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Antônio Feitosa dos Santos

1948 - 2020

Singelo, revezava os ouvidos entre o som dos passarinhos e as canções do Rei Roberto Carlos.

“Você, meu amigo de fé, meu irmão camarada. Amigo de tantos caminhos e tantas jornadas. Cabeça de homem, mas o coração de menino. Aquele que está ao meu lado em qualquer caminhada”. Este trecho da canção “Amigo”, de Roberto Carlos, é praticamente um retrato de Antônio. A letra é auto-explicativa.

Conhecido pelo apelido carinhoso Mexerica, foi homem muito carismático, comunicativo, bem-humorado. Tinha energia e positividade contagiantes. Ajudava a todos sem medir esforços. Amava trabalhar e não conseguia, nem gostava, de ficar parado em casa por muito tempo.

Mexerica recebeu esse apelido na época em que foi metalúrgico na METAL LEVE. Sua cabeça, segundo os colegas, teria o formato da fruta. Fez carreira como eletricista e recebeu uma linda homenagem por seus mais de dez anos dedicados ao trabalho na empresa. Mais velho, Antônio se tornou autônomo. Decidiu ser taxista, pois queria ter mais liberdade quanto a seu horário de trabalho. Assim, passou a ter mais tempo para família e filhos. Não queria mais se prender a regras de terceiros.

A família era sua maior paixão. Pai de seis, sempre gostou de casa cheia e mesa farta. Antônio amava brincar com os netos e contar histórias a eles. Aliás, era o contador de histórias oficial da família, sempre preocupado em reservar esse momento para as crianças. Não se cansava de dizer: queria a família sempre unida e feliz.

Para a filha Sandra, Antônio era altruísta e conselheiro. “Sempre nos aconselhou a gostar de quem gostava da gente e nunca depender de ninguém, sempre lutar e correr atrás dos nossos sonhos e objetivos”, conta. Por fora era um homem forte, cascudo. Dentro, amável e único. Gostava de assistir vídeos engraçados, ouvir sertanejo antigo e assistir a programas como os da Inezita Barroso. Ligava na TV Aparecida todo domingo de manhã.

Era também pela televisão que Antônio se via mais próximo de dois de seus amores, Roberto Carlos e o Santos Futebol Clube. Torcedor de coração, assistia a todos os jogos do Peixe. Mas era mesmo Roberto Carlos quem o fazia transbordar em sorrisos.

Gostava genuinamente de todas as músicas do Rei. Tinha todos os álbuns e os escutava com muito carinho. É difícil dizer qual lhe agradava mais. Tinha apreço especial pela canção “Detalhes”; a melodia, a letra... tudo o encantava. Era tanto amor que Antônio aprendeu a tocar violão sozinho para dedilhar o instrumento no quintal cantando a Jovem Guarda.

“Lembro sempre de seu sorriso e seu olhar doce, de sentar em seu colo durante a infância enquanto ele tocava o violão e cantava com voz suave canções da Jovem Guarda, de Roberto e Erasmo Carlos, alguns outros clássicos da época”, lembra Sandra.

Antônio tinha uma conexão muito intensa com a natureza. Estar em sintonia com o meio ambiente lhe trazia paz, era combustível para seu corpo. Costumava assistir vídeos do som das árvores e do canto dos pássaros. Se encantava com o som, ouvir as aves cantarem o transportava de si, o conectava com a arte de voar. Chegou a criar alguns pássaros. Os bichinhos sentiam seu bom coração. Cuidou com muito carinho deles e se apegava com facilidade. Chorava quando algum morria.

Mexerica era único, não queria mais ver nenhum passarinho em gaiola. Admirava a liberdade deles, queria mudar para um sítio e apreciá-los livres. Se via plantando uma horta e contemplando suas cores.

Antônio encontrou um lar no ar puro do campo, no cheiro das flores, no canto livre dos passarinhos e nos fragmentos da natureza que o acolheram e viverão para sempre em sua alma.

Antônio nasceu em Bom Conselho e faleceu em São Paulo, aos 72 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido filha de Antônio, Sandra Feitosa. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Beatriz Brito, revisado por Daniel Schulze e moderado por Rayane Urani em 29 de agosto de 2020.