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Alexandra Aparecida da Silva

1973 - 2021

Sempre tinha um elogio ou novo bordão engraçado na ponta da língua.

Os íntimos a chamavam de Lê e, segundo a sobrinha Ana Carolina: “Ela era, provavelmente, a pessoa mais impossível de descrever que eu já conheci. Sempre tinha algo lindo para dizer a todas as pessoas e sempre enxergava o melhor em tudo e em todos. Eu decidi fazer psicologia por causa dela. A gente conversava bastante quando eu era adolescente e ela dizia que eu era uma boa ouvinte”.

Ainda que não tenha conhecido muitas pessoas gentis ao longo da vida, emanava uma alegria inocente, quase infantil, sempre com um sorriso de dentes perfeitos estampado no rosto e um elogio na ponta da língua. Não gostava de ficar em casa e estava sempre visitando as pessoas. Gostava de todo tipo de atividade social, principalmente as festas de aniversário, às quais comparecia demonstrando toda a sua vaidade feminina se maquiando, pintando os cabelos e usando roupas combinadas com os acessórios.

Muito falante, emendava um assunto no outro e sempre inventava bordões hilários e frases que além de matarem de rir, ficaram incorporados ao linguajar da família e, uma outra característica muito marcante, era que ela sempre honrava todas as suas promessas e compromissos e jamais se esquecia de pagar uma dívida.

Carregava consigo, mesmo depois de adulta, o espírito de uma criança, mas não era irresponsável ou boba. Muito pelo contrário, era maravilhada com tudo e muito sonhadora. Ao longo da vida alimentou muitos e diferentes sonhos: sonhou ser atriz, cantora, paquita da Xuxa, bailarina do Faustão - cujo programa ela chegou a assistir no auditório ao vivo.

Depois de mais velha realizou vários cursos de artesanato, cabeleireira e embora pudesse parecer frágil, no fundo era resiliente, forte e incrível e, por isso, sobreviveu a muitos sofrimentos sem nunca perder seu bom humor e gentileza.

Ela adorava "bater perna", comer comidas gostosas nunca feitas por ela porque não gostava de cozinhar, conversar e presentear pessoas! Sempre que recebia o dinheiro da aposentadoria conseguida como metalúrgica, alimentava seu encantamento por roupas, sapatos e acessórios coloridos indo ao centro da cidade para comprá-los juntamente com comidas e lembrancinhas para os familiares e amigos.

Lê era a protagonista de muitas histórias interessantes e, uma delas aconteceu na chácara de seu pai, onde a família costumava passar os fins de semana e feriados. Em um desses encontros, ela, que nunca havia aprendido a dirigir ou tirado carteira de motorista, por algum motivo não lembrado, dirigiu o carro do pai no curto trajeto entre a porteira e a casa. Ela ficou muito orgulhosa por ter conseguido fazer aquilo e ficava repetindo, de um jeito cômico, o tempo todo: "Eu dirigi o carro!", e esse passou a ser não só um dos memes familiares, mas um dos tantos bordões que ela criou.

E com carinho, Ana Carolina define Alexandra: “Essa era minha tia. Ela via as coisas como uma criança vê o mundo a ser descoberto. Sempre maravilhada e sempre bem-humorada...”

Alexandra nasceu em São Carlos (SP) e faleceu em São Carlos (SP), aos 47 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela sobrinha de Alexandra, Ana Carolina Messias. Este tributo foi apurado por Larissa Reis, editado por Vera Dias, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 10 de janeiro de 2022.