1935 - 2020
No carnaval, não perdia o desfile da Beija-Flor, sua escola de samba do coração.
A senhora mais elegante do bairro Gentilândia, na capital cearense, era certamente a Dona Marilza. Não saía de casa sem os brincos e um batom. Estava sempre muito bem-vestida e perfumada para seus passeios ao entardecer, quando costumava visitar as amigas. Sempre muito vaidosa, adorava receber elogios como os comuns "nossa, a senhora nem parece que tem essa idade!" ou "que pele maravilhosa!"
Viveu toda sua infância e adolescência na cidade natal. Após seu casamento com Francisco Airton, de quem ficou viúva em 2010, foi morar em um sítio em uma localidade chamada Jordão, um distrito de Baturité. Lá, de acordo com as histórias que contava, aprontou muitas traquinagens no Instituto Nossa Senhora Auxiliadora, a escola de freiras onde concluiu o Curso Normal. Dona Marilza amava sua família e adorava contar essas histórias do tempo em que era criança e adolescente. Também gostava muito de recordar os tempos em que morou no sítio Jordão, dos dramas ─ as encenações teatrais ─ que fazia com os filhos dos moradores e das novenas durante o mês de maio.
Muito católica e devota de Nossa Senhora, não perdia as missas aos sábados às 17h e as celebrações da primeira sexta-feira de cada mês. Falava sempre com muito amor, carinho e saudades de seus pais, Clodoaldo e Odilia.
Quando foi morar em Fortaleza, o bairro escolhido foi o Gentilândia, hoje conhecido como Benfica, bairro universitário onde se encontra a reitoria da Universidade Federal do Ceará.
Fã apaixonada por Roberto Carlos, não perdia um especial de fim de ano e, ai de quem dissesse que Roberto estava velho. Dançar, cantar e ouvir músicas eram certamente seus passatempos prediletos. E nem é preciso frisar que as canções do rei Roberto estavam sempre na ponta da língua, mas com um fone de ouvido cantava empolgada outros sucessos como "Meu Primeiro Amor", de Ângela Maria, "Sertaneja", de Nelson Gonçalves e "Ainda Ontem Chorei de Saudade", do Marciano.
Também adorava contar suas histórias dos bailes inesquecíveis no extinto Clube Maguary ─ Dona Marilza era pé de valsa.
Dona Marilza era uma pessoa cheia de vida, convivia com uma artrite reumatoide e alguns outros problemas de saúde que a idade avançada lhe trouxe, mas nada que tirasse sua alegria de viver. Com seu espírito jovem, a mãe de três, avó de 13 e bisavó de sete, gostava de estar rodeada de amigos e familiares e alguns chegaram até a apelidar sua casa de "Pensão 107".
Todas as recordações e histórias acima foram contadas pela neta Aline, que foi criada por Dona Marilza, a quem considerava e chamava de mãe. Aline era neta, mas tinha que dizer que era filha ─ isso era lei.
Aline diz ainda que poderia passar dias contando as tantas histórias das paixões e dos bailes, dos vestidos que a mãe usava e tudo que essa mulher cheia de vida e de alegria descrevia com riqueza de detalhes.
Como as despedidas em época de pandemia ficaram breves e restritas, Aline, em forma de homenagem, relembra cada momento vivido e finaliza: "A saudade é imensa".
Francisca nasceu em Baturité (CE) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 85 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Francisca, Aline Vasconcelos de Meneses. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Gabriela Carneiro e moderado por Rayane Urani em 11 de dezembro de 2020.