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Marfisa Marques Melo

1985 - 2021

Amante da gastronomia, entre bolos e salgados, conquistou seu posto de cozinheira em um bar de Fortaleza.

Marfisa viveu seus 35 anos intensamente. Muito engraçada, tinha como marca principal a autoestima e o temperamento forte. A verdade é que foi uma explosão de alegria.

Feminista, não tinha papas na língua e não gostava que ninguém lhe mandasse. Sabia se defender e também defendia quem quer que precisasse. Metia mesmo a colher nas brigas de marido e mulher.

Ai de quem se engraçasse com ela! Marfisa não levava desaforo para casa. Era respondona, um pouco dramática e ciumenta, mas não tinha como brigar com ela, pois sempre conseguia envolver todos com seu jeito divertido.

Gostava de paquerar, tinha predileção por homens negros e não escondia isso de ninguém. Certa vez em uma corrida por aplicativo, flertou com o motorista. Ela era assim, livre e independente, tal como a gatinha que cuidava, Marfisa dizia brincando "Eu não a adotei, ao contrário, a gata é que me adotou".

Vivia e valorizava sua ancestralidade negra e indígena. Era filha de Oxossi, Nanã e Ogum e também amiga do Seu Zé e Nega Ana.

Com relação ao trabalho, correu atrás de seu sonho de ser cozinheira. Fez até treinamento em um famoso restaurante da capital cearense. Tanto fazia se a receita fosse de sal ou açúcar, tudo que Marfisa se propunha a cozinhar ficava uma delícia. Tanto se esforçou que também conseguiu trabalho na prefeitura da cidade, na Secretaria de Direitos Humanos onde atuou na defesa das causas LGBTQIA+, conheceu muita gente e tornou-se muito querida.

Já em casa, sua prioridade era a família. Ajudava pai, mãe e irmãos pois a vida não era fácil para nenhum deles. Quando os familiares contraíram o coronavírus, foi Marfisa quem cuidou de todos.

Ela e o pai eram muito devotos a São Jorge, não por acaso, Marfisa partiu no dia dele. Dizia que quando desencarnasse não queria tristeza, nesse dia então, todos os terreiros estavam em festa. Ao som de "Ogum" de Zeca Pagodinho, o carro fúnebre passou em frente à casa dela, enfeitada com três estrelas na fachada.

Marfisa encantou-se, sua alegria continua aqui.

Marfisa nasceu em Fortaleza (CE) e faleceu em Fortaleza (CE), aos 35 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela irmã de santo de Marfisa, Ihvna Saboya Chacon. Este tributo foi apurado por Lilian de Lima Matias, editado por Lilian de Lima Matias, revisado por Ana Helena Alves Franco e moderado por Rayane Urani em 24 de junho de 2021.