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Esmeralda de Oliveira Lima

1952 - 2020

Esmeralda realizou o seu maior sonho: ser mãe. Teve uma vida feliz e completa, regada de muito amor.

Todos os finais de tarde eram marcados pela presença de Esmeralda e seu esposo Cícero na calçada de casa. Sentados, ela rezava o seu terço e gostava de tentar adivinhar se ia chover ou não; ele, por sua vez, fazia companhia para sua amada. Embora tivessem temperamentos bem distintos, eles escolheram estar juntos e se complementarem ao longo de 34 anos.

Presenteada com Romário, Ruana e Raiana, ela realizou um de seus maiores sonhos: ser mãe. “Com dois anos, mais ou menos, de casada ela conseguiu engravidar do meu irmão e foi o sonho da vida dela se realizando. O meu pai é negro e o segundo sonho dela era ter um filho ou uma filha negra, e aí na terceira gravidez nasceu a minha irmã, que é negra. Acho que ela se realizou como mãe; tudo que ela quis, conseguiu ter”, relata sua filha Ruana.

Completamente dedicada à família, Esmeralda sempre incentivou os filhos a correrem atrás dos sonhos. “Ela sempre falava que a única herança que eles poderiam nos deixar era o estudo. E isso deixa o meu coração muito feliz, saber que ela conseguiu ver os três filhos formados – enfermeiro, nutricionista e contadora –, trabalhando nas profissões, da forma como um dia ela pensou ou, talvez, até mais do que ela pensou.”

Esmeralda era uma mãe superprotetora, sempre pensava nos filhos em primeiro lugar. Há alguns anos descobriu um nódulo no seio e optou por não contar a ninguém com medo de atrapalhar a vida dos filhos. “O médico disse que o câncer de mama poderia ter sido evitado. Ela achou o nódulo na época em que estávamos na faculdade e pensou que seria melhor esconder, porque algum de nós poderia desistir”, lembra Ruana. Tal preocupação com os filhos, antes mesmo de pensar nela, é apenas um exemplo do tamanho de seu amor.

Graças a sua garra e persistência, após uma mastectomia, Esmeralda conseguiu se recuperar e ficar bem novamente. “Quem conheceu minha mãe sabe que ela sempre foi muito alto-astral, não demonstrava fraquezas, mas a gente pensou que talvez ela ficasse pra baixo. Pelo contrário. Ela entendeu que aquilo era uma nova oportunidade pra ela, era uma nova vida.”

O sorriso estampado no rosto era sua marca registrada. “Todos a amavam, seu jeito generoso e amável cativava qualquer um ao seu redor. Era a tia amada pelos sobrinhos, a avó protetora das netinhas e a melhor mãe do mundo. Muito preocupada com a gente, ela olhava e sempre achava que estávamos magros, principalmente eu que morava longe. Dizia ‘Não está comendo direito, né?’”, conta Ruana.

Esmeralda adorava ler, escrever histórias da sua vida – ela anotava tudo em uma agenda para nunca esquecer –, assistir às novelas, conversar, visitar suas irmãs e suas amigas. Fazer palavras cruzadas era com ela; sempre podia contar com a ajudinha das netas Júlia e Ana Beatriz quando estava enrolada em algum enigma.

Dona de uma fé inabalável, Esmeralda era extremamente religiosa. Sua fé ia para além deste plano. “Ela sempre rezava em casa. Para cada pedido, ela sabia a qual santo recorrer”, relembra Ruana.

“Ela sempre dizia pra mim que não tinha medo de morrer, que queria ir como a mãe dela, dormindo. E, por incrível que pareça, assim foi. Às vezes eu acho que ela esperou chegar em casa pra isso acontecer. Por volta de uma hora da manhã, minha irmã percebeu que ela deu um suspiro com mais força e esse foi o seu último. Ela se foi como se fosse um passarinho”.

Chegou o momento em que essa preciosidade precisava reluzir em outro lugar. Diferentemente da pedra preciosa de coloração esverdeada, que é “extremamente sensível a pancadas fortes, riscos e mudanças de temperatura repentinas”, a nossa Esmeralda era extremamente resiliente, firme e eterna. E continuará sendo, onde quer que esteja e para todo o sempre.

Esmeralda nasceu em Crateús (CE) e faleceu em Crateús (CE), aos 67 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Esmeralda, Ruana de Oliveira Macêdo Martins. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Marina Teixeira Marques, revisado por Sandra Maia e moderado por Rayane Urani em 8 de fevereiro de 2021.