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Maria José da Silva Santos

1976 - 2020

Sua festa do casamento aconteceu uma quinzena antes da chegada do juiz; é que era amor demais para esperar.

Mais conhecida como Ni, ainda moça chegou a morar em São Paulo, mas não se acostumou com a cidade de concreto e aço e decidiu voltar para o Nordeste e se fixar com a família em Coruripe, na Colônia de Pindorama, no estado de Alagoas - local bem mais parecido com a sua Lagoa dos Gatos, no estado de Pernambuco.

Lá sim estava em casa, com seus pais e os sete irmãos: Zefinha, Terezinha, Laurienne, Zé Nô, Neide, Quitéria Maria, Rozilda. E foi em Coruripe que conheceu Joelson Irineu dos Santos, caminhoneiro, com quem se casou e viveu até seus últimos dias.

Conta-se na família que, no dia do casamento civil, o juiz de paz simplesmente não apareceu. Mas o amor e a felicidade eram grandes demais para esperar e como a festança já estava preparada, decidiram comemorar muito, ali naquela hora mesmo, sem ter amanhã. Assinaram os papéis somente quinze dias depois.

A animação era uma tônica da família. Os almoços de domingo com sua mãe, Maria Auta, eram um fuzuê, pura alegria, misturada em meio aos filhos, irmão, irmãs e sobrinhos. Com eles se distraía da rotina semanal muitas vezes estressante; riam a tarde inteira.

A relação entre Ni, as irmãs e o irmão era de muita confiança e partilha. Toda sexta-feira ela ia na casa da Zefinha, uma das irmãs, depois do expediente; gostava de chamá-la para irem juntas à feira, comprar frutas e legumes.

Do relacionamento com Joelson, que durou toda a vida, nasceram João Antônio e Jardel Antônio. Quando Jardel tinha um ano, foi acometido por uma grave meningite e a doença deixou sequelas importantes e até hoje ele precisa ser alimentado por via de uma sonda.

Ni nunca deixou um minuto sequer de dar atenção às necessidades de seu amado filho Jardel. No período em que a mãe ficava fora de casa, o garoto era mantido sob a responsabilidade de sua fiel cuidadora Elisângela. E quando Ni chegava do trabalho, se voltava para ele, em cuidados também compartilhados com marido e com filho mais velho, João, sempre amoroso com o irmão.

Trabalhava como Auxiliar de Analista na Cooperativa Pindorama, empresa produtora de cana e outros produtos agrícolas, com várias unidades na região. Gostava muito do que fazia. Sempre buscou fazer seu trabalho com presteza e perfeição, durante seus quase vinte anos de carreira.

Dentro dos mistérios que tecem a trama da vida, Ni partiu no dia de seu aniversário, quando completaria 44 anos; quem sabe, para um recomeço.

Maria nasceu em Lagoa dos Gatos (PE) e faleceu em Maceió (AL), aos 44 anos, vítima do novo coronavírus.

Tributo escrito a partir de testemunho concedido pelo sobrinho de Maria, José Rodolfo Pereira da Silva. Este texto foi apurado e escrito por jornalista Luciano L Carvalho e Bettina Turner, revisado por Ana Macarini e moderado por Rayane Urani em 11 de junho de 2021.