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Bruno Eller

1959 - 2021

Aos domingos, fazia questão de organizar um churrasco para reunir a família e se divertir contando piadas.

Extremamente calmo, com sua fala mansa e com ares de timidez, era a paz em pessoa.

Bruno conheceu Terezinha Aparecida, sua companheira de toda uma vida, numa festa da paróquia onde cada um foi com seu grupo de amigos. Desse encontro e das conversar que tiveram ainda durante a festa, resultou um encantamento entre eles. Na semana seguinte, ele a procurou e começaram a namorar.

No dia em que completaram um ano de namoro ele a pediu em casamento, e três meses depois os dois já estavam trocando as alianças. No início da vida a dois eles moraram de aluguel, por um tempo, até construírem a casa em que a família reside há mais de trinta anos.

Dessa união vieram três filhos: Bruna, a primogênita, e os gêmeos Diego e Diogo. Bruno foi um pai muito presente, principalmente quando o assunto era educação. Apesar de não ter tido oportunidade de estudar, sempre buscou garantir ensino superior aos filhos. Durante a infância deles, sempre dedicava um tempo durante a noite para ajudá-los nas tarefas escolares. "Para mim, essa é uma memória muito forte porque demonstra como ele se esforçava para que tivéssemos gosto pelo estudo", conta Diego.

O maior sonho de Bruno era presenciar a formatura de seus três filhos e esse desejo quase foi totalmente realizado: viu a filha mais velha formar-se em Direito e o caçula, em Sistemas de Informação. Não pôde acompanhar a formatura em Engenharia de Produção de seu filho do meio, seis meses após a sua partida, mas para a família, de alguma forma, o pai esteve presente.

Outro grande sonho era a compra de uma fazenda ou de uma casa na praia. Desde a infância dos filhos ele gostava muito de viajar com toda a família para esse tipo de lugar.

Pai amoroso e presente, cuidava com afinco da família. Era o responsável pelo churrasco de domingo e procurava se assegurar de que tivesse sempre carne e carvão para esse dia, e também de que todos estivessem presentes para ele poder contar piadas e rir bastante.

O filho Diego gosta de lembrar as histórias que o pai contava e dentre elas uma se destaca: “Meu pai veio de uma família muito humilde. Certa vez, ele foi para a escola com um boné novo, que acabara de ganhar. Nesse dia, a professora levou os alunos para um piquenique em uma trilha na floresta. Quando eles estavam sentados, comendo um lanche, um colega, que aprontava muito com ele, repentinamente tomou o seu boné. Meu pai conseguiu segurar com firmeza o acessório, mas o rapaz não queria soltar. Foi então que ele cerrou o punho esquerdo e deu um soco no rosto do menino, que imediatamente caiu no chão e nunca mais aprontou com ele. Essa história é marcante para mim, porque meu pai era um homem extremamente pacífico, e saber que ele agrediu alguém causa um estranhamento e algumas risadas”.

Durante trinta e sete anos Bruno trabalhou como tecelão numa mesma indústria têxtil e, na maior parte desse tempo, exerceu essa atividade no terceiro turno. Por isso, durante a semana, dormia boa parte do dia. Ele era extremamente caprichoso em sua função e todos gostavam muito de trabalhar com ele.

A vida profissional do filho Diego começou ao lado do pai no chão de fábrica e, sobre isso, ele comenta: “Para mim, foi muito valioso ter sido promovido tendo meu pai literalmente como exemplo. Recordo do período em que eu contabilizava a produção e nos reuníamos para que eu anotasse corretamente os meus formulários. Volta e meia, nos esbarrávamos e ele estava sempre com um sorriso no rosto, pronto para dizer alguma amenidade que tornasse o trabalho mais leve”.

Quando estava em casa, nas horas vagas, gostava bastante de assistir os filmes do Mazzaropi, porque o seu estilo de humor, com suas anedotas e deboches, o fazia dar gargalhadas. Assistia também vídeos de viagens e lugares; nunca perdia o telejornal com as principais notícias do dia e acompanhava programas espalhafatosos e sensacionalistas. Ultimamente, passava horas assistindo conteúdo de um aplicativo de vídeos curtos.

Diego conta sobre um costume do pai: “Como ele trabalhava à noite, acabava dormindo na sala durante a tarde com a TV ligada. A gente se esgueirava pra pegar o controle da mão dele e trocar de canal, mas ele tinha um sono muito leve e bastava perceber a troca pelo som que já acordava dizendo: 'Eu tô assistindo'! Era sempre assim".

"Ele era frequentador assíduo da igreja católica, tinha convicções firmes e era difícil convencê-lo de algo que não acreditasse. Quando não concordava, o assunto era encerrado com uma discussão ou com o seu silêncio.”

Os filhos herdaram sua persistência, sua força e, às vezes, até sua teimosia. Consideram que a maior lembrança que Bruno deixou foi a casa que ele construiu do zero e a transformou em um lar onde ele continua presente, pois existe um pouco dele em cada parte.

“Meu pai se destacava por sua relação amigável com todos que conhecia", diz Diego. "Por trás de piadas e risadas, existia uma mente muito focada em levar tudo de melhor para dentro de casa, desde um sustento digno em momentos difíceis, até o incentivo constante de manter seus filhos estudando. Este homem era o meu pai".

"Ele passou muito tempo da vida no trabalho e, apesar disso, sempre se manteve presente com a família, nos almoços de domingo, nas idas para a praia nos finais de ano e nas viagens para o interior, de onde ele veio. Tudo o que conquistou foi fruto de seu trabalho."

Emocionado, Diego conclui sua homenagem dizendo:

"Pai, você merecia aproveitar muitos e muitos anos com a gente, usufruindo de sua aposentadoria tão batalhada."

"Você fez, conquistou, ensinou e aprendeu muito. Você lutou até onde podia e você não desapareceu. Estará sempre presente, com o ensinamento de que precisamos de pouco para sermos completos e felizes. Talvez, este seja o maior ensinamento que ele nos deu: sermos gratos pelas pequenas e simples coisas da vida.”

Bruno nasceu em Alfredo Wagner (SC) e faleceu em Blumenau (SC), aos 62 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pelo filho de Bruno, Diego Bruno Eller. Este tributo foi apurado por Andressa Vieira, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 17 de novembro de 2022.