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José Milton Lima Lordelo

1944 - 2020

A retidão o seguiu por toda a vida, um servidor público que honrou sua missão de trabalhar com e pelo povo.

José Milton repetiu o caminho de muitos migrantes brasileiros, quando saiu da fazenda onde foi criado no interior baiano de Sapeaçu para, ainda jovem, tentar a vida na capital paulista. Ali fez matrimônio e teve sete filhos. “Profissionalizou-se metalúrgico, mas foi como servidor público que exerceu o seu talento nato”, conta a filha Elisângela.

Apesar de ter transitado por todas as classes sociais, sua retidão moral falou mais alto. O exemplo do caráter íntegro marcou a infância da filha. A fala dele, descrevendo o fato para uma menina de 10 ou 11 anos, permeou a vida de Elisângela e guiou a moça durante sua carreira profissional, lembra ela com nitidez: “Filha, hoje eu tive a possibilidade de ficar rico, era muito dinheiro, muito dinheiro mesmo. Mas eu fiz o que era certo. Chamei os superiores e... continuaremos pobres. Mas a vida é assim, a gente fica com o que é nosso, ainda mais quando se trata de dinheiro popular, pois quem fica sem é o povo”. José Milton foi desse jeito. Não se corrompia por nada. Para ele qualquer vantagem indevida no serviço público era inaceitável. Era um homem controverso, mas convicto de que o povo não podia perder: na alimentação, na educação, na saúde, no bem-estar, uma vez que atuou por muito tempo na área esportiva.

Casou-se uma segunda vez e aumentou a prole com outros três filhos, com quem Elisângela não conviveu. Já os tios – Conceição, Zete, Gracinha e Mundinho – ficaram bem vivos na memória da moça. Os íntimos o chamavam de Pintinho e Alemão.

“Ele sofria do mal do século – o alcoolismo – e curou-se apenas pela vontade de viver que nutria”, reforça Elisângela. O médico havia alertado de que o funcionamento do fígado poderia falhar. Mas certamente a Covid-19 foi a pedra no meio do caminho de José Milton. Quando o pai se foi, Elisângela ficou sem palavras: “Os sentimentos se misturam e se confundem. Nessa hora, nada importa, falta chão. ‘Pai, onde quer que o senhor esteja agora, quero que o senhor siga o caminho de luz. Encontre os seus que já partiram e encontre o caminho de Deus’”. Em oração, pediu apenas conforto e o fim da pandemia. E agradece.

José nasceu em Conceição do Almeida (BA) e faleceu em Guarulhos (SP), aos 76 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de José, Elisângela Azevedo Lordelo. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 3 de julho de 2023.