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Alexandrina Izabel Ferreira

1932 - 2020

Nas tardes de sábado, já era tradição: ela preparava um bolo para o café da manhã do dia seguinte, após a sagrada missa.

Uma pessoa alegre e de coração enorme. Alexandrina Izabel, mais conhecida como Doca, foi casada com o Joaquim. Mãe de oito filhos, estava viúva desde a década de 1980 e, desde então criou seus filhos sozinha, sempre com muito cuidado, amor e dedicação.

Adorava cozinhar e todo dia preparava sua própria comida: “Também preparava pratos deliciosos a pedido de seus filhos e netos, como galinha caipira e bife acebolado. Cuidava da sua casa, até parecia uma casa de boneca, era pequena e aconchegante”, relata sua neta Thalita.

Era uma mulher com sede de viver e exemplo para todos que a cercavam. “Adorava estar reunida com seus familiares e festejava com alegria, com danças e com seu lindo sorriso. Sempre que podia, estava alegrando com sua presença nossos momentos especiais, como casamentos, batizados e aniversários.”

Doca foi esposa, mãe, avó, bisa – assim que os bisnetos a chamavam – e claro, uma grande amiga. Durante sua vida, transmitiu paz e força para todos que tiveram o prazer de conhecê-la.

“Durante a pandemia, fazíamos chamadas de vídeo todos os dias, para rezarmos o terço da misericórdia juntos, em família. Isto ficará marcado. Hoje, continuamos a rezar o terço, mas a sua ausência dói quando olho para a tela do celular e não a vejo”, conta Thalita.

Doca amava viver, transbordava alegria e saúde por onde passava. Tinha uma saúde de ferro e era exemplo de amor, cuidado e força. Uma mulher de fé; sempre que podia, fazia questão de frequentar a missa. Era devota de Nossa Senhora do Carmo.

Em dezembro de 2019, Doca perdeu sua primogênita e, mesmo sentido muita falta da filha, sempre foi uma mulher forte e consolou todos. "Muito protetora, era ela quem sempre nos confortava em qualquer momento de dor ou de perda". Ela dizia: “Só vamos embora desta vida, quando chegar a hora. Deus sabe o momento certo para tudo”, conta a neta.

Mesmo com seus 88 anos, exercia uma vontade de aprender mais e mais. Usava as redes sociais e praticava exercícios físicos, até frequentava um grupo com essa finalidade.

Sua neta faz um último agradecimento à amada avó: “Nesse momento de dor e falta irreparável, tentamos ser fortes como a senhora. É difícil para nós, que a amamos muito. Sua ausência vai doer para sempre. Foram 88 anos que Deus nos proporcionou com sua presença. Um ser ímpar, com muitas experiências e histórias de vida engraçadas para contar. Nós te amaremos para sempre Vó, a senhora é uma pessoa inesquecível. Nossa rainha, nosso amor, nossa guerreira.”



Esta segunda homenagem é uma carta aberta de Thalita para a sua avó, Alexandrina:

Vó, Vozinha, amava chamá-la assim.

Você é tão querida por todos, que tudo nos faz lembrar a senhora. E, com o tempo, a saudade só tem aumentado ainda mais.

Achava tão interessante seu jeito, sua força e sua coragem. Desde a primeira vez que andou de avião, nunca sentiu medo. Viajava só e, mesmo pedindo que a empresa disponibilizasse alguém para lhe acompanhar do saguão do aeroporto até a aeronave, a senhora preferia ir sozinha. Era seu jeito engraçado e independente de ser.

Iremos nos lembrar da senhora na festa do padroeiro São Vicente Ferrer!

Na festa, comemorada no mês de abril, em Lavras da Mangabeira, no Ceará, sua presença era esperada a cada dois anos, quando vinha nos visitar e aproveitava também para participar da novena e prestigiar o evento. Sempre sentava-se no mesmo lugar para assistir à missa. Você sempre será lembrada nos festejos religiosos do padroeiro!

Iremos nos lembrar da senhora nos momentos em família, pois sempre que podia, estava presente e nos prestigiando. Tudo lembrará você!

E a viagem ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida que a senhora estava planejando ir com sua filha Alzeni, minha mãe, e a família?! O casamento do seu neto Gean, que a senhora estava se programando para ir; a viagem para visitar os filhos Alzeni e Zé Moura em Lavras da Mangabeira. Foram tantos planos seus interrompidos...

Lembraremos que, mesmo viúva, sempre usava sua aliança ─ usou-a até o último momento. Lembraremos de quando era jovem, ainda morava em sua cidade natal e adorava participar de todas as festividades da igreja local e do coral Idade Feliz.

