1940 - 2020
Célio virou tango, conto e personagem principal em vários recomeços no futebol, dentro e fora de campo.
Célio estudou até a quarta série do, hoje chamado, Ensino Fundamental. Mas isso não o impediu de ler, aprender, ensinar e também a recomeçar.
Escolheu o futebol, em uma época em que os jogadores eram tachados como vagabundos, mas a realidade é que eram mesmo "amantes da bola". Na década de 60, o futebol tinha o sentido de jogar por amor e paixão ao esporte.
Foi difícil para Célio provar para os pais que o primeiro salário veio através de muito treino, dedicação e também de muitos gols. O ano era 1960, o clube: o Jabaquara, da cidade de Santos, no litoral paulista. "Quase matou a mãe, dona Ofélia, do coração, quando espalhou as notas de 'cruzeiro', a moeda da época, em cima da cama: "Tá aí, mãe. Teu filho é profissional", conta Camila, a filha de Célio.
Depois do Jabaquara, houve a primeira grande mudança de cidade e de time: da baixada santista para a cidade maravilhosa. Célio foi jogar no Vasco da Gama, foram 110 gols marcados e tornou-se o 15º artilheiro do clube cruzmaltino.
Chegou a ser convocado para a pré-seleção, que formaria a seleção brasileira de 66 para a Copa do Mundo da Inglaterra, naquele mesmo ano.
Disputou amistosos com Bellini, Gerson, Pelé, Tostão, Mané Garrincha e outros 40 jogadores pré-convocados pelo técnico Vicente Feola, em que ficaram os 22 jogadores que iriam jogar a copa no país em que o esporte virou jogo oficial... O Brasil não levou a taça, foi eliminado ainda na fase de grupos. Mas levou mesmo Célio às gargalhadas. "Na passagem pela Europa, Garrincha ganhou um rádio em uma loja da Alemanha. O dono da loja era fã incondicional do garoto das pernas tortas. Mas Garrincha não ficou com o aparelho, que mais parecia um edifício, porque Gerson o convenceu que aquele trambolho não 'falava português'", lembra a filha Camila ao contar o episódio divertido dos bastidores da seleção canarinho.
O então craque do Vasco, recomeçou a carreira, desta vez fora do Brasil: Nacional de Montevidéu, no Uruguai, onde ficou eternizado pelas frases "Adelante, Célio" e "Célio, El Matador".
O brasileiro virou ídolo para os uruguaios. Até hoje, é o terceiro maior artilheiro brasileiro da Copa Libertadores com 22 dois gols marcados. Célio tornou-se motivo de várias inspirações no país vizinho: virou tango, conto, nome de filho de fã e também amigo da torcida rival do Nacional, o Peñarol. Célio saiu do Nacional do Uruguai, mas o Nacional jamais saiu dele. Era sempre lembrado e ovacionado pela torcida através de mensagens, telefonemas, vídeos e também paixão, amor e amizade.
Retornou para o Brasil em 1970 para jogar, ou melhor, recomeçar no Corinthians, mas uma lesão tirou Célio Taveira dos campos, apenas como jogador profissional. O dinheiro que havia juntado ao longo da carreira foi perdido, com a falência do banco em que mantinha suas economias. Mais um recomeço, para o agora ex-jogador.
Recomeçou vendendo de porta em porta: calças e peças. Aceitou um convite do cunhado para mudar com a família para João Pessoa, na Paraíba. Recomeçou a carreira, agora como empresário; mas não abandonou de vez sua grande paixão: o futebol. Jogava peladas e também comentava, acabou virando árbitro aos finais de semana. "Ninguém queria levar um cartão amarelo do temido Célio", relembra a filha.
Era um jogador disciplinado e comprometido tanto dentro como fora de campo. Arrecadava alimentos para formar cestas básicas. Camila resume como era o Célio pai: "Todos sabiam que ele havia sido um jogador de futebol, mas poucos sabiam da grandeza dele. Para a família, Célio ensinou sobre humildade, perseverança, consertar os erros. Ensinou todo mundo que a morte é só um recomeço. Ele só esqueceu de nos ensinar a viver sem ele."
Célio nasceu em Santos (SP) e faleceu em João Pessoa (PB), aos 79 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pela filha de Célio, Camila Taveira. Este tributo foi apurado por Viviane França, editado por Mateus Teixeira, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 28 de junho de 2020.