1928 - 2020
Espanhol no RG e brasileiro no coração. Homem bonachão, simples, amigo, religioso e com um astral muito alto.
Já tendo sido Cabo no exército espanhol, Anselmo veio para o Brasil no início da década de 1950. Não trouxe só a bagagem, mas também uma mulher em seu coração. Casou-se com ela em 1956 por procuração; seu pai o representou na igreja e a esposa veio posteriormente para o Brasil, onde estabeleceram a família que viria a crescer em 1957, com o primeiro filho.
Inicialmente sapateiro, o já mais brasileiro que espanhol também trabalhou como porteiro e sócio de pequenos negócios. “Sócio que participava mais com labor que com dinheiro”, conta o filho Roberto, que relembra um episódio que aconteceu em 1962 e mudou a vida do pai: “Ele levou um tiro na perna ao apartar uma briga no restaurante onde era sócio. Um ano hospitalizado, com risco de amputação. Mas, com o fundamental apoio da sua amada, voltou à ativa. Com uma perna um pouco mais curta, é verdade. Mas, voltou! Um sapato especial o deixava em condições normais para trabalhar. E como trabalhou! De domingo a domingo, do nascer ao pôr do sol, ou mais! Só começou a folgar aos domingos e reduzir o expediente do sábado lá pela década de 70, quando, nos poucos dias de lazer, geralmente levava a família para o Club Espanhol de Niterói.”
Em 1965, o ex-cabo passou a trabalhar no Ribalta Bar; o emprego perdurou por quase 50 anos, até a aposentadoria, em 2014. Em 1967 nasceu o segundo filho. Ah, os filhos! Que fossem bons homens e que estudassem e se formassem no que quisessem era o desejo do pai; não gostaria que um dia precisassem trabalhar tão árdua e pesadamente quanto ele.
Na década de 70, Anselmo compra um pequeno sítio com dois amigos, também espanhóis, para se reunirem e jogar a "brisca". “Gostavam tanto disso que combinaram que o último que morresse levaria o baralho para se reunirem lá, no céu, e jogar uma "brisca"! O tempo foi passando e algumas décadas depois vão-se esses grandes amigos para a companhia de Deus.”, relata Roberto.
No ano de 75, o espanhol de coração brasileiro tirou suas primeiras férias desde que chegou ao Brasil. O destino? Parece óbvio: a Espanha. Foi rever a família junto à sua amada e o segundo filho; o primeiro não foi porque havia sido aprovado no vestibular, o que foi motivo de orgulho para todos. Esse mesmo filho, o mais velho, se casa em 82 e o primeiro neto chega em 85; a segunda chega em 92. Logo em seguida, o filho mais novo também se casa e em 2002 chega a terceira neta. Em 2007, a quarta; caçula do time. A cada neto que chegava o avô transbordava de alegria. “Eram os seus xodós! Que alegria estar com ele ou elas. Ver-lhes o sorriso. Sempre que possível adorava estar com toda a família reunida, rezar antes da refeição e, vez por outra, declamar algo muito engraçado”, relembra o filho Roberto.
Em 2017 vai-se a companheira de uma vida e, em 2020, vai ele ao encontro de Deus para se reunir novamente com sua amada e seus amigos. Aliás, levando o baralho, como combinado.
“Que Deus o tenha no bom lugar que merece!”, deseja o filho, eternizando a história do pai neste memorial.
Anselmo nasceu em Verin, Ourense (Espanha) e faleceu em Niterói (RJ), aos 91 anos, vítima do novo coronavírus.
História revisada por Irion Martins, a partir do testemunho enviado por filho Roberto Blanco Dominguez, em 20 de julho de 2020.