E não poderia deixar de falar do seu aniversário de 85 anos, em que todos os seus filhos se juntaram: Tia Didi, Tio Tarcísio, Tia Nenê, minha mãe Alzeni, Tio Zé Moura, Tio Paulo e Tio Cézar (ao todo, foram os sete filhos, pois uma havia falecido ainda criança); com quase todos os netos e bisnetos; genros e noras. Uma linda homenagem realizada em vida e que a deixou muito contente. Celebramos com uma linda missa e depois uma festa. A sua felicidade era enorme por conseguir reuni-los todos e mais uma grande parte da família. Além da sua saúde e determinação, estava especialmente linda nesse dia, pomposa como sempre foi e com a felicidade transparecendo em seu lindo sorriso; em todas as fotos a senhora estava feliz e sorridente, aproveitou esse dia ao máximo. O padre até falou que celebraria seus 90 anos. Faltava tão pouco... As comemorações tiveram início quando seus filhos Alzeni e Zé Moura, sua neta Thâmisa e seu genro Victor chegaram a Ceilândia, no Distrito Federal, foram quatro dias de comemorações e a senhora amou tudo, todas as homenagens.

Vozinha, admirava a sua saúde e, mesmo aos 88 anos, nunca a vi debilitada, nunca a vi ficar doente para precisar ir ao hospital; sempre fazia seus exames de rotina e era uma mulher de uma saúde admirável. Era fascinante! Ainda lavava suas roupas, cuidava das coisas, fazia exercícios... Você era uma pessoa feliz, ativa, muito funcional e dona de uma memória invejável.

Sentirei saudades dos vídeos que a senhora fazia com os bisnetos, sempre participando das brincadeiras deles, das mensagens de bom dia pelo aplicativo de mensagens; sentirei falta da sua voz, das brincadeiras e das conversas.

E a janela na casa de seu filho Tarcísio? Pela qual a senhora gostava de ficar olhando seus filhos, netos, bisnetos e os amigos se divertindo. É sua cara aquela janela!

E não poderia esquecer a sua última visita aqui no Ceará. Foram momentos marcantes em que a senhora participou do batizado do seu bisneto Gabriel, filho da sua neta Thamilis. A senhora estava radiante e feliz. Visitou amigos e familiares. E participou de sua última festa do padroeiro.

A senhora era tão vaidosa, sempre bem-arrumada, perfumada e com as unhas impecáveis, feitas pela sua neta Cleide. Tinha uma grande vontade de viver. Sempre gostava de cuidar das suas coisas.

Sua falta será eterna. Está fazendo falta para todos.

Para amenizar a dor e ressignificar tudo que passei e também como uma forma de aprender com a força e coragem da senhora, entrei para o time dos escritores voluntários do Memorial Inumeráveis.



A heroína da família. Guerreira de uma força irreparável e dona de um sorriso inesquecível.

Dona Doca, assim ela era conhecida por todos.

Para a família, era chamada carinhosamente de Doquinha e, para o neto, que sente orgulho de ter recebido o mesmo nome do avô ─ o esposo de Dona Doca ─, ela era sua segunda mãe, uma pessoa que ele admirava e tinha como exemplo de um ser amável e responsável.

Era, sem sombra de dúvida, uma pessoa firme e decidida; mas amável, sensível, de sábias opiniões e que estava presente em todos os momentos familiares.

Sempre foi uma pessoa generosa com todos, principalmente com os familiares. Caso precisassem ou não, lá estava ela, disposta a ajudar com um sorriso no rosto e um olhar carinhoso. Possuía as palavras certas para cada situação – era, certamente, a pessoa dos melhores conselhos.

Uma mulher católica que, aos domingos pela manhã, estava na missa da Paróquia São Vicente Ferrer, sentada no seu lugar de sempre. Isso era sagrado quando Doquinha morava em Lavras da Mangabeira, no Ceará.

Nas tardes de sábado, já era tradição: Ela sempre preparava, com muito amor, um bolo para o café da manhã do dia seguinte, que seria saboreado com o neto e os familiares após a sagrada missa. Em Lavras, moravam apenas os filhos Alzeni e Zé Moura com suas respectivas famílias, o restante da família estava no Distrito Federal; mas sempre que podia, Dona Doca fazia questão de visitá-los.

Pessoa acolhedora e de família grande, tinha imenso prazer em reunir todos em sua casa que, mesmo sendo “pequena”, era aconchegante e todos ficavam bem acomodados para escutar as lindas e emocionantes histórias e suas encantadoras experiências de vida, principalmente seus netos. E tudo isso era feito de maneira natural e prazerosa, enquanto preparavam uma deliciosa galinha caipira.

“Que saudades de você! De suas risadas, de seus conselhos, de seu abraço forte, do seu 'Deus lhe abençoe, meu filho'”, relata Joaquim.

“Será difícil sem você, sem seu sorriso, sem suas palavras, mas o que nos conforta é saber que sua missão foi cumprida e que seus ensinamentos serão passados de geração em geração. Nosso apoio e alento serão sempre embasados em sua fé e em seus ensinamentos para educar nossos filhos e nossos netos", conclui amorosamente Joaquim Neto.

Alexandrina nasceu em Lavras da Mangabeira (CE) e faleceu em Ceilândia (DF), aos 88 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelos netos de Alexandrina, Thalita Ferreira Campos e Joaquim Ferreira Colaço Neto. Este tributo foi apurado por Lila Gmeiner, editado por Marcela Matos, Lígia Franzin e Thalita Ferreira Campos (depoimento de Joaquim), revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 24 de maio de 2021.