1966 - 2021
A bordo do navio comandado pelo marido, imaginava fadinhas coloridas no horizonte, com os filhos, a cada pôr de sol.
Essa é uma homenagem da filha, Sáfia, à sua amada "mommy":
Lana Uany.
Um nome tão peculiar, digno de uma pessoa única.
Lana, minha mommy.
Esposa do meu papai há trinta e dois anos, e minha mommy e do meu irmão. Baixinha, do cabelo preto, preto. Seus olhos mais pretos ainda por debaixo dos seus óculos... sem eles, ela não enxergava. Seu cabelo era seu ‘carma’. Vivia dizendo que não gostava, pois ele não era nem liso e nem ondulado. Mas era cheio de brilho. Como suas roupas.
Ela amava se arrumar. Se fosse na padaria, ela botava um batom e nunca uma blusa desarrumada. Ela mesmo dizia que era um "pouco perua". Mas como era cheirosa! Assim que saía do banho, passava colônia. Tinha uma coleção de perfumes e sempre estocava no armário.
A vida dela foi cuidar da gente. Não gosto de dizer que ela não trabalhou. Ela trabalhou e muito. Meu pai é da marinha mercante então ela criou a gente sozinha, praticamente. Ela sempre colocava meu pai lá em cima e dizia que ele fazia tudo pela gente. E fazia mesmo – quero dizer, faz. Mas era ela quem sempre esteve ali.
A paraense Lana Uany foi a primeira filha do casal Agelice e Ruy. Depois dela, vieram os irmãos Ádrea, Valéria e Marcelo. Os pais a chamavam de Lanoca. Criança, adolescente e mulher doce, também tinha uma característica: virava uma “arara”, como ela mesma dizia, caso qualquer pessoa mexesse com alguém próximo a ela.
Foi na cidade onde morava, Porto Trombetas, no Pará, que Lana Uany conheceu o amor da sua vida, Carlos Maia. O navio em que Carlos trabalhava foi pegar bauxita na cidade. O futuro cunhado, que se casaria com Ádrea, conhecia o comandante do navio. E nesta passagem do navio pela cidade nasceria o embrião de uma relação duradoura, de cumplicidade, harmonia e convívio em terra e água. Foi num churrasco, promovido pelo comandante, que Lana e Carlos se conheceram.
A relação dos dois crescia, e a família também. Primeiro veio Sáfia, a primogênita; depois, o caçula Samir, que veio ao mundo quando a gestação da mãe completou seis meses. Samir foi o xodó da família, toda a vida da mamãe depois do nascimento foi cuidar dele. Hoje é um homem lindo e saudável.
Antes do nascimento das crianças, Lana acompanhava Carlos em viagens. A carreira do marido também se desenvolvia. Esse navio se tornou a nossa vida... Mommy viajou muito com o pai antes de nós nascermos. Depois, a família toda embarcava, e passávamos férias escolares a bordo. Quando ficamos mais velhos, meu pai tornou-se comandante e ela passou a embarcar mais com ele. Ela amava estar ao lado dele. O amor deles é lindo demais.
Na vida a dois, sempre com muita cumplicidade, as viagens eram frequentes. Quando namoraram, os primeiros registros – Lana amava fotografia – foram do passeio à Argentina. Depois, praticamente todo o Brasil. Lana Uany deixou fotos de tudo. E o gosto pelos passeios, viagens e pela família, foi sendo estimulado pela mãe aos filhos.
Quando éramos mais novos, íamos de ônibus até onde o navio estava para conseguir embarcar e assim ficarmos todos juntos. E eu me lembro com um sorriso que minha mãe amava ficar no navio porque não tinha que cozinhar — tarefa que ela não gostava nem um pouquinho. A melhor parte dos dias durante a viagem era subir no passadiço e ver o pôr do sol. Olhávamos para o céu e imaginávamos que as cores que se formavam eram as fadas. Se o céu estava muito rosa, dizíamos que estava cheio de fadinhas cor-de-rosa; se estivesse amarelo, eram as fadinhas amarelas.
Alegre, apaixonada pelos seus e com uma super autoestima, estava sempre em alto-astral. Para lembrar das pequenas e grandes emoções vividas, Lana Uany acumulava objetos. Os umbigos dos filhos, as cartinhas que escrevia a Carlos, até os lenços que estavam expostos na mesa do casamento da filha. Além do convívio com a família — em terra ou no mar ou na água doce, embarcada, amava passear pelo shopping ou à beira-mar, de carro. Referência entre os seus, Lanoca era a "cola" que grudava cada pessoa da família. Ela não admitia tristeza e só perdia a linha se alguém mexesse com qualquer familiar.
Lana Uany, a filha, irmã, cunhada, tia, esposa, amiga e mãe de nome tão peculiar, foi uma pessoa extraordinária. Uma pessoa única, que encheu de alegria e de amor um núcleo familiar, que sempre que relembra a sua história e a celebra, repete a sua frase preferida: “Não quero ninguém xôxo”!
Lana nasceu em Macapá (AP) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 54 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela filha de Lana, Sáfia Figueiredo Silva Maia. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Patrícia Coelho, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Rayane Urani em 6 de março de 2022.