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Nadir Gonçalves Manequinha

1955 - 2020

Uma cozinheira habilidosa que, enquanto preparava quitandas mineiras, assoviava e cantava sucessos sertanejos.

Ela fazia parte de uma família imensa, tanto em número quanto em afeto. Era uma das mais velhas entre os seus 25 irmãos, todos trabalhadores, animados e amorosos. Plínio, seu pai, foi açougueiro e à medida que seus filhos iam crescendo ele contava com a ajuda deles em seu estabelecimento. Cecília, sua mãe, foi uma mulher que cuidou do lar, e de todos os filhos com muita dedicação; até sua velhice conservou o gosto por cozinhar em seu fogão à lenha.

Nadir gostava muito de ajudar o pai no açougue e nele trabalhou até seu primeiro casamento. Como o seu trabalho era limpar o bucho das vacas para vender, a família de seu primeiro esposo, Osvaldo, deu-lhe o apelido de Bucho ou Buchinho.

Nadir e Osvaldo se complementavam nas diferenças: ela muito faladeira e ele muito quieto. Tiveram um casal de filhos, a Maria Isabel ou Bell, conforme era chamada, e Osvaldinho, que recebeu o mesmo nome do pai.

Para a família, Nadir sempre foi uma pessoa muito carinhosa, amável e participativa. Bell conta que a mãe acordava cedo para levar o café do filho no seu trabalho. Uma mãe, vovó, esposa, irmã e amiga que cuidou das netas Maria Fernanda e Mariá, e que fazia de tudo para que os familiares estivessem felizes ao seu redor.

Sua principal característica era seu jeito de falar, num tom de voz alto. Intensa, era sorriso e alegria por onde passava. Espalhava amor pelos olhos e conseguia ajudar a todos que podia alcançar com sua energia e bondade, e era tão prestativa que, às vezes, até se excedia nos cuidados com os que amava.

Agitada, barulhenta, animada, trabalhadeira, vivia assoviando desde que o sol aparecia — uma mulher de presença, presente, e que transbordava afeto. Sua energia e alto-astral duravam o dia todo, até o momento de se deitar para dormir.

Nadir conheceu Vicente em um baile da terceira idade, ela com 55 e ele com 60 anos, ambos viúvos. Namoraram por algum tempo, cada um em sua casa, até que resolveram morar juntos. Casaram-se na igreja, com direito a vestido de noiva e tudo! Foi um momento muito feliz para todos da família. Bell costuma dizer que eram irmãos de fé, de tão semelhantes.

Ela adotou toda a família do novo companheiro como se fosse sua. A família aumentou e os almoços eram animados, engraçados e com tanta gritaria que os vizinhos não aguentavam a barulheira e decidiam participar, com muitas gargalhadas.

Foi uma mulher de fé, que falava muito sobre Deus. Dizia que tudo acontecia conforme Ele planejava e previa, e que tudo ocorre no tempo d’Ele. Foi resiliente em todos os momentos desafiadores de sua vida e só via o lado positivo das situações. Gostava de fazer orações, sempre fortalecendo sua fé e gratidão.

Ela e Vicente rezavam e faziam orações juntos, ajoelhados, unidos pela fé imbatível. Ele, Ministro da Eucaristia, e ela preparando-se para isso. Porém, a pandemia interrompeu seus projetos e ambos faleceram num espaço de sete dias.

Fizeram parte e coordenaram a Comunidade de São Cristóvão. Faziam reuniões, ajudavam as pessoas necessitadas e organizavam terços, entre outros trabalhos. Também faziam visitas nas casas para levar oração e escuta aos que precisavam de apoio. Em suas lidas religiosas, o casal chegou a participar das ações do Santuário de Nossa Senhora Aparecida nas festas de 12 de outubro.

Profissionalmente, era uma comerciante nata, batalhadora, nada preconceituosa, acolhedora e visionária. Abraçou a responsabilidade de cuidar da casa, dos dois filhos e da neta desde que o primeiro marido se foi muito cedo, vitimado por um câncer. Ela trabalhou até se aposentar em seu próprio comércio — uma mercearia que vendia de tudo! Ali foi o local de trabalho de toda a família durante muito tempo e Bell nem se recorda de quantos anos exatamente esteve na lida por lá. Depois que se aposentou, dedicou-se a trabalhos voluntários para a Igreja Católica.

Nadir era uma mulher de muito fazer. Costurava, fazia crochês, tricôs e comidas gostosas. Na época do início da pandemia, começou a produzir máscaras, tanto para doar quanto para vender. A neta, Maria Fernanda, ajudava cortando os tecidos e ela costurava. Aprendeu a costurar, tricotar e fazer crochê com cursos e revistas. Pedia para a filha comprar lãs e tecidos, assistia a vídeos, olhava em revistas e mandava ver!

Outra paixão era fazer bolos de aniversário. Bell conta que em todos os seus aniversários, sem exceção, o bolo era feito pela mãe! Fazia comida mineira, rosquinhas de nata, pão de queijo, abóbora, lasanha, frango assado e até mesmo comida japonesa! Tinha amor por cozinhar, paixão aprendida por ela e as irmãs com sua mãe, Cecília.

Nadir tinha mania de assoviar, principalmente enquanto costurava! Cantar também era uma de suas manias: ligava o som bem cedinho, mais ou menos às 5h da manhã. Gostava de ouvir músicas de sua Igreja e sertanejo, entre outros estilos musicais.

Bell fala com carinho o quanto sente a falta da mãe: "Todos os momentos com ela eram bons. Para ela não tinha tempo ruim! Quanta falta eu sinto do seu abraço, do seu colo, mãezinha. Em nossos encontros sempre falta sua alegria, mas o amor permanece, assim como você nos ensinou. De tudo ficaram três memórias preciosas: seu sorriso, sua resiliência e seu amor".

"Que Deus te proteja e cuide de você com o mesmo afeto com que você nos cuidou. Descanse em paz! Que as boas recordações tomem o lugar da dor no meu peito e que nosso amor nos mantenha em sintonia eternamente. Eu te amo muito."

Nadir nasceu em Campos Altos (MG) e faleceu em Araxá (MG), aos 65 anos, vítima do novo coronavírus.

Testemunho enviado pela filha de Nadir, Bell Mahnnekyn. Este tributo foi apurado por Luisa Pereira Rocha, editado por Vera Dias, revisado por Maria Eugênia Laurito Summa e moderado por Ana Macarini em 21 de fevereiro de 2022.