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Jéssica Silva Couto

1993 - 2021

Conseguia deixar todos os espaços mais bonitos com seus projetos arquitetados na prancheta e no coração.

Esta é uma carta aberta de Andréa para sua irmã caçula:

Nós gostávamos muito de conversar, fazer inúmeras chamadas de vídeo pra falar bobeira; e ríamos mais do que conversávamos, principalmente aos sábados. Gostávamos de tomar açaí juntas, jogar video game — mesmo não sendo mais crianças —, ver filmes e séries!

Tem uma história que a Jéssica gostava de contar pra todo mundo, e nós sempre caíamos na risada lembrando disso. Quando ela tinha uns 5 ou 6 anos, toda noite minha mãe pedia que eu a colocasse pra dormir. Muitas dessas vezes eu tinha que parar de brincar ou de conversar com as minhas amigas pra colocar a caçulinha pra dormir. Eu geralmente ia “brava” fazer essa minha tarefa diária; afinal, era uma legítima adolescente, né? E o que acontecia? Ela não dormia de jeito nenhum! Ela simplesmente levava horas pra dormir! E como ela amava deitar na rede, eu ficava ali uma eternidade balançando ela. E ela contava pra todo mundo que eu balançava bem forte pra ver se ela dormia logo. A gente sempre ria dessa história; porque algumas vezes, claro, essas balançadas de rede viravam brincadeira entre nós duas: era uma aventura!

Jéssica era, e sempre vai ser, a minha alma gêmea, minha confidente, minha maninha! Recém-formada em Arquitetura e Urbanismo, estava cheia de planos, sonhos e projetos. Sentimos muita falta de suas gargalhadas, que ecoavam por onde ela passava. A casa ficou mais vazia e quieta, e a família segue esforçando-se para ressignificar os momentos de encontro. Vai estar sempre presente entre nós o seu amor pelo seu gatinho Sushi, a sua alegria de querer ajudar e estar sempre perto de suas tias e primas.

O Sushi, ela e a Carol (na época sua namorada) acharam numa praça. Ele era minúsculo, devia ter um 1 mês de vida. Elas o alimentaram e ali já sabiam que ele as tinha escolhido. Ela era apaixonada pelo Sushi, eram um grude! Após sua partida, Carol passou a cuidar dele com muito amor, e até já adotou uma irmãzinha, talvez numa tentativa de suprir a falta que a Jéssica faz pra ele. A nova gatinha chama-se Cacau, e com certeza a Jéssica teria amado conhecer.

Arquiteta recém-formada, tinha o escritório em seu apartamento e lá elaborava os projetos. Depois, fazia visitas a clientes e administrava sua página numa rede social de fotos e vídeos: Projetos Couto Arquitetura e Interiores. Ela trabalhava com o que amava, com certeza! Desde criança gostava de desenhar, esse era o seu dom!

Ela sempre gostou de estar junto de mim, de nossos pais e de nossas tias, e se sentisse que a gente estava triste lá vinha ela com suas gargalhadas e seu jeito todo específico de nos colocar pra cima! Fazia tudo e mais um pouco pela mamãe. Quando nossa avó se foi, ela não saiu um segundo do lado da nossa mãe. Até dormiu alguns dias na casa dela, coisa que ela não gostava muito de fazer, dormir fora de sua casa.

Com seu "dedinho" de arquiteta, sempre chegava dando várias dicas disso e daquilo, e minhas tias amavam! Ter conseguido se formar foi um grande sonho realizado. Houve momentos difíceis em relação ao financiamento estudantil, ela quase teve que parar a faculdade; mas no fim deu tudo certo e ela conquistou o tão almejado diploma. Ela também tinha o sonho de ser mãe e de ser tia. Vivia me cobrando um sobrinho e eu farei questão de realizar esse desejo por ela.

Minha irmã tão amada será sempre lembrada como alguém que era só alegria. Sua gargalhada era tão gostosa e verdadeira que contagiava todos ao redor. Jéssica era amiga, era confidente, era parceria, era amor! Não posso deixar de admitir que era uma mocinha muito geniosa também: quando ela queria que uma coisa fosse de um jeito, ela batia o pé até dar certo!

Jéssica era abraço gigantesco, nele cabia tudo! Era a filha mais nova, a “princesinha da mamãe". Tristeza não era muito a onda dela, logo dava um jeito de sacudir a poeira! Minha Maninha, como eu a chamava, era o meu amor, e eu falo isso porque nos entendíamos e conversávamos muitas vezes só com o olhar. Ela era razão, eu emoção. Éramos complemento uma da outra! Tínhamos muitas coisas em comum, amávamos um docinho e os gatos sempre foram a nossa paixão! Ela era minha confidente, minha amiga, hoje é minha maior saudade!

Jéssica nasceu em Fortaleza (CE) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 28 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de Jéssica, Andrea Silva Couto. Este tributo foi apurado por Ana Macarini, editado por Ana Macarini, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 4 de novembro de 2021.