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Jorge Roberto Barbosa dos Santos

1962 - 2020

Na curva da vida, uma fulgurante paixão que renovou a existência.

Valdirene escreveu a seguinte homenagem ao marido:

"Foi um grande executivo de empresas famosas. Por isso, viajou o mundo todo. Em 2014 veio a Porto Alegre a trabalho pela segunda vez e resolveu relaxar numa casa de shows. Foi onde nossos olhares se cruzaram e a mais linda história de amor nasceu. Desde aquela noite ele nunca mais saiu do meu lado. Ele se casou comigo e apoiou minha vida artística, mesmo com muito ciúme dos palcos.

Era um homem que resolvia qualquer problema à distância ou ao vivo, entendia de muitas coisas e tinha uma vasta cultura. Venceu inúmeras dificuldades na vida. Tinha um cuidado muito especial comigo e com meus quatro filhos. Criou dois deles, ensinou-lhes inglês, a consertar coisas e que se deve cuidar das pessoas. Ligava todos os dias para sua mãe, dona Ítala, uma senhora octogenária que vive no interior fluminense. Tinha uma grande preocupação com ela, quanto ao coronavírus.

Jorge estava prestando serviços para a Rede Globo, no Maracanã, e ajudou a implantar os hospitais de campanha do Rio de Janeiro. Era niteroiense, mas vivia em Porto Alegre desde 2012 porque dizia que a família dele estava aqui.

Foi tudo tão rápido. Morávamos ao lado do Hospital Nossa Senhora da Conceição e ali foi construído o centro da Covid-19. Foi ali que buscou ajuda ao surgirem os primeiros sintomas. Por dez dias ficou sem diagnóstico e sem medicação. Até que não suportou mais. Lembro-me que era sexta-feira, 3 de julho. Cheguei em casa e ele me disse: 'Preciso ir pro hospital'. Tinha muita febre e já respirava com dificuldade. Lembro dele abrindo a porta... Estava muito frio. Vestia um casaco preto Giorgio Armani. Gostava de se vestir bem.

Jorge estava contaminado pelo coronavírus e por uma bactéria hospitalar. Quando negativou o coronavírus, trocaram-no de UTI. Então me chamaram, pois havia piorado. Eu fui e fiz o que fazia todos os dias: deitei-me em seu ombro, encostei meu rosto junto ao dele e fiquei falando com ele por algumas horas. Ele queimava de febre. A pressão arterial estava muito baixa. Eu sabia que iria perdê-lo em breve. Olhei pro médico – eu e ele com lágrimas nos olhos – e perguntei: 'Qual a chance, doutor?'. O médico: 'Muito pouquinha'.

O amor da minha vida, o homem que me honrou e cuidou de mim e da minha família estava indo embora. Cheguei em casa, após caminhar sem rumo perto do hospital e fui chamada de volta. Ele havia falecido. Acredito que suportou tudo o tempo todo até eu chegar, e depois se foi. Levou um pedaço de mim. Dia 4 de agosto de 2020, o dia mais triste da minha vida!

Na noite em que foi intubado, falei com ele por telefone algumas horas antes pela última vez. Com pouco fôlego e muito cansado, disse-me: “Eu te amo muito!”. Foi a última frase que eu ouvi desse grande homem que, após tanto sofrimento, está ao lado de Jesus. Queria tanto que tivesse uma segunda chance e trazê-lo de volta! Mas me resta a saudade e as lembranças que nos deixou. 'Guerreiro', como todos o intitulavam. Tive a honra de ser sua esposa.

Obrigada! Só tenho que te agradecer, Jorge. Esperei ansiosamente tu voltares, assim como esperava a ligação dos médicos uma vez ao dia para saber de ti. Eu escrevia detalhadamente cada informação recebida. E isso será um capítulo do livro de nossa história. A minha dança, a minha expressão corporal e as minhas falas terão muito mais sentido quando eu interpretar o amor que tu me fizeste conhecer. Eu e minha família te amamos verdadeiramente."

Jorge nasceu em Niterói (RJ) e faleceu em Porto Alegre (RS), aos 58 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela esposa de Jorge, Valdirene da Rocha Boeira. Este tributo foi apurado por Lígia Franzin, editado por Joaci Pereira Furtado, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 1 de janeiro de 2021.