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Amanda Cristina Lourenço da Silva

1982 - 2021

Ela transformou a vida de jovens e adultos através do seu amor pelos números.

Amanda nasceu e cresceu em Taquaritinga do Norte, ao lado de quatro irmãos por parte de pai, Alexsandra, Alex, Monalisa e Juca. Ela amava e era extremamente apegada a eles, especialmente quando se tratava da mais velha, Alexsandra.

A infância de Amanda também foi iluminada por sua mãe e fiel companheira, Risonete – ou dona Neta, como a família costumava chamar. Em seu tempo livre se juntava à mãe nas costuras. Como companhia das duas, o velho radinho à tiracolo para ouvir os sucessos da época. As duas eram uma dupla inabalável e a sintonia desse par parecia que não podia ser melhor, até que chegou Joyce, dando preenchimento a um espaço que Amanda e Neta ainda não sabiam que existia. Juntas, formavam a "Casa das Três Mulheres".

Amanda teve Joyce aos quinze anos e, infelizmente, precisou lidar com as dificuldades e o preconceito de ser mãe solo na adolescência. Entretanto, sua força e perseverança eram tamanhas que Amanda transformou todas as adversidades em combustível para realizar seus sonhos. Seguindo em frente, sempre contando com o apoio de sua mãe e de sua filha, ela foi atrás de seus objetivos e através do seu trabalho como costureira, conseguiu sustentar sua casa e pagar a faculdade, nunca permitindo que Joyce e dona Neta sentissem falta de alguma coisa, fosse bens materiais ou amor.

Amanda sempre foi apaixonada pelos estudos. Amava aprender e ensinar. Gostava de conhecer sobre tudo, mas os números ocupavam um lugar especial em seu coração desde criança. Ela era uma matemática nata e amava ficar estudando um único problema e só descansava depois de conseguir resolvê-lo. Quando adulta, tornou-se professora dessa disciplina - o dia de sua formatura, aliás, foi um dos momentos mais sublimes que ela viveu - e tinha o compromisso de ajudar seus alunos não só a decifrarem as incógnitas que as operações numéricas traziam, mas também a se tornarem bons seres humanos.

Como educadora, trabalhou em diversas áreas e construiu um legado belíssimo na sua cidade natal. O nome da professora Amanda estava na mente e no coração de qualquer filho norte-taquaritinguense. Ela lecionou suas aulas na zona rural, no CAIC, José Bezerra, Gilzenete Guerra, mas suas turmas favoritas eram a de EJA (Educação de Jovens e Adultos). Amanda amava ensiná-los, não media esforços para incentivar a não desistir e era incendiada por um sentimento indescritível a cada turma de EJA que ela ajudava a formar. Com muito orgulho, Amanda organizava a festa de graduação ao final de cada ciclo letivo, arrumava o capelo e a bata, providenciava o bolo e fazia questão de encontrar uma pessoa responsável para registrar o momento de vitória dos estudantes. Eles haviam vencido e, mesmo Amanda afirmando que o mérito era todo deles, ela foi fundamental na transformação da vida dessas pessoas.

Amanda foi uma professora que honrou seu diploma e que contribuiu para o desenvolvimento de um Brasil mais justo. Não é à toa que ela foi uma das professoras preferidas nas escolas onde passou. Sempre buscando retribuir todo o cuidado e dedicação que recebiam da educadora, seus alunos e ex-alunos preparavam uma festa de aniversário para Amanda todos os anos.

Ela nunca parou de estudar: fazia cursos, aperfeiçoamentos, pós-graduações e mestrado, chegando, inclusive, a cursar uma segunda graduação, que concluiu no ano de 2020. Sua especialização era Gestão Escolar.

