1964 - 2020
Incentivava o filho a ir sozinho para escola, mas sempre o seguia, para saber se estava indo direitinho.
Eliane passou parte de sua infância no interior do Maranhão e ainda criança seguiu para a capital, onde foi morar com a mãe. Aos 15 anos engravidou de seu primeiro filho, George; três anos mais tarde, teve o Jean.
Dois anos haviam se passado desde os momentos felizes da chegada dos bebês quando ela começou a sentir fortes sintomas de uma doença neurológica degenerativa, que aos poucos foi comprometendo a sua mobilidade.
Aos 25 anos os sintomas se agravaram: passou a sentir dores e dormência na mão esquerda, e começou a perceber o início da atrofia em seus membros superiores. Com o tempo, começou também a perder o equilíbrio nas pernas, e as forças de todo o lado esquerdo do corpo. Infelizmente, naquela época, a medicina ainda estava avançando; a família não tinha muitos recursos e no recém-criado SUS ainda não era possível descobrir realmente a origem do que vinha acontecendo.
Eliane passou por uma cirurgia, que só agravou a situação. E foi somente em meados do ano 2000 que a família descobriu ao certo, por exames na Rede Sarah, que ela tinha a síndrome de Arnold-Chiari e uma infecção pelo HTLV1. Desde então, Eliane começou a fazer um tratamento adequado, mas a doença já estava em estágio bem avançado.
Anos mais tarde, Eliane teve outras duas filhas, a Chris e a Joyce. Por conta de sua saúde debilitada, da perda de sua mãe e da difícil vida na década de 1980, Eliane precisou deixar que as meninas fossem acolhidas por outras famílias. Mesmo sentindo muito, ela as deixou com pessoas que poderiam fazer mais por elas, e protegê-las da vulnerabilidade social em que viviam na época. No entanto, independentemente da distância, ela sempre manteve contato com as filhas.
Apesar de tantas adversidades, Eliane ensinou aos filhos tudo o que eles sabem. Ela amava cozinhar, sorrir e brincar. Era comunicativa e muito extrovertida. Preocupava-se em ensinar boas lições para os filhos, que se lembram dela sempre rezando com eles quando eram crianças. Ela fazia questão que os filhos permanecessem na escola. Na época, a escassez de vagas era algo recorrente, mas ela sempre dava um jeito para conseguir as vagas.
"Ela só tinha estudado até o 4° ano primário; mesmo assim, acompanhava a gente nas atividades escolares; às vezes, quando não entendia muito do assunto, dava um jeito de conseguir uma outra pessoa para nos ajudar nas lições", relembra George.
Uma das coisas que os filhos lembram, são dos conselhos que recebiam quando chegaram à pré-adolescência: "Se une, mas não se misture”; “você não tem que provar pra ninguém que é homem"; "se te chamarem de careta por não aceitar droga, deixa chamar".
Eliane incentivava os filhos a serem independentes. George conta que ia para escola sozinho, incentivado por ela, até que um dia descobriu que ela sempre o seguia para saber se estava indo direitinho.
Jean também vivia muito tempo com ela, dava toda atenção aos cuidados e a acompanhava no tratamento. Ele conta que, mesmo doente, ela lhe dava muitos conselhos sobre como seguir uma vida digna.
Eliane foi uma guerreira. Uma mulher de personalidade forte, que amava sorrir e apreciar as coisas simples da vida. Deixa seu exemplo de resistência e um legado eterno de amor.
Eliane nasceu em São Luís (MA) e faleceu em São Luís (MA), aos 56 anos, vítima do novo coronavírus.
Testemunho enviado pelo filho de Eliane, George Pereira de Sousa. Este tributo foi apurado por Luma Garcia, editado por Luma Garcia, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 17 de janeiro de 2022.