1953 - 2021
De sorriso aberto e riso frouxo, contagiava quem estivesse por perto com brincadeiras e piadas.
Lurdinha era daquelas pessoas que não se poupavam quando precisavam ajudar alguém. As durezas da vida a ensinaram a ser assim. Ainda criança, perdeu a mãe durante o parto do irmão mais novo. A situação trágica colocou cada filho num canto. Com um pai já ausente, os dez filhos de dona Oscarina separaram-se por completo. “Foram criados por tios e outros parentes mais distantes e viveram com dificuldades e pouca estrutura”, conta a sobrinha Samya. Quis a sorte que a pequena Maria de Lourdes, no entanto, fosse adotada por uma família abastada e crescesse em melhores condições. Saiu da sua Quatipuru, no interior do Pará, e foi para um novo lar. Se educou em boas escolas da capital paraense, inclusive para concluir o curso de magistério.
Plantando sementes do saber, dedicou-se à profissão de professora do ensino fundamental até se aposentar, a ponto de inspirar Samya a seguir a mesma carreira. Já adulta, o desejo de ir ao encontro de suas origens veio à tona. Buscou cada irmão pelos interiores do Pará até que pudessem se reunir novamente. Deu a ajuda que cada um necessitava, como pôde. Acolheu sobrinhos e fez da sua casa o porto seguro da gente, até então desamparada. Mesmo longe se fazia presente. Era ativa, independente, resoluta. Mais do que apoio emocional e financeiro, em sua figura fazia bater “o coração da família”!
Com os filhos Renata e Marcelo e os cinco netos não foi diferente. O apego vinha do ventre e só aumentava com os cuidados contínuos do dia a dia. Os convites para se juntar aos seus em almoços de fim de semana também eram frequentes, regados à culinária saborosa dos pratos típicos, à base de caranguejo, camarão, açaí... todos preparados por ela. Gostava das reuniões, de música e alegria. Nessas ocasiões, derramava-se em festa nos passos da dança regional. Xote e forró eram seus ritmos favoritos. “Chegava brincando e contando piadas, tinha uma gargalhada inconfundível”, relembra Samya. “Até hoje eu revejo os vídeos dela compartilhados pelo celular para ouvir sua risada”, declara carinhosamente.
Esperava ansiosa pela vacina contra a Covid-19. Porém, seu tempo não foi o mesmo do destino. Sem Maria de Lourdes o encontro se esvaziou, perdeu o encanto. Mas seu entusiasmo contagiante continua a atravessar a história e deixar marcas até onde a memória alcança.
Maria nasceu em Quatipuru (PA) e faleceu em Abaetetuba (PA), aos 68 anos, vítima do novo coronavírus.
Tributo escrito a partir de testemunho concedido pela sobrinha de Maria, Samya Mercês Morais Rezende. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Fabiana Colturato Aidar, revisado por Bettina Florenzano e moderado por Rayane Urani em 1 de dezembro de 2022.