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Jarbas Bezerra Ribeiro

1978 - 2021

Preferia ligar a mandar mensagens, o sorriso era o presente e acalento ao final de cada ligação.

Jarbas era o filho mais velho de uma família de quatro irmãos. Nasceu em Canguaretama, Rio Grande do Norte, em 26 de Abril de 1978. A origem era nordestina, mas já se considerava paulista, porque chegou em São Paulo com um ano de idade.

O pai era caminhoneiro e ele o acompanhava em várias viagens, desde criança. Contava histórias de brincadeiras e travessuras das viagens feitas juntos, como uma em que foi até Porto Seguro na Bahia. O caminhão passou a ser uma paixão herdada do pai a ponto de substituí-lo na empresa onde trabalhava, quando se aposentou.

Casou-se com Patrícia e tiveram dois filhos. O encontro em uma festa foi amor a primeira vista, iniciando naquele mesmo dia o namoro que terminaria em casamento três anos depois e duraria o tempo de vinte anos, interrompido pela sua partida precoce.

Foi um pai presente, muito cuidadoso e amoroso. Quando as crianças eram ainda bebês ele se levantava nas madrugadas para apoiar a esposa, nem que fosse apenas o apoio moral, indispensável nesses momentos, segundo ela.

Para desconhecidos podia parecer mal-humorado e bravo, mas bastava pegar amizade, que logo se podia experimentar o seu lado humano, o seu sorriso e a sua graça. Sua resiliência era uma característica, que os seus admiravam e se inspiravam. Uma grave doença de coluna o trazia dor e sofrimento, entretanto nunca foi motivo de reclamação ou questionamentos quanto ao merecimento de tal enfermidade.

Era um homem cristão que cultivou e amadureceu sua fé. Seus últimos dias foram de extrema comunhão e serviço com Deus. “Sigo em paz confiante que se eu permanecer fiel à Deus o reencontrarei um dia”, comenta Patrícia. Um homem caseiro, costumava pedir delivery e queria muito comprar uma casa em um determinado condomínio onde os amigos moravam, contudo não tinha ainda os recursos financeiros necessários para a aquisição. Contudo ao adquirir a tão sonhada casa, decorou-a ao seu estilo sendo motivo de grande felicidade.

Jarbas era um amigo fiel, que soube como poucos cultivar e manter amizades por uma vida toda. A amizade com Paulo Júlio nasceu na infância passou pela adolescência seguindo por toda a vida. Gostavam de se divertir jogando em fliperamas depois da escola. Depois de casado, continuou com a amizade ainda mais forte. Relembra dos passeios no shopping, cinema e almoços aos domingos. Os debates de futebol tinham dia marcado: todas as quintas e domingos e a conversa se dava por ligações de vídeo, uma regra que quase nunca era quebrada. Foram mais que amigos, eram irmãos.

Outro amigo, Marcilio, que também o considera um irmão, lembra com carinho da amizade. “Não sei nem como explicar ou falar dele. Foi também um amigo-irmão, crescemos juntos e brincávamos de futebol. Durante a adolescência saíamos bastante, apesar de turrão, tinha um coração imenso. Posso dizer que era um ser humano ímpar”.

O Cunhado Daniel lembra da generosidade dele que se empenhou para arrumar um emprego em uma transportadora, esperou o amigo no portão e ficou ali o tempo todo dando força para que conseguisse o trabalho. Se recorda: “A última vez que o vi, nós saímos para caminhar na praia e ele foi me dizendo os planos dele com a casa, com a família, como estava feliz após ter se recuperado da cirurgia. Paramos e tomamos uma água de coco”.

Bom conselheiro e um porto seguro da família nas dificuldades. A cunhada Priscila tinha em Jarbas e na irmã esse porto em momentos de dificuldade. “Quando tinha algum problema, era na casa deles que eu sempre me refugiava e me sentia acolhida. Outrossim foram muitos momentos bons juntos, risadas, alegrias, quando estavam em família: “No ano novo já combinávamos qual o sabor da batida que iríamos fazer e sempre tomávamos quase tudo sozinhos”.

Foi também em um Ano Novo, que a cunhada Larissa disse que passaram juntos, que Jarbas fez sucesso na pista de dança, fazendo performance de músicas antigas, passinhos, dancinha do robô e cantando Backstreet Boys. “Foi marcante para todos, porque não era comum vê-lo assim”. Se emociona ao relembrar, quando ele e a esposa a confortaram em um dos momentos mais difíceis de sua vida.

Já a sobrinha Mariana lembra que o tio era um homem gentil, que a recebia e aos pais muito bem, quando eles o visitavam e se empenhava em agradá-los. Ele tinha medo de assombração. Houve uma vez em que conversávamos do lado de fora da casa, era noite, e falávamos sobre assombrações. Ficamos em silêncio e meu pai deu um grito, todos nos assustamos e ele deu um pulo. Rimos muito e foi um daqueles momentos em que se lembrará para sempre”.

Não gostava de mandar mensagens, quando queria falar fazia uma ligação. Que valioso era ouvir a voz de quem se ama ao invés de receber mensagens copiadas. Ao final de cada ligação era possível sentir em sua voz a alegria do seu sorriso no outro lado da linha. Suas chamadas de voz eram tão especiais, que sempre pareciam a última, até que um dia foi, lembra com emoção a cunhada Katiane.

Para os sogros Bartolomeu e Sandra, Jarbas foi mais um filho amado. A família inteira encontra na fé motivos para crer que ele esteja com Deus olhando por eles e que um dia novamente estarão juntos, gargalhando, compartilhando amor, apenas sendo felizes. “Sua história, sua passagem pelas nossas vidas, só nos relembram o quanto devemos valorizar os pequenos momentos, as pessoas que estão ao nosso redor, porque a vida é frágil e o tempo que perdemos não voltam jamais”, conclui a cunhada Priscila.

Jarbas nasceu em Canguaretama (RN) e faleceu em Guarulhos (SP), aos 42 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela esposa de Jarbas, Patricia Pereira Ribeiro. Este tributo foi apurado por Malu Marinho, editado por Ana Clara Cavalcante, revisado por Magaly Alves da Silva Martins e moderado por Rayane Urani em 8 de janeiro de 2022.