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José Vicente de Oliveira Velo

1933 - 2021

Um dentista apaixonado pela profissão. Se sumia por um minuto do consultório, já sabiam onde o encontrar: na cafeteria.

José Vicente foi um homem que viveu colocando amor em todos os pontos que teceram a rede de sua vida: em casa com sua família, no trabalho, ou na rua, onde gostava muito de estar. Nascido em Uruguaiana, RS, adorava dizer que era descendente de espanhol, apesar de não conhecer tão bem a história de sua família. Foi justamente por isso que, depois de muitos anos, seu neto João Pedro deu-lhe um presente muito especial que foi a certidão de nascimento de seu pai e de seus avós e assim, José pôde fortalecer suas raízes.

Ao lado de sua esposa, criou três filhos, dos quais era fonte de inspiração e de energia, e mais tarde, três netos, que fizeram florescer em José Vicente uma faceta que viria a ser um de seus pontos fortes. Ele foi daqueles avôs que aquece o coração e que dá às crianças uma infância de encanto e fantasia. João Pedro, seu neto, lembra com afeto dos momentos em que era bem pequenino, e José dava seu banho na banheira brincando; lia para ele antes de dormir; brincava de pique-esconde; o acompanhava em matinês de carnaval e deixava seus netos experimentarem a vida com alegria.

Outro traço da vida de José também foi pincelado com a sua dedicação: seu trabalho. Foi sendo dentista que se encontrou enquanto profissional e que pôde cuidar de tantas pessoas. Tinha orgulho em dizer que se formou na primeira turma de odontologia da PUCRS, onde há inclusive uma placa em homenagem a esses estudantes. Trabalhou na prefeitura de sua cidade e em consultório e “era uma pessoa tão boa, que às vezes a pessoa não tinha dinheiro pra pagar a consulta e ele aceitava uma galinha, um peixe, qualquer coisa assim como pagamento, mas ele não deixava de atender a pessoa”, conta João Pedro, com orgulho do avô. Dr. Velo, como era chamado, trabalhou até seus 80 anos e sempre se mostrou disponível quando precisavam dele.

E esse amor e entrega não ficavam só dentro de casa ou do consultório, porque na rua seu carisma também o acompanhava. Ali, parecia que todo mundo o conhecia; perguntavam dele e o paravam para conversar. E ele, sempre bem-humorado, ficava horas e horas de papo. Adorava passear, encontrar seus amigos e claro, ir à cafeteria tomar seu cafezinho de todo dia. “Ele tinha essa rotina assim, ia à padaria, buscava um pãozinho, aí dava vontade, ele saía de novo”, conta João Pedro.

Sua família teve uma cafeteria por muito tempo, e foi aí que descobriu sua paixão por essa bebida. Sempre tomava uma xícara depois do almoço e às vezes "fugia" de sua esposa para ir tomar café. A preocupação não durava muito tempo, porque todo mundo já sabia onde ele iria estar. João Pedro, seu neto, lembra que “ele brincava que já tinha idade para mandar na vida dele” e por isso saía bem tranquilo.

José Vicente tinha uma característica única que era seu gosto por cebola crua em qualquer refeição que fosse, e também adorava guardar guloseimas perto da cama, para que pudesse comer durante a madrugada. A família toda já sabia que não era bom mexer ali. Se bem que era praticamente impossível deixar José irritado. Seu bom humor o fazia viver a vida com uma alegria e leveza que eram admiráveis.

No trabalho era onde mais se encontrava, mas quando não estava atendendo, gostava de acompanhar os jogos do Internacional, ver filmes, ler jornais e estava sempre ouvindo a programação completa da rádio. E não se pode falar de José Vicente sem se lembrar de sua fé. Foi um homem muito católico e rezava todo fim de tarde junto à sua esposa; era um momento sagrado dos dois.

José foi uma pessoa muito especial, simples, alegre, querida e de bom coração. Foi pai e avô muito presente, e um profissional exemplar e cuidadoso. Nas palavras de seu neto João Pedro, “foi muito emocionante ter conhecido ele, ter convivido com ele. É bom estar perto de uma pessoa que está sempre alegre”. O amor de José ficará sempre marcado em suas coleções, em sua família e em todas as pessoas que tiveram a honra de receber os seus cuidados.

José nasceu em Uruguaiana (RS) e faleceu em Uruguaiana (RS), aos 87 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo neto de José, João Pedro Velo Villela. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Gabriela Pacheco Lemos dos Santos, revisado por Francyne Nunes e moderado por Rayane Urani em 8 de junho de 2021.