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Helio Bento de Oliveira

1967 - 2020

Trocava qualquer passeio pelo prazer de ficar em casa.

Helio trocava qualquer passeio pelo prazer de ficar em casa. A última aventura dele foi uma batalha contra a parede: queria fixar nela uns ganchos de rede e balançar sossegado nas horas livres. Mas, apesar do esforço, não deu tempo. Acumulou, isso sim, umas boas quedas. Mais de uma vez, a esposa estava na cozinha e escutava o estrondo, seguido de gargalhadas: ganchos, rede e marido estabanados no chão.

“Está tudo sob controle”, era a reação dele sempre. Possivelmente, mais por hábito, desde o pior dos problemas até a situação mais simples, tudo ganhava o mesmo tratamento. “Está tudo sob controle”, repetia, de folga e durante o expediente. Entre conhecidos ou num ambiente hostil. Era um homem de vida simples. Gostava de fazer o bem, de ajudar a quem pedisse e de dormir nas horas vagas. Detestava contrariedades e preferia afastar-se delas com um sorriso.

Preparava um churrasco de leitão de dar água na boca. Nas festas, aceitava tudo o que era oferecido por ter dificuldade em dizer não. As calorias em dobro acabavam na conta da esposa, que consumia às escondidas os pratinhos de Helio. Era um casamento cheio de carinho e de compreensão, uma história de encontros. Os dois, nascidos em Minas Gerais, nunca haviam se visto até o dia em que tomaram o mesmo ônibus, saindo de São Paulo para visitar a família.

Helio queria a companhia da esposa para tudo ─ ela é que abria mão da companhia dele vez ou outra, quando decidia passear e ele insistia em ficar em casa. Despertavam juntos, trabalhavam juntos. Mimavam a filha única sem discussão. Davam suporte para os familiares sem cessar.

Engenheiro por formação, acabou virando empresário quando recebeu como oferta a sociedade da metalúrgica que conseguiu recuperar. Formou equipe, atraiu jovens aprendizes. Investia o tempo dedicando atenção aos negócios e às pessoas. Sem ele por aqui, fica muito difícil controlar a saudade.

Helio nasceu em Tarumirim (MG) e faleceu em Itupeva (SP), aos 53 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela cunhada de Helio, Marcia Cristina Siqueira. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Juliana Parente, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 24 de dezembro de 2020.