmito típico do cerrado brasileiro. Tudo feito com muito capricho pela esposa, no fogão a lenha. “Embora nossa família seja pequena, meu pai gostava que a comida fosse feita em panelas grandes, porque sempre fez questão de fartura em casa”, diz Luana, que fala sobre o pai cheia de admiração:
“O meu pai foi, certamente, o meu maior exemplo de amor, alegria, bondade e honestidade. Nunca conheci ninguém com o coração tão puro e sensível quanto o dele. Quando o meu pai assistia reportagens na televisão, chorava feito uma criança, já que o coração era mole. De índole ilibada, viveu para a nossa família. Tudo o que fazia, pensava primeiro em nós. Foi nosso protetor, nosso porto seguro. Podíamos contar com ele em qualquer situação, pois ele encontrava sempre um jeito para tudo! Eu me sinto extremamente grata por ter tido um pai como ele.”
Comerciante, foi dono, por quinze anos, de um pit-dog — como são chamadas as lanchonetes no estado de Goiás —, o Figueiroa Lanches. Inúmeras pessoas saíam de cidades vizinhas para se deliciar com o famoso sanduíche "à moda Figueiroa", carro-chefe da casa, servido com maionese de pimenta, igualmente apreciada. O movimento era tão intenso que ele atendia tranquilamente oito clientes de uma só vez.
Conhecido por todos da região, era comum vê-lo distribuindo pirulitos a todas as crianças que passavam pelo local.
Gostava de falar o que vinha à sua cabeça e sem medir as palavras. Com seu sorriso largo e extremamente brincalhão, volta e meia gerava gargalhadas na família quando implicava com a sogra ou dizia aos genros: "Aqui o sistema é bruto, rústico e sistemático”.
Nas horas vagas, gostava de pescar, assistir televisão e cochilar no sofá. Quando saía para pescar deixava um recado para a filha: “Avisa a 'Aninha' que papai vai guardar um peixinho pra nós!”.
Foi a pescaria que, por muito tempo, garantiu o sustento da família e amenizou as dificuldades com a criação das filhas. Com isso ele se tornou o maior pescador da região e conhecia todos os pontos onde os pescados eram encontrados. “Logo a vida melhorou e ele passou a pescar apenas como hobby. Mas os frutos das pescarias eram sempre bem-vindos, já que todos em nossa casa eram apaixonados pelos pratos com pescados”, conta Luana.
Ela recorda também com saudade: “Ele possuía uma propriedade limítrofe ao curso do rio Caiapó. Por isso, todo mês de julho, nossa família passava trinta dias ao lado dele na beirada do rio. Lá era o nosso lugar de ser feliz, repleto de momentos de diversão, comidas saborosas e prosas de recordações antigas. Nessa época, jogávamos baralho, pescávamos e brincávamos na prainha. Quando chegava a hora de irmos embora, passávamos o ano todo planejando o próximo mês de julho. O meu pai amava aquele lugar, era o seu refúgio. Inclusive, foi lá que ocorreu a nossa última viagem em família e foi onde eu o abracei pela derradeira vez. Ali permanecem nossas memórias afetivas e a saudade dele e dos dias tão felizes vividos!".
Luana relembra manias do pai: “O meu pai era bom de garfo, gostava de todas as comidas possíveis, mas não tem como comer peixes, frango caipira ou um bolo bem fofo e não lembrar dele. Ele tinha a mania de dar uma volta pela casa após o almoço e logo depois tomar café com bolo. Deixava a xícara em cima da mesa, fazendo com que a minha irmã ficasse furiosa, já que ainda estava arrumando a cozinha”.
Luana conclui sua homenagem dizendo: “Ele foi exemplo de amor, carinho, força, proteção e bondade. Ele foi nosso pai aqui na Terra. Hoje temos um lindo anjo no Céu. Aqui deixou seu legado de pai, marido e sogro exemplar, que conduziu a família com muito êxito. Deixou uma família guerreira, que lutou com ele durante os dezenove dias na UTI e continuará lutando para sempre lhe dar orgulho, onde quer que esteja”.
Uilton nasceu em Palmeiras de Goiás (GO) e faleceu em Goiânia (GO), aos 61 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela filha de Uilton, Luana Alves de Castro. Este tributo foi apurado por Lucas Cardoso e Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 4 de agosto de 2023.