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Aparecido Ferrari

1958 - 2021

Nada o segurava. Estava sempre procurando algo para fazer e ali demonstrar seu amor ao próximo.

Filho amado, que soube tão bem retribuir esse amor aos pais, Ana Trevisan Ferrari e Valto Ferrari. Esposo há quarenta anos de Célia Regina Pereira Ferrari, dessa união vieram os filhos Glaucia, Daniela, Camila e Guilherme, o caçula temporão, e mais recentemente o neto João Victor Ferrari Natale.

Pedreiro aposentado, pescador por paixão, Cido pescava quase todos os dias. Quando não estava no estaleiro, sentado calmamente esperando os peixes morderem a isca, estava na igreja. Era outra paixão do pai de Glaucia. "Meu pai era conhecido como 'Pescador', mas também era muito religioso e se dividia entre a pesca e sua devoção à Nossa Senhora e a São Miguel Arcanjo."

Sua mãe, já devota de Nossa senhora Aparecida, lhe deu o nome em sua homenagem. Aparecido carregou a fé, o otimismo e a espiritualidade. Tinha o hábito de ir regularmente à missa, principalmente todo dia 29, pois onde morava, todo mês nesta data, comemora-se o dia de São Miguel Arcanjo. Cido, como também o chamavam, era muito amigo do Padre Tibério, da paróquia de Jaboticabal; então ia sempre lá cedo, ajudar a preparar a missa em homenagem ao santo.

Glaucia é a filha mais velha e lembra com muito carinho do pai: "Ele sempre repetia a frase: 'temos que ter uma fé viva'. Foi pensando em seu exemplo, que após sua rápida e dolorosa partida, retornei à igreja e me consagrei à Nossa Senhora. Ele sempre foi um super pai, amava a família e a imagem que mais me remete a ele é da infância, ele me levando para passear de bicicleta, e o peito aperta de saudade."

Cido não dirigia, então andava sempre de bicicleta e mais tarde à pé. Mas mesmo assim, sempre se virou, segundo a filha, pra ir onde fosse e fazer qualquer coisa pelos seus. "Era nosso faz tudo", diz Glaucia.

Do mesmo modo, amoroso e com o coração bom que tinha, não media esforços para ser solidário. Como sua maior marca era sua fé, as pessoas costumavam lhe pedir orações, geralmente quando estavam doentes, com depressão etc. Ele ia a hospitais ou onde necessário, rezar pelos enfermos. Cido também participou muito tempo do grupo de pais da igreja.

Glaucia ainda descreve o pai como um homem muito otimista e de sorriso fácil. "Meu pai tinha sempre aquela risada gostosa que animava as reuniões. Era 'pra frente', uma pessoa de muitos amigos e se dava bem como todo mundo. Tinha uma grande amiga, Marilda. Ele sabia cozinhar o básico, mas adorava comer um bom churrasco. Só que tinha uma mania que rendia contrariedades: cismava de colocar músicas religiosas em pleno churrasco! Como não combinava com o clima de descontração do evento, dávamos risada, mas reclamávamos também, e ele não entendia."

Além das músicas religiosas, Cido gostava de músicas internacionais antigas e corridas de Fórmula 1, segundo a primogênita, que cita ainda outros gostos e características do pai: "animais? Acho que só selvagens mesmo, tipo alguns pássaros. Muito vaidoso, não saía de roupa amassada! Gostava de usar tecidos de cor clarinha, tipo branco, amarelo ou azul claro. Não gostava de cores escuras. Como todo mundo, também tinha defeito, mas nada muito importante; era só um pouco teimoso e ansioso. Acelerado, estava sempre procurando algo pra fazer, que em geral era pescar ou rezar. E quando dormia deixava aparente sua marca registrada: ficar com o pescoço torto igualzinho ao meu avô."

Pai e filha têm uma ligação forte desde que ela nasceu. Glaucia tinha um defeito congênito na uretra e após muita pesquisa, aos nove meses, chegou-se à conclusão que precisava fazer um implante. Cido bebia e fumava muito à época, mas agarrou-se à sua fé e fez uma promessa pela filha. Nunca mais voltou a fumar.

Muito ligado à uma irmã mais nova, Luciana, que ainda sente demais sua falta, Aparecido era o mais velho de cinco irmãos: João, Lourdes, Luciana e Nélson. Com o cunhado Beto e um grupo de amigos, o 'Pescador' estava sempre sentado no estaleiro (deque de madeira) com seu fiel companheiro - um chapéu de palha de abas largas. E é desse jeitinho que ficará eternizado na alma e na pele de Glaucia, que fez uma tatuagem com essa imagem e a palavra 'Pai'.

Aparecido nasceu em Colina (SP) e faleceu em Bebedouro (SP), aos 62 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Aparecido, Glaucia Ferrari. Este tributo foi apurado por Larissa Reis, editado por Denise Pereira, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 24 de setembro de 2021.