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Maria Abigail Marques de Magalhães Maurício

1935 - 2020

Professora de português, que recusava calculadora, Abigail fazia contas à mão.

Foi independente em suas oito décadas de vida: fazia hidroginástica, pegava ônibus e adorava ir sozinha ao comércio de Maceió.

Às 5h30, fazia caminhada pelas redondezas do Pinheiro — bairro em que morou por 49 anos e o viu fissurar. Dedicou os últimos 20 anos ao esposo Valdir, parceiro de vida, pelo qual nunca perdeu o amor, o cuidado e o afeto genuíno.

Mulher de poucas palavras e católica fervorosa, emanava amor em gestos e oração. Fazia brigadeiro, com pontos diferentes, todos enroladinhos no açúcar, para agradar os netos. Seu maior desejo era vê-los bem-encaminhados nos estudos.

Apesar dos belos olhos claros, Biga não gostava de aparecer e evitava foto. Em família, ela cedia à timidez. Mantinha curto o cabelo liso, que conservava a cor pretinha, sem necessidade de tintura. Sua única vaidade era pintar as unhas.

Bobó de camarão, falas altas e os netos a aperreando — assim eram as reuniões de domingo em sua casa. Não gostava de festas, mas seu aniversário era sempre compartilhado com sua neta Leka. Com bolo personalizado avó-neta, o mês de junho era todo delas!

No final de sua trajetória, amou o neto Pietro e seus 47 cromossomos (criança com síndrome de down). Ele não entendia a necessidade de pedir a bênção, queria brincar de fazer cócegas e ouvir as musiquinhas antigas da vovó. Assim, o caçulinha resgatou seu lado carinhoso e amoleceu sua rigidez.

Maria nasceu em União dos Palmares (AL) e faleceu em Maceió (AL), aos 84 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela neta de Maria, Letícia Barbosa. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Kamilla Abely, revisado por Lígia Franzin e moderado por Rayane Urani em 4 de julho de 2020.