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José Nunes Fernandes

1935 - 2020

Ele contemplava a beleza da vida e desafiava a máxima do "dar sem ter".

José Nunes Fernandes, ou simplesmente Sr. Dedim, era muito ligado à natureza. Vaqueiro, lidava com a terra e amava o sertão, mas a seca o obrigou a se mudar para a capital cearense. Levou em sua mala o amor pelos bichos e a sabedoria da terra.

Protegia os passarinhos do estilingue das crianças e defendia a chuva, quando umas das filhas achava de reclamar, pois Sr. Dedim contemplava a beleza da vida.

Ainda que tivesse pouca escolaridade, dava não só aulas de História do Brasil e de Geografia, mas também aulas diárias de humildade e de solidariedade com o próximo. Ainda que tivesse tão pouco, ninguém saía de perto dele sem o que havia ido buscar. Ajudar sem ter é um desafio, mas ele conseguia. Ele ensinava a valorizar o prato de comida, a doar sem olhar a quem e sem esperar nada em troca. Ele agia assim.

Visitava uma parte dos seus 17 irmãos semanalmente. Como fazia isso, não se sabe. Era importante para ele.

Trabalhava de sol a sol. De dia, vendendo utensílios nas portas das casas ─ o que no Ceará se chama "galego" ─ ou vendendo carnes em cima de um cavalo; à noite, como vigilante numa fábrica de tecidos. Assim criou oito filhos e muitos de seus netos, e não negava nada a ninguém.

A hora da vaidade era só para tirar fotos, quando esticava o pescoço para ficar mais bonito.

Luiz Gonzaga e Nelson Gonçalves eram seus maiores ídolos, e suas músicas fazem parte da história de vida da família.

Em seus últimos anos, passou a gostar de bolos e sorvetes, coisa que antes não escolhia comer. O difícil depois era controlar, para que ele comesse só um pouco.

Já com Alzheimer e início de Parkinson, o médico pediu para que ele escrevesse uma frase, a última que conseguiu, e fez a seguinte declaração de amor: "Minha véa, eu te amo".

Ele venceu todas as batalhas da vida.

Por tudo isso, os oito filhos de José fizeram questão de homenagear o pai e de afirmarem em uma só voz:

"Hoje sentimos saudades de quem nos fez sorrir até o final da vida, porque tudo dele era alegria!

Hoje acordamos com o canto do bem-te-vi, mas seu parceiro das manhãs canta junto de Deus... e o coro continua...

Uma parte imensurável de nós foi abalada com sua partida, mas seu sorriso, sua força de viver, seu humor, seu exemplo, seus ensinamentos, as músicas que nos apresentou, suas histórias e sua trajetória de vida ficaram marcadas em nós!

O grande homem, bondoso e humilde de coração está e estará presente em cada passo dado pelos que o amam, através da lembrança e do infinito amor que sempre sentiremos.

Ele foi e é um grande homem. O exército de Deus precisou dele, pois é tão manso, tão humilde, tão simples...

Vai em paz, nosso gigante, seguiremos agradecendo a Deus pelo tempo que Ele nos proporcionou ao seu lado!"

José nasceu em Aracati (CE) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 85 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelos filhos de José, Ozilene, Alzir, Regina, Aliana, Arlinete, Alvaniza, Antônio Neto e Aldemeire. Este texto foi apurado e escrito por Lígia Franzin, revisado por Gabriela Carneiro e moderado por Rayane Urani em 14 de dezembro de 2020.