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Alzira Pereira de Figueiredo

1935 - 2021

Uma mulher de fé, da terra e das artes que criou os filhos com a força do lápis e da enxada.

Alzira cresceu no meio rural e ensinou aos filhos a lida do campo. Mesmo idosa, não deixava de pegar numa enxada e cuidar pessoalmente de seu jardim.

Foi agricultora, violonista, poetisa, escritora, bordadeira e muito mais. Extremamente dedicada à igreja, tentou passar à família o poder da oração e da fé que sempre a moveu em toda sua linda trajetória de vida. Dona de uma fé inabalável, rezou todos os dias de sua vida e, durante a pandemia, acompanhava diariamente a missa pela TV.

Entre seus tantos talentos destacavam-se a pintura, o bordado e a poesia. Alzira também chegou a escrever um livro e tocava violão muito bem. Outra arte que desenvolvia com maestria tomava forma e sabor num cômodo específico da casa: a cozinha. Era de lá que saíam doces incríveis. Suas compotas de figo e de pêssego então... Eram de deixar qualquer um com água na boca! E as bolachinhas então?! "A primeira coisa que a gente fazia ao chegar na casa dela era procurar pela lata onde eram guardadas as bolachas de vários tipos e formatos que ela preparava com perfeição. Eram sequilhos, bolachinhas de nata, de goiabada, rosquinhas torcidinhas... as melhores do mundo!", confidencia a neta Ana Luiza.

Apesar de ter estudado apenas até a terceira série do curso primário, Alzira mantinha com zelo sua produção literária. Adorava escrever músicas, poemas e discursos. O poema abaixo, intilulado "Despedida", foi escrito por ela e guardado a sete chaves por uma das filhas para que pudesse ser compartilhado apenas no momento certo: o de agradecer a todos (inclusive ao falecido esposo) e acalentar o coração dos seus:

"Ao partir deste mundo,
não deixo mágoas nem dor.
Vou morar com Jesus Cristo
que é nosso salvador.

Vou feliz, tenho paz no coração,
porque neste mundo cumpri minha missão.

De todas as minhas culpas,
ao Pai Celeste peço perdão.
Espero ter alcançado a eterna salvação.

Foi Jesus que falou, temos que acreditar:
A casa do Pai tem muitas moradas
e numa delas eu vou estar.

Aquele que fez o bem
e cumpriu Seus mandamentos
ressurgirá com Jesus,
no dia do julgamento.

Peço a Nossa Senhora,
mulher santa, corajosa e forte,
que interceda por nós juntos a Deus
na hora da nossa morte.

E aos queridos filhos,
─ a razão do meu viver:
Sigam os mandamentos de Deus,
para o céu merecer.

Ao meu querido esposo,
fica o meu agradecimento:
aos bons momentos
que juntos vivemos.

Peço ao nosso Pai Celeste
que nunca te deixe sozinho.
E que tua família te trate
com amor e carinho.

Aos amigos e parentes,
fica a triste dor da saudade.
Espero um dia nos encontrarmos
felizes na eternidade."

Alzira pode até não ter tido a oportunidade de estudar muito, mas certamente soube, em cada detalhe e durante toda a sua vida, mostrar e demonstrar a força das palavras (escritas ou não) a todos que tiveram o prazer e a honra de conhecê-la e, quiçá, de provar suas compotas e bolachinhas tão divinas como a companhia de quem está agora descansando.

Alzira nasceu em São Joaquim (SC) e faleceu em Brusque (SC), aos 86 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Alzira, Ana Luiza Souza Goulart. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Emerson Luiz Xavier e moderado por Rayane Urani em 30 de maio de 2021.