Quando Amanda não estava mergulhada em seus números, estava com sua cabeça nas nuvens, pensando na próxima viagem que faria. Amava viajar, conhecer novos lugares e outras culturas, sempre acompanhada de Joyce e dona Neta, principalmente no Carnaval, data em que as Três Mulheres faziam questão de estar juntas. Dentre tantos lugares já visitados, Porto de Galinhas era um dos destinos mais queridos. Quando a família não podia acompanhá-la em seus passeios, Joyce e dona Neta esperavam ansiosas o momento em que Amanda retornaria e contaria todas suas histórias e as coisas novas que aprendeu, sempre com seu característico brilho no olhar.

Quando não podia viajar, aproveitava o aconchego de seu lar e assistia à séries, vídeos no YouTube e cozinhava com a filha. Amanda gostava muito de preparar lasanha com presunto e queijo e para sobremesa, banoffe, uma torta de banana com doce de leite. Ela ensinou Joyce cada uma de suas receitas, inclusive a de um pãozinho caseiro especial. Aliás, ela ensinou à Joyce absolutamente tudo.

Ela era uma mãe como nenhuma outra. Extremamente presente na vida da filha, ela era a fã número 1 de Joyce e acompanhou todos seus passos, sempre pronta para defendê-la com unhas e dentes. Uma verdadeira mãe leoa, que protegia, aconselhava e guiava a filha para seguir o caminho do bem. Seu olho vivo não deixava passar nada; para "dar um perdido" nela era preciso muito esforço.

Amanda comprou uma casa para Joyce, um investimento bastante alto, mas que ela fez com muito gosto, apenas com a intenção de poder dar uma vida melhor ao seu maior tesouro. Nesse dia, mãe e filha se abraçaram muito, choraram de felicidade e comemoraram a grande conquista que realizaram lado a lado. A medida que cada móvel encontrava seu lugar, elas se emocionavam mais.

Como filha, Amanda era totalmente dedicada, amorosa e prestativa, estando ao lado da mãe nos momentos doces e também ao se depararem com as desventuras da vida. Em 2017, dona Neta enfrentou com muita bravura um câncer e durante todo o tempo, desde o diagnóstico até a notícia da cura, Amanda esteve presente, doando-se por completo e transmitindo força e coragem para a mãe. Chegou a solicitar uma pausa no trabalho para dedicar-se à dona Neta e quando teve conhecimento de que a mãe estava curada, Amanda fez uma festa grandiosa no Hospital Santa Águeda, levou bolos e lanches, tocou o sino da vitória e discursou sobre fé e perseverança para todas as pessoas presentes, provocando lágrimas até nas mais incrédulas.

Amanda deixou um pedaço de si em cada lugar por onde passou. Ela está nas fotos da parede de sua casa, na sua mesinha de trabalho, no novo lar que ela lutou para dar à filha, em cada aluno que teve o privilégio de aprender com uma professora tão responsável e, principalmente, no coração e na memória de Joyce e dona Neta. Mesmo em tempos de tristeza, Amanda era capaz de encontrar felicidade e transmitir alegria e bondade sem pedir nada em troca. Seu legado de fé, resiliência, bom humor e amor pela vida é eterno e está cravado no coração de todas as pessoas que a conheceram.

Amanda tinha muito orgulho de suas raízes pernambucanas; era completamente apaixonada por sua cultura e se emocionava ao ouvir o hino de Pernambuco. Em homenagem a ela, sua filha pediu ao poeta Roberto Celestino um poema dedicado à vida e memória de Amanda Cristina Lourenço da Silva. Segue:

O Senhor nos presenteia
Bem mais do que merecemos
Pois são bênçãos grandiosas
Que do Pai nós recebemos
Muitas valem mais que o ouro
São amigos que nós temos.

Vou falar de uma pessoa
Mãe, amiga e companheira
Uma filha sem igual
Na vida grande guerreira
O sorriso, a sua marca
Que temos pra vida inteira.

Seu nome, Amanda Cristina
Ou Amanda, professora
Deixou marca em muitas vidas
Como boa educadora
Mas foi conhecida em tudo
Como grande vencedora.

