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João Pereira da Silva

1942 - 2020

Onde ele estivesse, não havia tristeza. Com 79 anos, dava saltos mortais na piscina e irradiava alto astral.

Forte, cheio de vitalidade. Sentia-se jovem de corpo e de espírito, dono de uma risada contagiante. Seu apelido: Beleléu. Alegrava até nos velórios, contando boas histórias noite adentro. Mas, quando se foi, houve um suspirar de tristeza entre os habitantes de São João da Baliza ao passar do cortejo pelas ruas principais.

Embora natural de São Domingos, no Maranhão, nos anos 60 foi um dos fundadores de Carrasco Bonito, no estado do Tocantins. Desbravador, na década de 70 foi com alguns familiares para o povoado que atualmente é a cidade de São João da Baliza, em Roraima, onde se tornou o primeiro prefeito, começando uma trajetória política.

Ali fincou raízes, atuou sete anos como administrador, sete meses como prefeito nomeado pelo governador, 12 anos como vereador e mais oito anos como vice-prefeito. Um bom político: “Nunca desviou nada, nunca fez nada errado, nunca houve um processo contra ele”, afirma Sebastião, um dos filhos.

Trabalhou um tempo também como funcionário federal na função de motorista, embora muitos tivessem medo quando Beleléu pegava a direção do carro: tinha fama de ser um pouco barbeiro, por incrível que pareça.

Era o atual secretário da Agricultura do município. Sua ligação com a terra ia além das questões administrativas. Tinha uma chácara onde plantava feijão, milho, melancia, vários legumes e ervas, para consumo próprio e para doar aos amigos. Assim, generoso, punha seu carro também à disposição de quem precisasse. Ver a casa cheia era uma grande alegria. Sempre disposto a ser útil e ajudar ao próximo. E, quando as coisas iam bem, usava a expressão “Isso é bom demais”.

Todo dia às 5h da manhã, tomava seu chimarrão. Jogar baralho com os amigos, nem se fala... adorava. Entre seus parceiros estava o Seu Borba, grande amigo que também morreu da Covid. Junto com Juca, Moacir e Luís formavam o grupo de idosos com a sigla DIVA – Departamento Individual da Vida Alheia. Pura diversão. Entre os prazeres, os pratos preferidos: baião de dois com peixe frito e buchada de carneiro.

Estava casado com Raimunda Pereira da Silva havia mais de 50 anos, e tiveram sete filhos: Francisco de Assis, Rosilda, Rosenilde, Sebastião, Roseilda, Márcio e Milason. Uma árvore que já se ramificou em 16 netos e três bisnetos.

Um pouco antes de morrer fez um pedido à filha Milde, que estava ao seu lado: que os filhos permaneçam cada vez mais unidos. Seguindo seus passos na política e na ética, o filho Sebastião pretende realizar um outro desejo do pai, abraçando a candidatura de vice-prefeito. “Ele foi minha inspiração, meu esteio. Correto, amigo, parceiro. Quero continuar esse legado dele.”

João nasceu em São Domingos (MA) e faleceu em São João da Baliza (RR), aos 78 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo filho de João, Sebastião Pereira da Silva. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Bettina Turner, revisado por Otacílio Nunes e moderado por Rayane Urani em 16 de novembro de 2020.