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Rosicreuda Alves Lustosa

1966 - 2020

À dureza da vida respondeu com amor e cuidado.

Começou distribuindo, junto com as filhas, de casa em casa, pacotinhos de bala para as crianças em todo dia 12 de outubro. Tirava de seu salário para oferecer essa alegria aos pequeninos, todo ano. A generosa prática, porém, foi crescendo, até que em 2018 ela conseguiu realizar uma festa para 150 meninos e meninas, em seu bairro. Diz sua filha Marcela que esse foi o dia mais feliz de sua mãe ─ Rose, como era conhecida.

A dor de ter perdido uma filha de 3 anos talvez explique essa passagem do pesado luto à luta delicada. Não por acaso, Rose era também agente comunitária de saúde.

Essa empatia era revelada em outros detalhes. Rose gostava de cozinhar para a família, adorava reunir. Típica “coruja”, dizia aos netos que “na casa da vovó, pode”. E cuidava com carinho de seu jardim doméstico. Tinha mania de limpeza: levantava cedo para deixar a casa impecável e cheirosa antes de sair para o trabalho.

Nascida no sertão paraibano, Rose nunca esqueceu as origens. “Voltava com grande prazer à terra natal, todos os anos, para rever parentes”, acrescenta Marcela. “Adorava contar aos seus filhos e netos histórias de sua infância passada nesse lugar”.

Não foram tempos fáceis, rememora a filha. Mas nem isso lhe tirava a bonomia. “Contava, com alegria, os dias de sofrido trabalho na roça com os irmãos e a longa distância para frequentar a escola, bem como o esforço da mãe para que todos os treze filhos pudessem estudar.”

Trabalhou como agente de saúde durante vinte e seis anos, tendo ingressado na carreira na primeira seleção. “Amava a profissão, trabalhava com dedicação e carinho”, elogia Marcela. “Seus pacientes eram seus amigos, parentes e até mesmo filhos: em muitas ocasiões parava tudo que estava fazendo para atender, não tinha hora nem lugar para ajudar o próximo”. E conclui a filha: “Nasceu para servir e serviu com excelência”.

Rose acalentava o plano de criar uma associação de assistência à infância. Era generosa e se dedicava às crianças, andava com balas, pirulitos e moedas na bolsa para distribuir entre os pequenos ou comprar algo para alimentá-los.

Generosa com a própria vida, achava que “havia recebido de Deus mais do que merecia”, conta Marcela. “Ela dizia que não tinha mais sonhos, pois o Pai proporcionou tudo que queria e precisava”. Seu único desejo, revela a filha, “era apenas ver os filhos evoluírem na vida e os netos crescerem”.

Rosicreuda nasceu em Mãe d'Água (PB) e faleceu em Pocinhos (PB), aos 54 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Rosicreuda, Marcela Cristina Lustosa de Oliveira. Este tributo foi apurado por Patrícia Garzella, editado por Joaci Pereira Furtado, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 29 de dezembro de 2020.