Desde cedo aplicada
Aos estudos que ela amava
Mas nas horas livres ela
Sua mãe sempre ajudava
Costurando e sempre ouvindo
Seu radinho que tocava.

Matemática ela amava
Disciplina preferida
Estudava com afinco
Queria vencer na vida
Sua mãe com muito orgulho
Olhava a filha querida.

Era também dedicada
Em ao próximo ajudar
Sempre teve isso consigo
De amor prático mostrar
Sobre isso ela aprendeu
Lições de amor em seu lar.

Aos quinze anos de idade
Na flor da adolescência
Um fato iria levar
De menina, a aparência
Ficou grávida e foi esta
A maior experiência.

Por ser Amanda tão jovem
Preconceito ela sofreu
Dificuldades imensas
Mas nunca se abateu
Aos olhares tortuosos
A cabeça Amanda ergueu.

Sua filha então nasceu
Joyce, sua filha amada
Mesmo sendo uma mãe jovem
Em tudo foi dedicada
Trabalhando com esforço
Para nunca faltar nada.

Costurando com empenho
A faculdade mantinha
Segurava a sua casa
Sem nunca faltar nadinha
Se esforçava por sua mãe
E pela linda filhinha.

Pelo esforço empreendido
Chegou a compensação
O dia da formatura
Dia de muita emoção
Ela expressa alegria
E a Deus muita gratidão.

Mas não parou por aí
Continuo a estudar
Sempre se especializando
Não cogitava parar
Por isso que se tornou
Profissional sem par.

Tal qual seu amor por números
Tinha também por viver
Sempre sempre desejosa
De lugares conhecer
Ela amava viajar
Isso dava-lhes prazer.

Na volta de suas viagens
Empolgada relatava
Toda a sua experiência
Em detalhe ela contava
Quem ouvia o seu relato
Nele também viajava.

A união dentro do lar
Era coisa grandiosa
Com a mãe e com a filha
Uma amizade fervorosa
Pela casa ainda ressoa
Sua risada tão gostosa.

Pensado na sua filha
E garantir seu futuro
Esforçou-se ainda mais
Sempre trabalhando duro
E comprou-lhe uma casa
Deu-lhe um lar bom e seguro.

Ano 2017
Algo a ela perturbou
Um câncer na sua mãe
Mas ela não se abalou
Dedicou-se totalmente
E de sua mãe cuidou.

Viu a sua mãe curada
Então lá no hospital
Fez festa comemorou
E ainda no final
Testemunhou que a fé
Vence a tudo afinal.

Mas foi além da família
A sua dedicação
A sua marca ela deixou
Também na Educação
Pois como profissional
Se entregou de coração.

Fosse jovem, fosse adulto
Criança, adolescente
Tratava os seus alunos
Iguais, nunca diferente
Sempre incentivando a todos
Pra seguirem sempre em frente.

Aprendemos muita coisa
Com a professora querida
Mas ela não ensinou
A lição na nossa vida
Como vencer a saudade
Que no peito é dolorida.

No dia vinte de maio
Deste ano nos deixou
A mulher forte e guerreira
Quanto pode ela lutou
Mas entendemos que ela
A carreira completou.

Somos gratos ao Senhor
Por ter nos presenteado
Com alguém especial
Pra viver ao nosso lado
Um dia a encontraremos
Pra um abraço apertado.

Foste um exemplo de filha
E exemplo de mãe também
Foste amiga e companheira
Poucas como você tem
Professora dedicada
Foste pessoa do bem.

Para a filha, a eterna mãe
Para a mãe, sempre a menina
Para todos, professora
Que pra sempre nos ensina
Com a vida e com o sorriso
Marca de Amanda Cristina.

Amanda nasceu em Taquaritinga do Norte (PE) e faleceu em Caruaru (PE), aos 39 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Amanda, Joyce da Silva Dias. Este tributo foi apurado por Rayane Urani, editado por Camilla Campos Trovatti, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 25 de agosto de 2021.