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João Delmar de Oliveira

1962 - 2021

Ele caminhava na areia da praia, de frente para o mar, e mandava vídeos para os filhos "Hoje o dia está lindo!"

Filho Dona Juracy e Seu José, compunha a numerosa família de oito filhos. Desde bem jovem, João Delmar já se mostrava ser aquele que colocava as coisas em ordem, sendo a referência de organização para as quatro irmãs mais novas. Chegou ainda criança a Porto Alegre - capital gaúcha, quando os pais buscavam melhores oportunidades.
Era pura gratidão em relação à educação e apoio que recebera de seus pais, pois tendo sido pai ainda bem jovem, pode morar boa parte da vida, com a esposa e filhos no pátio da família. Sempre falava do querido pai com grande respeito, e admiração, tal como sempre assim agiu com sua querida mãe.

Um homem de grande coração, que se mostrou incansável nos cuidados e zelo junto aos seus quatro filhos: Wagner, Danúbia, Fagner e Lubia, e cinco netos, colocando sempre a família como prioridade, e nunca deixando faltar nada, principalmente sua presença. Com sua amada esposa Marivone - chamada de 'Chica' -, foram companheiros inseparáveis por toda a união, ao longo de quarenta e três anos. Tal como os filhos e netos, ela sempre pôde contar com toda dedicação dele, inclusive em seu tratamento quando se descobriu com câncer.

Depois de uma vida de muito trabalho, quando veio a aposentadoria, conseguiu realizar um grande sonho do casal, que foi a compra de uma casa na praia em Imbé, cidade litorânea do Rio Grande do Sul, lugar que mais frequentou e usufruiu do lazer em seus últimos anos de vida, local em que sua família fez uma bela homenagem póstuma espargindo lá as suas cinzas.

Os netos, vieram a se tornar suas maiores paixões. Pedro, Henrique, Laura, Davi e Luna, foram privilegiados por terem convivido com um avô tão carinhoso e atencioso. Por vezes, deixavam-no enlouquecido com as brincadeiras, mas ele amava, e sempre que possível, os carregava para a casa na praia. O Henrique, filho de Lubia, por ter perdido o pai ainda bem novinho, praticamente foi adotado pelo avô, sendo um companheiro fiel, como conta sua mãe.

Saudável e bastante animado, prezava pelas caminhadas no litoral gaúcho, e muitas das vezes, praticava a atividade física na companhia dos netos. Como era relaxante curtir a brisa, seja ao longo do caminhar, seja ao se acomodar na areia. A filha Lubia, reforça: "Apaixonado pela vida, ele acordava bem cedo e ia para a beira da praia. Eu costumo dizer que ele tinha sede e pressa de viver."

Festeiro, fazia questão de sempre que possível reunir toda a família aos domingos, com churrasco, música, comida boa e cerveja. Organizava tudo e ficava bravo quando demoravam, dizendo: "É almoço, e não janta!" lembra Lubia. Sempre muito brincalhão, gostava de piadas. Quando necessário, sabia ser mais sério; com muita responsabilidade e atitude generosa, gostava de acolher a todos. Jamais cultivou inimizades, e serviu de grande exemplo para os filhos.

Nos almoços e jantares em família, e nas festas caseiras, que eram a especialidade dele junto da também animada esposa, haviam algumas curiosidades que sempre eram motivos de gargalhadas, como conta a filha Lubia: "Ele não deixava os filhos mais velhos Wagner e Danúbia beberem, enquanto deixava à vontade os mais novos, Fagner e eu", e em tom de brincadeira dizia: "Nunca beberam, não vão beber agora" ; e na presença constante de sua mãe, Dona Juracy, a acompanhava no chimarrão, mas tomava somente duas cuias, e dizia que: "Uma só, não é bom, tomo dois pra não sair perneta".

Torcedor fanático do Internacional de Porto Alegre, tinha várias camisas e frequentava o estádio Beira Rio com os filhos, principalmente com o seu xodó Fagner, tendo juntos presenciado inclusive um título memorável que foi o da Taça Libertadores de 2006. Só não gostava muito que caçoassem quando o time não ia bem. Também jogava futebol no time veterano do bairro, sendo um "meio campo baixinho e invocado, e com características de um típico antigo número 8", como explica o filho Wagner.

Em sua vida profissional passou por diversas áreas, incluindo a bancária, mas por um período maior atuou no setor de telefonia e de construção civil. Era um de seus maiores méritos iniciar nas empresas em cargos inferiores, e aos poucos ir ganhando a confiança dos superiores, e sendo sempre promovido. Proativo e com facilidade tanto de aprender, quanto com dom para ensinar e dar conselhos, era comum atingir e permanecer no posto de Supervisor, liderando muito bem suas equipes; além disso, era bastante querido por todos os colegas de trabalho. Ao se aposentar, como não gostava de ficar parado, ainda atuou por um tempo como motorista de aplicativo.

Ninguém melhor do que os filhos, para trazerem recordações e lembranças, ele dizia: "Vocês são irmãos, tu podes ter dez amigos, mas se tu não puderes contar com teu irmão tu tá ralado! Podem discutir, mas não podem guardar mágoas! Família em primeiro lugar!". Isto era o clássico dele, disse a filha Lubia, que ainda conclui: "Me ensinou a encarar e resolver as surpresas da vida. Me formou uma mulher forte!"

A filha Danúbia, recorda: "Ah meu pai, meu guerreiro, você foi forte! Quantas lembranças boas vão ficar aqui no meu coração. Pegava o vidro de perfume e dizia que estava acabando. E claro eu corria e comprava outro. Sempre vaidoso."

Disse o filho Fagner: "Ah, meu pai se eu soubesse que aquele churrasco e aquele jogo seriam os últimos, que aquela praia seria última, segurava tua mão e te agradecia por tudo que sempre fez por mim, estando sempre do meu lado tentando me fazer andar no caminho certo, sempre firme. Hoje entendo que tudo era pra ensinar né, pai. Aprendi a lição, meu pai sempre foi um homem bom."

O filho Wagner, completa: "Sinto falta dos seus gritos enérgicos, dos cafés na garagem, das conversas sinceras ao pé do ouvido. Me transmitia a segurança que eu precisava para fazer o que era preciso! Deixaste um legado enorme na sua passagem por aqui! Descanse em paz meu velho! Aqui de baixo nós vamos seguir lutando, como o senhor nos ensinou e sempre fez! TE AMAMOS PARA TODO O SEMPRE!!!"

João nasceu em Santa Rosa (RS) e faleceu em Porto Alegre (RS), aos 58 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de João, Lubia Oliveira. Este tributo foi apurado por Peter de Souza, editado por Peter de Souza, revisado por Ana Macarini e moderado por Ana Macarini em 4 de dezembro de 2021.