1946 - 2020
Seu Tonho amava forró, sorrisos e os apelidos que colocava em seus amados.
A neta Amanda Luiza inicia sua homenagem com um trecho do baião mais conhecido de Luiz Gonzaga e apresenta seu amado avô Tonho:
"Quando olhei a terra ardendo
Qual fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação…" (Asa Branca)
Agora mais do que nunca, essa canção ficará marcada no meu coração, pois foi a última música que toquei e dancei com meu avô. Era um domingo comum, dia de ir pro sítio e colocar as prosas em dia, como costumávamos fazer. Nesse dia, a sanfona dele estava no quarto, e eu, muito brincalhona e saudosa do nosso queridíssimo São João, pensei em fazer uma brincadeira e tocar para meus avós. Ainda bem que pensei, pois naquela noite eu toquei e ele tocou pra gente também. Rimos a noite inteira.
Ele fez questão de me instruir antes de começar a tocar:
"Siri, não é assim que se toca, você precisa usar os dois lados, os botões... tudo da sanfona, pra tocar certo". Ouvi e tentei seguir as regras, só que parecia ainda mais difícil do que ele me falou. Então me entreguei e disse: "Desisto! É melhor o senhor me mostrar como faz!" Ele se levantou e tocou com a maior alegria do mundo, os acordes não batiam com a música que ele queria tocar, mas a gente sabia qual era, era uma de suas favoritas: Asa Branca. Pedi pra minha irmã gravar em segredo para que ficasse registrado. Que bom que pedi! Porque aquela foi a última vez que nos divertimos.
Quero que as pessoas saibam o avô, o pai e o ser humano maravilhoso que ele era. Gostava de agradar de todos os modos, era radical, subia em pés de manga, pés de jaca e coco para providenciar o lanche da tarde no nosso sítio. Seu estilo era peculiar, à moda de blusa de listras com bermuda xadrez. Folia no sítio e aniversários? Era o primeiro a pegar as panelas da vó pra gente batucar. Depois vinha e dizia: "Siri, vai amassar as panelas da tua vó, larga de tuas 'invenção' Siri". Escondia as sandálias de quem deixasse à toa para que pudessem procurar, comprava caixas de chocolate e deixava à mostra para os netos pegarem, mas ao abrir, não tinha nada, e ainda acusava o primeiro que pegou a caixa de ser o comilão que não dividiu com os outros. Sabia como fazer a gente se sentir original, para ele todos tinham sua própria identificação na família, de acordo com sua personalidade.
Amava um forró, uma fofoca em família, um desabafo de um filho, um abraço e um sorriso. Sabia fazer piadas como ninguém e, às vezes, me tirar do sério com elas. Também vivia em um relacionamento seríssimo com seu rádio, sempre no ouvido, no mais alto volume, desde às 5 horas da manhã, até a hora de dormir, se deixassem. Era louco pelo Galo, e fazia questão de que seus netos fossem também. Enquanto ele se estressava com o andamento do jogo, eu costumava olhar pra ele e rir, agradecendo por ter um avô tão bravinho, mas tão apaixonado pelo seu time, que fez ali nascer a tradição de irmos juntos para o Rei Pelé torcer ou então só comer amendoim. Amava viajar com os seus, ouvindo sempre o mesmo CD, e visitar os mesmos lugares. Era nossa tradição. O nosso tio e avô Tonho, que amou sua família como ninguém, assim como sua família o amou de volta também.
Realizamos o sonho de viver com ele e vovó, os cinquenta anos de casamento, e foi um momento muito especial na nossa família. Certo dia, meu avô chamou minha avó para a missa e, com mais duas testemunhas, se casaram "em segredo" na igreja. Chegaram em casa contando aos filhos. Um tempinho depois, os pombinhos estavam nas bodas de ouro e nós, radiantes com o casamento que finalmente poderíamos participar. O melhor de tudo foi ver o sorriso de um canto a outro no rosto daqueles dois. Tietamos mesmo. Tiramos fotos, gravamos vídeos, viramos noites fazendo lembrancinhas, rodamos pra achar as roupas dos noivos. Vivemos com intensidade cada momento dos 50 anos. E que bom que vivemos, pois os melhores sorrisos foram ali.
Nós, aqui, ficaremos firmes por você, por sua determinação e alegria, pela sua vontade de viver e seu amor por nós. Sei que aí do céu estará tocando a Asa Branca pra gente quando mais precisarmos do teu sorriso. Sei que você ficará pra sempre na nossa memória, nos nossos corações, no nosso sítio, no nosso lugar que com tanto carinho você abria as portas pra nós. Nós te amamos tanto, meu avô! A saudade vai apertar demais, mas nós sabemos que você é nosso anjinho que está cuidando de nós, assim como sempre cuidou.
De todos nós, um abraço pra chegar ao céu.
Siri, Ulisses, Sical, Cabelo, Ararão, Cara Pintada, Consolação, Cabelo de Balaio, Cabeça Tronxa, Pim-Bim-Bim, Dida, Marcinho, Du, Nega, Zé Grande, Solução, Cabra, Guilérme Palmeira, Cassola, Sapato, Carmelito, Cabeça de Formã, Lerma, Betonha, Maloqueira, Tamborete, Zé do Caroço, Rumão e ainda muitos outros que possuíam sua própria identidade, chamada pelo Tonho.
Antonio nasceu em Flexeiras (AL) e faleceu em Maceió (AL), aos 74 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Antonio, Amanda Luiza Santos da Silva. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Lícia Zanol e moderado por Rayane Urani em 7 de junho de 2021.